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sábado, 28 de dezembro de 2013

Gottfried de Purucker e a autoconfiança

Gottfried de Purucker (abreviadamente GdeP) foi um dos grandes líderes de uma das Sociedades Teosóficas, no caso, a Sociedade Teosófica de Point Loma (que em 1951 haveria de se dividir numa guerra de sucessão entre James Long e William Hartley, ficando o primeiro a liderar a atual Sociedade Teosófica de Pasadena enquanto alguns elementos que haviam sido expulsos ou que saíram voluntariamente constituíram a chamada tradição de Point Loma, da qual a principal representante é neste momento a Blavatsky House-ST Point Loma). De Purucker esteve à frente da referida organização entre 1929 e 1942, sucedendo à controversa Katherine Tingley, que por sua vez tinha herdado a sua posição de William Quan Judge, um dos fundadores da Sociedade Teosófica original. O principal contributo de GdeP terá sido o de ter procurado tornar mais acessível a literatura deixada por Helena Blavatsky, tentando inclusive desenvolver alguns pontos (o que lhe granjeou algumas críticas de desvirtuação dos conceitos da chamada Teosofia original). No entanto, na generalidade, o trabalho de GdeP é olhado com respeito, independentemente do quadrante do movimento teosófico que se lhe refere.


Katherine Tingley (1847-1929)


Um de sete irmãos, Hobart Lorenz Gottfried von Purucker nasceu em Suffern, Nova Iorque a 15 de janeiro de 1874. Pouco depois dos seus sete anos, e enquanto vivia no Texas, GdeP foi acometido de febre tifóide, tendo sido declarado morto pelo médico. Em 1997, o High Country Theosophist republicou um texto onde GdeP confessava que, tal como tinha acontecido com William Judge, também no caso dele, tinha havido uma ocupação de um corpo moribundo por um chela tibetano. Em 1888, a família instalou-se na Suíça, onde GdeP recebeu educação do seu pai, de vários tutores e também no Colégio de Genebra. A intenção do pai de GdeP era prepará-lo para uma vida eclesiástica, tendo-lhe ensinado Hebraico, Grego e outras línguas, como o Italiano e o Espanhol. Vivendo na Suíça, aprendeu francês e falava também Alemão (língua paterna) e Inglês (língua materna). Ainda adolescente, já fazia traduções de textos religiosos em Grego e Hebraico. Com o passar dos anos, GdeP começou a se interessar por textos de proveniência oriental, tendo começado a estudar Sânscrito ainda antes dos 18 anos. 

Gottfried de Purucker em 1892

É nessa altura também que descobre a Teosofia, algo que o ”sobressalta”. O efeito foi profundo:

“O meu coração despertou, tal como a minha mente tinha despertado antes. Mas agora, fruto do estudo da literatura teosófica, o meu coração despertando, eu comecei a perceber o que existia, não só em mim, mas nos meus companheiros; e eu disse a mim mesmo: De agora em diante a minha vida será consagrada àquilo que eu sei ser a Verdade.” (Questions we all ask, 2:514)”.

Em 1892, GdeP viajaria até San Diego, Califórnia, onde um dia assistiu a uma palestra de Teosofia. No dia seguinte visitou uma biblioteca teosófica e a partir desse dia passou a estudar Teosofia diariamente. No ano seguinte filiou-se na Sociedade Teosófica (na altura ainda não se tinha registado divisões) e em 1894 conheceu Judge. Na Loja de San Diego organizaria um curso sobre a Doutrina Secreta, “moderando e guiando os estudos dos seus membros, a maior parte dos quais eram consideravelmente mais velhos do que ele”. É a GdeP que se atribuiu a primeira ideia da construção de uma grande instituição teosófica em Point Loma, que viria ser a sede durante mais de 40 anos, da Sociedade Teosófica criada por William Judge. Até ao final do século, GdeP viajaria pela Europa onde conheceu Katherine Tingley, a sucessora de Judge. Em 1903 junta-se a Tingley em Point Loma, onde trabalharia incansavelmente não só dando palestras, mas também ocupando-se da gestão e trabalho burocrático da Sociedade. Entre 1924 e 1927 ministrou um conjunto de sessões a estudantes do grupo esotérico de Tingley sobre a “Doutrina Secreta” que viriam a ser compiladas em Fundamentals of the Esoteric Philosophy (1932), uma das obras mais conhecidas de GdeP.

