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sábado, 16 de abril de 2016

Como provar a Teosofia? - H.P. Blavatsky e os seus sucessores (5ª parte)

Terminamos hoje a publicação do artigo "Como provar a Teosofia? - H.P. Blavatsky e os seus sucessores" da autoria de Barend Voorham e Herman Vermeulen. Este último é o líder da Sociedade Teosófica de Point Loma-Blavatskyhouse, que tem sede na Holanda sendo uma das ramificações da Sociedade Teosófica original. Voorham é um dos teosofistas mais proeminentes desta mesma organização.

Para mais informações sobre a STPL deverá consultar a 1ª parte deste artigo, recomendando-se naturalmente a leitura das quatro partes anteriores a quem não o fez.


A Teosofia depois de Blavatsky


De modo algum queremos minimizar o papel de H.P. Blavatsky na divulgação da Teosofia, antes pelo contrário. Ela foi aquela que, depois de muitos séculos, levantou a ponta do véu. Só alguém que sabe alguma coisa sobre ensinar Theosophia, percebe que enorme tarefa isto é. Ela era o elo com os Mestres.

Três modos de expressar os sete aspetos da consciência no que se refere à constituição do Homem. 
Em cima: a classificação conforme dada por H.P. Blavatsky em “A Chave para a Teosofia” (9)
no meio: o “diagrama oval” de G. de Purucker (10); em baixo: o “modelo do piano”. Não se contradizem 
mutuamente: o diagrama oval refina a classificação de Blavatsky. O modelo do piano foi recentemente 
utilizado para ilustrar o ensinamento teosófico de que cada centro de consciência na nossa constituição
 transporta todas as faculdades em si mesmo, e é assim capaz de fazer contacto com cada um dos 
centros de consciência mais elevados ou inferiores (por “ressonância”).


Quando, depois da sua morte, alguns supostos ensinamentos espirituais são proclamados, sendo contrários ao que Blavatsky ensinou, temos simplesmente de determinar o seguinte: ou Blavatsky e os seus Instrutores estavam errados e existe aparentemente uma outra doutrina que contém mais verdade; ou então eles tinham razão. Neste caso, aquilo que é contrário a Blavatsky não é verdade.

Mas isto não significa que depois dela não existiram outros representantes dos Mestres, que pudessem clarificar os textos de Blavatsky e ao fazerem-no pudessem levantar um pouco mais o véu e mostrar um pouco mais da verdade. Devemos abordar os seus ensinamentos da mesma forma que abordamos os de Blavatsky. Se os seus textos refletirem as nossas ideias que já experienciámos como verdadeiras, então podemos confiar razoavelmente nos seus ensinamentos.

De facto, cada ser pensante, quando está num estado altamente intuitivo e compassivo é capaz de encontrar um caminho para uma explicação mais profunda. Se negarmos esta possibilidade, então estamos a tornar Blavatsky num ícone. A colocá-la num pedestal. E isto será tão injusto para ela, como rebaixá-la ou ignorá-la. Em ambos os casos, isso conduz à degeneração.

A tendência para venerar a fundadora de um movimento espiritual pode ser encontrada em quase todos os movimentos espirituais. Nasce de uma sincera, mas muitas vezes cega devoção. Para dar um exemplo: embora o Buda tenha enfaticamente proclamado que o homem deve alcançar a sua própria salvação, existem Budistas que rezam a Gautama e imploram-lhe por saúde e felicidade.


Uma imagem do Buda Gautama

Existem pessoas que têm uma imagem de Blavatsky em sua casa e em cada decisão importante “consultam” essa imagem. Blavatsky certamente não ficaria agradada. E isto é um eufemismo! Paradoxalmente, esta grande instrutora e principal fundadora da Sociedade Teosófica, é neste caso mais um obstáculo do que um auxílio para a vida teosófica, pois um teosofista deve aprender a tomar decisões de modo independente.


A verdadeira prova é a aplicação

Acreditamos que depois de Blavatsky, outros foram também ajudados e apoiados pelos Mestres. É sabido que existem cartas dos Mestres, escritas depois da morte de Blavatsky. Annie Besant da Sociedade Teosófica de Adyar recebeu em 1900, nove anos depois do falecimento de Blavatsky, uma carta de um Mestre. (11) W.Q. Judge também recebeu cartas de Mestres depois da morte de Blavatsky, o que por sinal, originou muitos problemas, porque nem toda a gente acreditou nele. Katherine Tingley e Gottfried de Purucker estiveram, por assim dizer, também em contacto com os Mahâtmas, anos após o falecimento de Blavatsky.


