Continuamos com a tradução do excelente artigo do professor James A. Santucci, "A Teosofia e as Sociedades Teosóficas". Esta semana é publicada a sétima de dez partes.
Crenças
e práticas
Os ensinamentos promulgados pelas
sociedades teosóficas são em última instância o que tem prendido a atenção dos
seus membros, sendo igualmente aquilo que os indivíduos em geral entendem ser a
Teosofia. Em regra, a maior parte dos teosofistas associa os ensinamentos
básicos com as “três proposições fundamentais” contidas no Proémio da magnum opus de H.P. Blavatsky, A Doutrina Secreta. Uma visão global da
evolução do modo como Blavatsky e outros teosofistas entendiam a Teosofia revela
uma variedade de interpretações. De facto, o termo “Teosofia”, escolhido para
representar as aspirações e os objetivos da Sociedade, teve pouco a ver com o seu
desenvolvimento posterior. Teosofia foi aceite como o nome da Sociedade em linha
com a definição encontrada numa edição do dicionário Webster (publicado por
volta de 1875), que é a seguinte: “suposto relacionamento com Deus e os
espíritos superiores e consequente obtenção de conhecimento sobre-humano por
processos físicos bem como por operações teúrgicas de antigos Platonistas, ou através
de processos químicos dos filósofos do fogo germânicos.” O termo, contudo, não
era desconhecido antes deste período (setembro de 1875). Blavatsky empregou-o
em fevereiro de 1875 numa carta ao Professor Hiram Corson (“Teosofia ensinada
pelos anjos”) e no seu artigo “Algumas questões para ‘Hiraf’”.
Num encontro que teve lugar a 7
de setembro de 1875, uma palestra dada por George H. Felt sobre “O canône
perdido das proporções dos Egípcios” refletiu essa definição. Nessa ocasião, o
futuro presidente da Sociedade Teosófica, Henry S. Olcott, propôs a formação de
uma sociedade com o objetivo de obter “conhecimento da natureza e dos atributos
do Poder Supremo e dos espíritos superiores através
do auxílio dos processos físicos.”
Esta foi a declaração no “Prêambulo e Estatutos” (30 de outubro de 1875), bem
como no discurso inaugural do Coronel Olcott como presidente da Sociedade:
”…como podemos esperar que como uma sociedade
tenhamos uma representação ilustrativa do controlo do adepto teurgista sobre os
poderes subtis da natureza? Mas é aqui que as supostas descobertas do Sr. Felt
entram em jogo. Sem alegar ser teurgista, mesmerista, ou espiritualista, o
nosso vice-presidente compromete-se, através de simples aplicações químicas,
mostrar-nos, como já fez antes perante outros, as raças de seres que, sendo
invisíveis aos nossos olhos, povoam os elementos…Imaginem as consequências da
demonstração prática da sua verdade, para a qual o Sr. Felt está agora a
preparar os dispositivos necessários!”
Noutras palavras, o objetivo
original da Sociedade Teosófica era – nas palavras das atas registadas a 8 de
setembro de 1875 – “para o estudo e elucidação do Ocultismo, Cabala &
etc....” ou, talvez para usar uma terminologia que reflita mais diretamente as afirmações
feitas acima por Olcott: demonstrar, de forma científica, a existência de um
mundo oculto, repleto com forças ocultas e seres aí existentes. Nesta
perspetiva, os objetivos originais de 1875 da Sociedade (“recolher e difundir
um conhecimento das leis que governam o universo”) têm um significado alargado.
Contudo, ao longo dos anos subsequentes, o termo assumiu diferentes conotações,
com a maior parte dos teosofistas a verem-no como a sabedoria que tem existido
desde a aurora da humanidade, preservada e transmitida por grandes instrutores
como Pitágoras, Buda, Krishna e Jesus, desde a sua criação até ao presente e
confirmada nos mitos, lendas e doutrinas da tradições históricas religiosas,
como o Cristianismo, Judaísmo, Hinduísmo, Budismo e Islamismo e em cultos de
mistério menos conhecidos. A primeira expressão em livro desta sabedoria e dos
objetivos originais (1875) da Sociedade Teosófica foi Ísis sem Véu, de Blavatsky, publicada em 1877. Nos dois anos
subsequentes, mais de dez mil cópias foram vendidas, tornando-o num dos livros
mais populares deste género do século XIX. Continua a ter influência
considerável nos círculos teosóficos, com mais de 150 mil cópias vendidas desde
a sua publicação.
Os três objetivos da Sociedade Teosófica |
Foi dado um sabor mais oriental
(ou seja, indiano) à sabedoria descrita em
Ísis sem Véu na publicação do livro de 1888 de H.P. Blavatsky A Doutrina Secreta. As suas três
proposições fundamentais foram acima referidas como a existência de um absoluto
subjacente a toda a manifestação, a ciclicidade do universo e a identidade do
indivíduo com a alma suprema universal e a peregrinação de todas as almas
através da reencarnação e carma. A Teosofia, neste sentido, adotou uma visão
não–dualista ou monista da realidade última, manifestada ou emanada numa
complementaridade dinâmica e progressão evolucionária. Estas “proposições”
gerais apresentadas por Blavatsky foram reafirmadas em ensinamentos mais
específicos em A Doutrina Secreta e
noutros lados, parte do qual pode ser sumarizado nas seguintes afirmações:
- A evolução do indivíduo imortal
continua através de vidas incontáveis, e tal continuidade é tornada possível
através da reencarnação: a entrada do Ego – a tríade Espírito, Alma e Mente –
noutro corpo (humano).
- O complemento da reencarnação é
aquela força conhecida como “A Lei da Causa e efeito (Karma)” que alimenta
futuros renascimentos e determina a qualidade da experiências dos mesmos.
- A estrutura do universo
manifestado, humanidade incluída, pode ser vista como setenária na composição e
cooperativa em todos os relacionamentos.
- A humanidade evolui através de
sete grupos ou períodos principais chamados raças-raíz, cada uma das quais é
dividida em sete subraças. No momento presente, nós humanos pertencemos à
quinta raça-raiz, conhecida como raça ariana (sânscrito para “nobre”). O termo,
contudo, não está limitado aos povos “indo-europeus”, tem um significado mais
alargado.
- O indíviduo é na realidade nada
mais que uma cópia em miniatura ou microcosmos do macrocosmos.
- O universo – incluindo a
humanidade – é guiada e animada por uma hierarquia cósmica de seres sencientes,
cada um tendo uma missão específica a cumprir.
Ísis sem Véu, de Helena Petrovna Blavatsky |
Embora a maior parte dos
teosofistas subscreva todas ou a maior parte das afirmações anteriores, há que
ter presente que essas afirmações podem ter várias interpretações dependendo de
cada teosofista. Além disso, embora alguns comentadores realcem a presença da
filosofia oriental (hindu e budista) no ensinamento teosófico depois de 1880,
quando Blavatsky e Olcott chegaram à Índia, isto não impediu a presença de
importantes ensinamentos, mitos e doutrinas ocidentais (cabalísticos, cristãos,
maçónicos e pré-cristãos) depois de 1880 ou a presença de pensamento oriental
antes de 1880, conforme é evidenciado em Ísis
sem Véu.
Sem comentários:
Enviar um comentário