A imponente sede da Sociedade Teosófica e Fraternidade
Universal  em Point Loma

Em meados de julho de 1929, Tingley morre na Suécia na sequência de complicações derivadas de um acidente de viação ocorrido um mês e meio antes na Alemanha. Quinze dias depois do falecimento de Tingley, GdeP assume a líderança da Sociedade Teosófica e Fraternidade Universal (o nome então da Sociedade Teosófica, hoje conhecida como “de Pasadena”) passando a atuar também como líder externo da Secção Esotérica. Um das primeiras medidas tomadas por GdeP foi o de encurtar o nome da organização para Sociedade Teosófica. Ele tinha também o objetivo de dinamizar a Sociedade, aumentar o número de membros e torná-los mais participativos, não só na divulgação da Teosofia, mas também na realização de atividades. O secretário Geral Joseph H. Fussell, resumiu a administração de GdeP da seguinte forma:

“O amor é o cimento do Universo.

Aprende a perdoar. Aprende a amar.

Cada um de vós é um Deus encarnado. Que assim seja!”

GdeP, J.Fussell e
Elsie Savage na Suécia (1931)


GdeP tentou também fomentar o diálogo entre as diferentes organizações que se formaram a partir da Sociedade Teosófica matriz. Vários foram os convidados para uma convenção realizada em 1931, para comemoração do centenário do nascimento de Helena Blavatsky. Nesse encontro, o discurso de GdeP era intitulado “Fraternidade no Movimento teosófico”. A iniciativa de GdeP não foi completamente coroada de sucesso, mas as tensões e rivalidade entre os vários grupos teosóficos baixaram de tom.

Foi também durante a administração de GdeP que se desenhou o que viriam a ser os Collected Writings (Escritos Reunidos) de HPB, para os quais Boris de Zirkoff havia começado a reunir documentos em 1924. Quatro dos catorze volumes (existe ainda o volume XV que é um índice) dos Collected Writings foram publicados entre 1933 e 1936 (mais tarde esses quatro volumes seriam alvo de uma revisão, sendo publicados pela ST Adyar).

Iniciaram-se também durante a liderança de GdeP os trabalhos de um novo e aumentado Glossário Teosófico que “passasse o teste académico e também o teste de fidelidade para com os ensinamentos de sabedoria universal reapresentados por H.P. Blavatsky”. Embora tivesse passado pela mão de diversos líderes daquela Sociedade o volume nunca foi publicado em papel, embora esteja disponível online.

A principal mais-valia dos escritos de GdeP é a apresentação panorâmica das ideias fundamentais da Teosofia moderna conforme foram transmitidas por HPB e os seus instrutores. Embora às vezes consideradas controversas no seu tempo, particularmente por teosofistas das outras organizações, as suas ideias e interpretações estão firmemente enraizadas nos escritos de Blavatsky. Na verdade tudo aquilo sobre que GdeP falou pode ser encontrado nos trabalhos dela, de forma mais ou menos desenvolvida. Frequentemente, ele apelava aos leitores para “saírem fora da caixa”, usarem a intuição e irem para lá dos hábitos limitativos do pensamento.

Foto de De Purucker já perto do final da sua vida


Além de Fundamentals of the Esoteric Philosophy (1932), Golden Precepts of Esotericism (1931) e The Esoteric Tradition (1935) são as principais obras de GdeP. Nesta última ele discorre sobre os conceitos de karma, reeencarnação, morte e renascimento, a relação da Teosofia com a ciência, religião e filosofia. Mas existem mais livros da sua autoria…

Em termos de administração, o período que abarcou a liderança de De Purucker não foi fácil, seguindo-se à Grande Depressão. A sucessão de problemas financeiros levou-o a trocar Point Loma por instalações mais modestas em Covina, no ano de 1942. Poucos meses depois da mudança, mais exatamente a 27 de setembro de 1942, GdeP viria a falecer.