Gottfried de Purucker (1874-1942)


Seria ilógico se os Mestres virassem as costas à S.T.. Mesmo um homem ”mediano” não iria, a meio da sua missão, atirar a toalha ao chão. Iriam estes grandes e compassivos sábios agir dessa forma? Julgamos que não. É por isto que estamos convencidos que depois de Blavatsky, outros estudantes avançados explicaram e desenvolveram a Theosophia com a ajuda dos Mestres.

Existe uma pedra-de-toque que sirva para avaliar os mensageiros? Com certeza que sim. Acima de tudo e antes de mais, eles devem ser exemplos vivos dos seus ensinamentos. Devem praticar o que apregoam. Além disso, reconhece-se a árvore pelos seus frutos. O mensageiro proporcionou mesmo uma maior perceção? Em que medida ele contribuiu para moldar a fraternidade em termos práticos? 

E finalmente: a doutrina que ele veicula, conflitua com a da Tradição Esotérica, de quem Blavatsky foi a última e grande representante, e não nos referimos às suas palavras (que são apenas ferramentas) mas ao conjunto integrado de ensinamentos? Isso não significa que um novo mensageiro não possa explicar e desenvolver os seus ensinamentos. Claro que pode: o propósito da missão dele é fazer isso. Não deve apenas repetir as palavras de Blavatsky. Se compararmos o primeiro grande trabalho de Blavatsky “Ísis sem Véu” com “A Doutrina Secreta”, notaremos que o último livro não se contradiz com o primeiro, mas explica-o e complementa-o em vários pontos. Quando Gottfried de Purucker apresenta o seu famoso diagrama oval, (10) ele certamente não contradiz a divisão setenária da consciência humana dada por Blavatsky. (9) Mas, vai um passo adiante. Quando se apreende a ideia do digrama oval, é-se capaz de melhor perceber o significado mais profundo de Blavatsky. Leia-se por exemplo a estância 7 do volume I de “A Doutrina Secreta” e o comentário de Blavatsky sobre esta estância, especialmente o primeiro verso com a frase do Livro Egípcio dos Mortos. (12) 



Combine-se isto com o diagrama oval e compreender-se-á o que Blavatsky tentava comunicar.


Mesmo nós, editores da presente revista “Lucifer”, inspirados por uma citação de H.P. Blavatsky, desenvolvemos este diagrama oval de algum modo, ao desenhar em cada ego, uma oitava de um piano; uma modesta tentativa de tornar o ensinamento um pouco mais claro. Em resumo, quando a Teosofia é-nos realmente provada, devemos aplicá-la. Porque, ao fazê-lo mostramos que realmente a entendemos. Digerimos os ensinamentos e novo alimento espiritual pode ser ingerido.

Notas:

9. Ver: H.P. Blavatsky, A Chave para a Teosofia, capítulo 6, secção 5.
10. G. de Purucker Fundamentals of the Esoteric Philosophy, Point Loma Publications, San Diego 1990, p. 225.
11. http://www.katinkahesselink.net/lastkh.htm
12. Ver ref. 7, Vol. 1, p. 213-222 [p.250-258 da edição em português].
13. H.P. Blavatsky,‘Psychic and Noetic Action’. Collected Writings, The Theosophical Publishing House, Wheaton 1990, Vol.12, p. 368-369.

sábado, 9 de abril de 2016

Como provar a Teosofia? - H.P. Blavatsky e os seus sucessores (4ª parte)

Esta semana continuamos com a publicação da quarta e penúltima parte do artigo de Barend Voorham e Herman Vermeulen saído na edição de março de 2015 da revista Lucifer, da Sociedade Teosófica de Point Loma- Blavatskyhouse. Recomenda-se naturalmente a leitura das anteriores partes ( ).


Confiança nos instrutores

A Teosofia moderna foi dada à humanidade pela Sociedade Teosófica (S.T.), fundada em 1875 em Nova Iorque por H.P. Blavatsky, Henry Steel Olcott, W.Q. Judge e mais outros treze.


Henry Steel Olcott, um dos fundadores
da Sociedade Teosófica (1832-1907)


Contudo, estes pioneiros – pelo menos três deles – alegavam que os verdadeiros fundadores eram os Mestres de Sabedoria e Compaixão. Nos últimos 150 anos, existiram as especulações mais rebuscadas sobre quem eram estes Mestres. Poucos os conheceram. De acordo com Blavatsky, são seres humanos que estão muito acima da média dos humanos em termos de capacidades, sabedoria e especialmente compaixão. Desde 1875, houve um dilúvio de ensinamentos teosóficos, e apesar da maior parte destes ensinamentos poder ser encontrado nos textos religiosos e filosóficos da Antiguidade, não raras vezes em linguagem velada, são tão novos e estranhos para muita da moderna humanidade, que para a parte maior dela será muito difícil compreender alguma coisa.