GdeP deixou um valioso legado através da sua exposição profunda da sabedoria perene, não apenas nos seus aspetos intelectuais mas mais particularmente na sua dimensão ética e intuitiva. Ele procurava inspirar os seus ouvintes e leitores no estabelecimento de um equilíbrio entre o intelecto, a compaixão e a intuição e instava-os a guiarem os seus aspetos limitados e auto-centrados pelo seu Eu espiritual universal. A união do ser humano com o deus interior é a grande tarefa de cada indivíduo. Trazer ao máximo número de pessoas possível a “Visão Sublime” das realidades espirituais por trás do universo material, do qual de cada de nós é parte inseparável, era o seu objetivo.

Este resumo biográfico é uma adaptação do texto de Sarah Belle Dougherty publicada na extinta revista Sunrise (edição de abril/maio de 2000).



O motivo deste post foi uma mensagem colocada no Theosophy Forum pelo conhecido teosofista Nicholas Weeks com um diálogo entre um estudante e GdeP, retirado do 1º volume de Dialogues of G. de Purucker (p.149-150), que de seguida se traduz.

"Estudante – Mas não deve o próprio aspirante fazer todos os esforços possíveis para atingir a vitória?

G de P – Certamente, ele tem que dar todos os passos ao longo do caminho para a vitória. Ele não é conduzido lá. Cada passo tem de ser dado por ele. Como poderia ser de outra maneira? Os humanos adultos não são alimentados como bebés. Nós alimentamo-nos, mantemo-nos informados, ensinamo-nos, fazemos o nosso caminho no mundo, e se isso é uma necessidade na existência humana comum, posso dizer que é dez vezes a mesma necessidade na vida esotérica. Aí temos que vencer tudo. E porquê? Porque estamos simplesmente a trazer para fora aquilo que está dentro de nós, a nossa própria vontade, a nossa própria consciência tem de ser desperta, completamente desperta e através dos nossos próprios esforços.

Não podemos ver a não ser que usemos a faculdade da visão. Não podemos compreender através da mente de outrem. Não é isso evidente? Temos de adquirir tudo o que viermos a ter no treino esotérico. E isto é porque, para aqueles que não entendem, existem aspetos do treino esotérico que podem parecer um pouco difíceis, porque as pessoas no Ocidente foram criadas na ideia de que elas devem ser conduzidas à vitória, salvas pelo “sangue do Cordeiro” e todo esse tipo de disparates.

Isto recorda-me dos ensinamentos dos “Escurinhos”, os Irmãos da Sombra, com o intuito de por todos a dormir, tentando minimizar os impulsos espirituais individuais do nosso próprio ser!

Não, o contrário é que é verdade! Não podemos viver através dos outros. Temos que despertar a chama sagrada na nossa própria alma. E o mesmo acontece com cada um dos outros passos no progresso espiritual e intelectual que fazemos.

Como é possível experienciar a alegria inefável de ser Um com o Todo, apenas por ouvir que alguém atingiu esse estado? Nós próprios temos de ser o veículo de luz interior, devemos adquiri-la. Está acima e dentro de nós, dando-nos força e inspirando-nos. Sejamos essa luz!

PS - Depois de uma troca de impressões com alguns teosofistas ligados à ST de Point Loma, foi alterado a 4/1/2014, o primeiro parágrafo, de modo a retratar de modo mais fiel as consequências dos acontecimentos verificados em 1951 naquela Sociedade Teosófica. Foi também trocada a palavra "presidência" por "liderança" numa das passagens do texto, pois não existe a figura de presidente nesta ST.

sábado, 21 de dezembro de 2013

Conferência Internacional de Teosofia / 2014

Estão já confirmadas as datas para a próxima Conferência Internacional de Teosofia (ITC) que irá ter lugar em Naarden, na Holanda, entre 15 e 18 de agosto próximos. Desta feita a conferência começa numa sexta-feira e termina numa segunda. Naarden é uma pequena localidade que fica a cerca de 32km de Amsterdão.

Pretende-se que a conferência de 2014 tenha um cariz mais interativo e holístico, em comparação com as conferências anteriores, com maior enfâse no diálogo, workshops e partilha de experiências.

Naarden (foto:wikipedia)

O tema da ITC2014 será “A Teosofia, a Unidade e a Ajuda ao Mundo…E a partir daqui, por onde vamos?”.

Naturalmente este tema terá como pano de fundo os objetivos e papéis a desempenhar pelos estudantes de Teosofia pertencentes às diferentes organizações e também por aqueles que não são filiados em nenhuma das sociedades. Há a intenção de com este tema se enfatizar a comunicação e a harmonia entre os diferentes grupos teosóficos, explorando-se os modos a usar por estes para espalhar a Teosofia com respeito pelas diferentes tradições.

Também se discutirá sobre modos de difundir a Teosofia pelo mundo, de ajudar estudantes a ligar as tradições teosóficas e sobre como trocar ideias de acordo com o espírito dos três objetivos da ST e com o legado de H.P. Blavatsky. 

H.P. Blavatsky

O local da reunião, o Centro Internacional de Teosofia de Naarden é um retiro espiritual maravilhosamente localizado que transpira Fraternidade e Paz. Tem uma longa história de servir a Teosofia e está afiliado na Sociedade Teosófica de Adyar.

Os participantes poderão ficar acomodados no próprio Centro que oferece uma variedade de possibilidades, embora a disponibilidade de quartos seja um tanto ou quanto limitada. Muito perto do local da reunião existem alguns hotéis de cinco e quatro estrelas e outros a preços mais moderados. A partir destes hotéis será possível chegar ao Centro de carro, bicicleta ou transportes públicos.

Estátua existente no Centro Internacional de Teosofia

No site www.theosconf.org já existe bastante informação sobre o Centro, o alojamento que oferece e os hotéis mais próximos. Dentro em breve estarão disponíveis as fichas de inscrição para a Conferência no website acima referido.

Serão em princípio fornecidos pequenos-almoços vegetarianos, almoços e jantares no próprio Centro. Também existem vários bons restaurantes na própria cidade de Naarden.

Este ano, a conferência é organizada por Herman C. Vermeulen (Haia, Holanda) e Jan N. Kind (Brasília, Brasil).

Herman C. Vermeulen

Marquem nos vossos calendários a Conferência do próximo ano. Para ficar no alojamento pretendido há que fazer a reserva nos próximos dois meses.

Jan Kind

sábado, 14 de dezembro de 2013

A arte e o transcendente II

Joma Sipe nasceu na cidade do Porto, Portugal, em 2 de Agosto de 1974. Passou a sua juventude na cidade de Vila Nova de Gaia, perto do Porto, onde ainda vive e tem o seu próprio estúdio.


Joma Sipe

Começou por pintar figuras convencionais, como paisagens e retratos, usando óleos e acrílicos e cores exuberantes. Rapidamente se apercebeu que esta não era a forma que desejava para expressar os seus sentimentos artísticos e espirituais. Passo a passo tornou-se consciente de uma inquietação interior crescente.

Por volta dos 14 anos começou a sentir-se inquieto, desejando descobrir as razões de viver neste planeta, tentando encontrar respostas para as questões que todos perguntámos: "De onde vimos?", "O que estamos aqui a fazer?", "Para onde vamos quando os nossos corpos morrem?". Estas questões levaram-no à Biblioteca do Porto, onde encontrou livros escritos por H. P. Blavatsky e Annie Besant, traduzidos em português.