Viver em 2015, 140 anos depois da fundação da S.T., torna muito mais fácil entender alguns dos ensinamentos teosóficos. O karma e a reencarnação, por exemplo, são hoje em dia, mais ou menos familiares e portanto muito mais fáceis de entender. Mas no fim do século XIX tudo era novo e estranho.

Fazer um estudo dos primeiros anos da Sociedade Teosófica pode ser muito inspirador. As dificuldades que os pioneiros enfrentavam eram enormes. Existiam ataques hostis do mundo externo: cientistas que alegavam que os ensinamentos teosóficos eram superstição ultrapassada; a igreja Cristã, que não suportava o facto de a S.T. ter muita estima pelo Budismo e pelo Hinduísmo; os espiritualistas, a quem Blavatsky não negava os fenómenos, explicando-os contudo de forma muito diferente. Os maiores confrontos e problemas nasceram porém de antigos colaboradores que se opunham à S.T. e especialmente à sua principal fundadora, H.P. Blavatsky. O facto de a S.T. ter sobrevivido a todas estas dificuldades é para muitos estudiosos uma evidência de que a mesma foi de facto preservada pelos Mestres. Durante esses primeiros anos foi também claro que Blavatsky foi o elo entre os Mestres e a S.T.. É evidente que outras pessoas contribuíram significativamente para o trabalho. Henry Steel Olcott, presidente-fundador, desempenhou um papel muito importante na organização. Mas no que respeitava aos ensinamentos, H.P. Blavatsky era a autoridade. Graças a ela, algumas pessoas ligadas à Teosofia podiam se corresponder com os Mestres. Ela era conhecida como a “carteira oculta”. Quando ela deixava de estar num certo local, a influência dos Mestres perdia também vigor. Quando, forçada pelas circunstâncias, deixou a sede na Índia, a influência dos Mestres desapareceu também. (4)

Sede da Sociedade Teosófica matriz - Adyar, Chennai, Índia

Embora, depois da sua morte, o seu trabalho não tenha sido devidamente estudado por todos os teosofistas, ela permanecia como uma referência. Era a portadora da luz. Mas serão os seus escritos a palavra definitiva?


Méritos intrínsecos

A própria Blavatsky afirma num artigo que a Teosofia deve-se apoiar nos seus méritos intrínsecos. (5) Fez esta declaração no contexto da realização de fenómenos ocultos, com os quais ela tinha inicialmente tentado suscitar interesse nos ensinamentos teosóficos. A certa altura ela deixou de produzir estes fenómenos, porque não estimulavam o estudo da Teosofia, mas apenas despertavam o sensacionalismo.

Esta afirmação pode ser interpretada no sentido muito mais amplo: todos os ensinamentos, todos os textos, os de H.P. Blavatsky bem como os de outros autores teosóficos, devem provar-se por si mesmos. Não são verdade porque o autor pode produzir fenómenos ocultos ou porque foram inspirados por um Mestre. A prova é a convicção do pensamento. Chegamos a ela por pensar independentemente, não por acreditar nos outros! Quando testamos os ensinamentos com as nossas verdades já experienciadas e o teste confirma a doutrina, então podemos ter confiança na sua verdade.

A Teosofia é por definição não dogmática. Não obstante estimemos e amemos elevadamente H.P. Blavatsky, os seus textos devem ser abordados de modo tão crítico como qualquer outro texto. A Teosofia apenas é benéfica para o ser humano, se ele entender a verdade nela. Por outras palavras, uma atitude crítica perante um ensinamento e o teste permanente, com as suas próprias faculdades internas, é uma responsabilidade que não deve ser subestimada, porque se assim não for, em quê é que estamos a basear a nossa confiança de que Blavatsky era a mensageira dos Mestres?