The Voice of the Silence XV

Logo após a leitura destes livros, sentiu uma profunda e inexplicável conexão com H. P. Blavatsky e os seus ensinamentos. Teve a oportunidade de ler várias obras de HPB, como "Isís Sem Véu", "A Doutrina Secreta", "A Voz do Silêncio", e outros livros de Blavatsky.


Cosmogenesis - Stanza V

Enquanto percorria o seu caminho através da literatura esotérica, aprendeu sobre os chakras, anatomia oculta, geometria sagrada, o número de ouro, várias técnicas de meditação e concentração, o processo alquímico, a Kabbalah, e muitos outros assuntos esotéricos. Adicionalmente, Joma também aprendeu sobre as ideias de Rudolf Steiner, Gurdjieff e Ouspensky.


Capa principal da 15º Annual International Theosophy Conference (2013)


Ilustração por Joma Sipe



Uma série de 100 trabalhos "iluminados" aparecem no seu livro "Soul of Light: Works of Illumination" (Alma de Luz: Trabalhos de Iluminação), publicado pela Quest Books, Novembro, 2012.





sábado, 7 de dezembro de 2013

Discutindo o intervalo entre encarnações

Embora existam grupos teosóficos que têm a tendência de criar dogmas à volta de alguma literatura teosófica, essa não era a prática da chamada primeira geração de teosofistas. E a prova disso é que podemos encontrar discussões vivas e interessantes nos relatos históricos da Loja Blavatsky, que se formou após a chegada de Blavatsky a Londres em 1887, cidade onde viria a falecer quatro anos depois.

H.P. Blavatsky em 1887

A Loja Blavatsky foi formada na sequência de uma reunião realizada a 19 de maio de 1887, no local onde esteve alojada Blavatsky depois de chegada a Inglaterra – a casa de Mabel Collins. O objetivo da Loja era o de “espalhar os ensinamentos teosóficos e a fraternidade através do trabalho individual e coletivo dos seus membros”. Os relatos de doze das sessões foram publicados em 1890 e 1891 sob o nome “Transactions of the Blavatsky Lodge” [Atas da Loja Blavatsky]. Em 1992, foram descobertas, na documentação deixada por B.P. Wadia (um dos mais proeminentes líderes da Loja Unida dos Teosofistas - LUT), folhas datilografadas com as atas de 21 reuniões, realizadas entre janeiro e junho de 1889. Um achado verdadeiramente fenomenal. Após sucessivas tentativas para que o material fosse partilhado com todo o universo de teosofistas (e muito crédito deverá ser dado a Daniel Caldwell pela persistência, conforme podemos ver aqui), a I.S.I.S. Foundation, ligada à Sociedade Teosófica de Point Loma - Blavatsky House tomou em mãos a publicação das atas, ficando a edição dos textos a cargo do experiente e respeitado historiador Michael Gomes, diretor do Emily Sellon Memorial Library de Nova Iorque e autor de vários livros bem conhecidos no meio teosófico.

“The Secret Doctrine Commentaries – The Unpublished 1889 Instructions” foi colocado à venda em 2010, mas por um preço bastante elevado, o que conduziu a críticas por parte de alguns teosofistas. Este ano, a loja de Phoenix da LUT decidiu colocar os textos online e tempos depois a Blavatsky House (cuja sede é na Holanda) fez o mesmo.

Capa do livro editado
 pela I.S.I.S. Foundation

Grande parte das discussões da Loja Blavatsky a que temos acesso girava à volta d’ “A Doutrina Secreta” que havia já sido publicada à data, mas também de “A Chave para a Teosofia”, provavelmente o livro mais acessível escrito por Helena Blavatsky e aquele que é mais recomendado para a introdução à Sabedoria Perene.