Helena P. Blavatsky (1831-1891)


Claro que H.P. Blavatsky não forneceu a completa e absoluta verdade. Ela indicou os princípios da Teosofia aos buscadores da verdade, e deu um grande número de formulações dos mesmos com respeito à humanidade e ao planeta, mas nunca pretendeu dar “A Sabedoria dos Deuses” na totalidade, o que para já seria impossível. No final de “A Doutrina Secreta” ela escreve que as suas “exposições estão longe de ser completas” e que apenas quis “preparar o terreno”. (6) Os volumes III e IV de “A Doutrina Secreta” já haviam sido planeados e a sua publicação dependeria da receção dos volumes I e II, embora estivessem quase completos. Nunca foram publicados [NT: Na sua versão original, “A Doutrina Secreta” foi publicada em dois volumes, que correspondem, grosso modo, aos primeiros quatro volumes da edição em língua portuguesa. Esta controvérsia sobre os volumes III e IV será em breve abordada no Lua em Escorpião]. (7)


Portanto Blavatsky nunca deu a última palavra, mas antes a primeira, pelo menos no impulso de 1875 da Loja da Sabedoria e da Compaixão. Os ensinamentos que ela trouxe podem ser mais desenvolvidos e explicados. Ela também disse que no século XX “algum discípulo mais bem informado e com qualidades mui superiores poderá ser enviado pelos Mestres de Sabedoria para fornecer provas definitivas e irrefutáveis de que existe uma Ciência chamada Gupta-Vidyâ; e de que, como as nascentes do Nilo, outrora envoltas em mistério, a fonte de todas as religiões e filosofias atualmente conhecidas permaneceu esquecida e perdida para a Humanidade durante muitos séculos, mas foi finalmente encontrada.” (8)

Notas: 

4. Ver: H.P. Blavatsky, ‘Why I do not return to India’. Collected Writings, The Theosophical Publishing House, Wheaton 1990, Vol. 12, p. 157-158.
5. H.P. Blavatsky, ‘What of Phenomena’. Collected Writings, Theosophical Publishing House, Wheaton 1990, Vol. 9, p. 50.
6. H.P. Blavatsky sempre foi muito clara sobre este assunto. Ver por exemplo: A Doutrina Secreta, Vol I, p. viii [na versão original, p. 12 da edição em português], onde ela escreve que a Doutrina Secreta merece ser considerada, não porque invoque alguma autoridade dogmática, mas por se manter em íntima relação com os factos da Natureza e seguir as leis da uniformidade e da analogia; e:
A Doutrina Secreta, Vol. I, p. 20 [p.86 da edição em português], onde afirma que quando o leitor as tiver compreendido claramente [às três proposições fundamentais], e percebido a luz que espargem sobre todos os problemas da vida, mais nenhuma identificação se tornará necessária; pois a verdade lhe saltará aos olhos, tão evidente como a luz do Sol.
7. H.P. Blavatsky,The Secret Doctrine, Vol. 2, p. 797-798 [vol. IV da edição em português, p.365-366].
8. Ver ref. 7, Vol. 1, p. xxxviii [p.61 da ed. portuguesa].

Continua na próxima semana.

sábado, 2 de abril de 2016

Como provar a Teosofia? - H.P. Blavatsky e os seus sucessores (3ª parte)

Nas duas semanas anteriores, publicamos a e partes deste artigo de Barend Voorham e Herman Vermeulen publicado na revista Lucifer, da Sociedade Teosófica de Point Loma- Blavatskyhouse.

Esta semana, prosseguimos com a 3ª parte, recomendando-se naturalmente a leitura das anteriores.


Herman Vermeulen-um dos autores do artigo e líder da ST
Point Loma-Blavatskyhouse

Prova

Podem estas ideias teosóficas centrais ser provadas? Podemos estar convencidos da sua verdade?

Neste ponto temos de ser realistas. A forma mais elevada de prova é perceber, reconhecer, entender e experienciar a verdade por nós próprios. A maior parte das pessoas não é ainda capaz de experienciar muita da Teosofia. O PRINCÍPIO Omnipresente, Eterno, Ilimitado e Imutável, que é o ponto de partida de todo o sistema teosófico, não pode ser experienciado nem mesmo pelos deuses. Se algum ser experienciar o Ilimitado, dá expressão a ISSO e não é mais um ser ou em ego, porque um ser, por maior que possa ser, é sempre limitado. É por essa razão que nenhuma entidade é por definição capaz de entender completamente o Ilimitado.

A maioria das pessoas também não é capaz de experienciar a reencarnação conscientemente. Quando caímos no sono perdemos a nossa autoconsciência. Tal como quando adormecemos, passamos pelo processo de morrer e nascer inconscientemente e não podemos adquirir conhecimento em primeira mão.

Mas no domínio da confiança nós podemos conseguir completamente um certo grau de prova. Podemos considerar os princípios teosóficos como hipóteses e testá-las com as verdades que já experienciámos. Além disso, podemos examinar se eles coincidem com aquilo que percecionamos à volta de nós. Avaliamos de modo crítico se as ideias teosóficas são consistentes e lógicas e respondemos a todo o tipo de questões.

Desta forma, com base na razão e na lógica, podemos formar a ideia do Ilimitado.

É claro que esta ideia não é perfeita. Como seria isso possível? Mas ao menos iremos entender que a finitude é ilógica por natureza e contrária às observações humanas, pois nem no microcosmos, nem no grande universo nos deparamos com limites. Não apontam os factos científicos sobre o átomo e o universo na direção da infinitude? Ficamos portanto confiantes de que o conceito do ilimitado esteja correto?




Com respeito à reincarnação, também podemos dizer que é uma doutrina lógica. Em toda a natureza existem ciclos. Podemos encontrá-los ciclicamente quer na nossa vida quer nas civilizações humanas. 

Além disso, muitos fenómenos psicológicos são elucidados e explicados com o conceito da ciclicidade.

Também podemos acreditar na Teosofia. Não raciocinamos por nós próprios, mas cremos nos outros. 

Talvez tenhamos fé nela porque o nosso companheiro diz-se teosofista, ou porque achamos os teosofistas boas pessoas e de confiança. Esta crença é obviamente a forma mais fraca de convicção, porque se nosso o companheiro nos desiludir ou se perdermos os nossos amigos teosofistas, a base da nossa crença desaparece também.


Pistis: confiança espiritual

As provas efetivas de uma doutrina devem portanto ser encontradas na nossa própria consciência. Não podem ser fornecidas por outrem, por mais sábio que seja. Não obstante, podemos ter uma enorme confiança naquele que proclama uma doutrina.

Talvez pareça que chegámos tortuosamente ao ponto em que devemos aceitar uma doutrina baseada na autoridade de outrem. Estamos aqui a nos contradizer? Antes de mais, temos de entender que todos nós assumimos certas posições porque confiamos noutras pessoas. Poucos leitores já alguma vez pisaram o Pólo Norte. Contudo, a maior parte assume que o mesmo existe. Têm confiança nos relatos sobre esta região inóspita e assumem que as imagens daqueles mantos de gelo não são manipuladas.

Contudo, esta confiança não é uma crença cega. É mais um reconhecimento, baseado na lógica e na nossa própria experiência, da correção da perspetiva de outros, que aplicamos como uma hipótese útil.

A nossa sociedade não pode existir sem esta confiança. Afinal, se não confiássemos no eletricista, no condutor de autocarros, no médico e no padeiro não poderíamos viver juntos harmoniosamente. Pela mesma razão podemos ter fé nos instrutores espirituais.

Quando esta confiança tem mais a ver com temas espirituais, pode ser chamada, tal como na Grécia antiga de Pistis. Esta palavra pode ser traduzida como “fé” ou às vezes como “crença”. Contudo, é baseada na razão e em saber intuitivamente que algo é verdade. Não é crença cega. É um conhecimento interno, livre de preferências pessoais. É-nos familiar, porque corresponde com as nossas próprias experiências e identifica-se com o fundamento do nosso ser.

A Pistis pode certamente ser útil para nós na nossa busca pela verdade. Como dissemos, as provas são a convicção do nosso pensamento. Portanto, a verdade não vem do exterior, mas deve ser desenvolvida a partir do interior. Ou melhor, deve ser reconhecida ou relembrada. A Pistis é a confiança em nós próprios. Somos capazes de encontrar a verdade, porque ela está dentro de nós. 

Platão escreveu sobre isso. Qualquer conhecimento, qualquer verdade, dizia este antigo filósofo grego, está dentro de nós. Para prová-lo, reflete em “Fédon” da seguinte maneira. Vendo um objeto – uma lira, por exemplo - podemos nos recordar de outra coisa. Ver uma rosa, pode evocar a consciência do belo. Portanto, o conceito de “belo” – Platão fala da ideia do belo – já está dentro de nós, mas nós não nos apercebemos. A rosa externa foi o que espoletou a recordação do conhecimento interno da ideia de belo. (3) De facto, este é um despertar; a nossa fé em algo é sublimada até à compreensão da verdade. Vamos desde a “cabeça” ao “coração”.


Platão (427 (?) a.C-347 (?) a.C)

Isto também funciona com certos ensinamentos. O conhecimento já está dentro de nós. Através de um mito, de um símbolo, de um argumento ou de uma dissertação ficamos conscientes da verdade no nosso Eu. Somos parte de um todo infinito e um pouco mais de infinito também é infinito.

Notas:

3. Platão, Fédon, 72e-77a.

Continua na próxima semana.