O texto que abaixo se traduz está relacionado com a discussão sobre a duração do período entre vidas, que é abordado n’ “A Chave para a Teosofia”. Aí Blavatsky escreveu que 1 500 anos era o tempo médio entre encarnações (p.122 da edição em português). Nas cartas dos Mahatmas é referido que este período pode ir de 1000 a 3000 anos, às vezes mais. Contudo, como a população já aumentou quase mais de 4 vezes desde o tempo em que as cartas foram escritas (na primeira metade dos anos 1880 a população não chegava aos 1,5 milhões) e tendo em conta outras fontes credíveis (vamos deixar as regressões de lado, por serem mais controversas), como por exemplo, as crianças que se lembram espontaneamente da sua vida anterior (sendo que nem todas morreram novas na sua vida passada, uma situação que a acontecer conduz a reencarnação quase imediata), muitos teosofistas, nos quais me incluo, consideram que vivemos um período “especial” e que as médias dos intervalos entre encarnações são menores. Até um artigo já foi publicado por David Bishai defendendo esta perspetiva no Journal of Scientific Exploration, cujo resumo pode ser encontrado aqui (resumo este que provavelmente será, num futuro não muito distante, traduzido para português e colocado aqui no Lua em Escorpião).


No entanto, como se vê pelo texto abaixo - um excerto da 15ª reunião, que teve lugar a 18 de abril de 1889 - já Blavatsky e os seus estudantes, na altura, discutiam o assunto…

“Yates: A população mundial não se altera.

Mme. Blavatsky: As mónadas não sofrem alterações desde meados da quarta raça.

Bertram Keightley: Você pode ter qualquer número de mónadas no Devachan e assim por diante.

Bertram Keightley (1860-1945)
Foto retirada de Fundácion Blavatsky

Mme. Blavatsky: Não se altera. De outro modo, não existiriam possibilidades kármicas de ajustamento.

Yates: Pegue em qualquer altura da história mundial e compare-o com qualquer outro período de 3 000 anos. Deverão existir, é claro, variações, mas mesmo assim, de acordo com essa teoria, a população mundial era então a mesma de agora.

Mme. Blavatsky: Você não sabe nada sobre população. O que se passou, e o que eu aprendi, é que a população era quase o dobro do que é agora – quase duas vezes maior. Não havia um canto no globo que não fosse habitado, e é por isso que às vezes alguns de vós têm de ser afogados. Reparem na China, aquelas ondas gigantescas são obra da Providência.

Bertram Keightley: E no tempo da Atlântida a população era o dobro do que é agora a da China.

Mme. Blavatsky: Não duas vezes, muito mais vezes do que agora. Eu lembro-me de uma coisa: houve um tempo em que África era toda habitada (tempos depois de ter emergido do oceano). E agora, porquê, quantas partes de África são habitadas? Eu suponho que nem uma vigésima parte. (…)

Bertram Keightley: Uma população muito escassa…Mas a questão de Yates é curiosa.

Mme. Blavatsky: Eles dizem que os continentes eram maiores. Olhem para o Continente que ia da Índia à Austrália. Era um continente só, e agora é apenas mar e mais mar.

Bertram Keightley: Onde eu quero chegar é: olhem para a população da Terra neste momento. A população da Terra então era muito maior. Nesta lógica, um grande número de Mónadas que estavam então na Terra no período Atlante, encarnadas, estão ainda no Devachan [um estado de bem-aventurança dos Egos na maior parte do período entre-vidas].

Sinnett: Eu não acho que seja assim. Assuma por um momento que o período devachânico era de 200 anos, em vez de 2 000. Uma alteração no estado de coisas em que se passasse dos 200 para os 2 000 anos, reduziria a população para um décimo do que era, sem dar a nenhuma Mónada um período mais longo que 2 000 anos.

Kingsland: Isso é dizer, que o período então era menor do que é agora.”

William Kingsland (1855-1936)
Foto retirada de Fundácion Blavatsky

Infelizmente Blavatsky não produziu mais qualquer comentário sobre esta questão e o tópico da discussão mudou. O excerto traduzido (aproveito para agradecer uma vez mais ao Ivan Silvestre pela revisão do texto) foi retirado das páginas 462 a 464 da edição da I.S.I.S. Foundation.