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sábado, 26 de novembro de 2016

Kali-Yuga: uma idade de crescimento ou de decadência espiritual? (4.ª parte)

É hoje publicada a 4.ª parte do artigo de Barend Voorham "Kali-Yuga: uma idade de crescimento ou de decadência espiritual?".

Voorham pertence à Sociedade Teosófica de Point Loma, cujas atividades estão centradas na Holanda e Alemanha.

Esta organização tem-se revelado com uma das mais empenhadas nas Conferências Internacionais de Teosofia (ITC). Vários dos seus membros fazem parte da Direção desta iniciativa, que não é mais do que uma plataforma onde as organizações teosóficas e dedicados estudantes de Teosofia se encontram. As ITC estão comprometidas em ligar todos os teosofistas, apoiando-os na causa comum à luz dos objetivos do ITC que são:



1. Manter os princípios do movimento teosófico moderno delineados por HPB como uma forçça viva nas mente e coração da Humanidade, encorajando a exploração à luz dos seus ensinamentos;

2. Promover a intercomunicação mútua significativa, a compreensão e o respeito entre as correntes teosóficas, estimulando assim a unidade espiritual contínua;

3. Ser uma plataforma, apoiando e patrocinando a conferência internacional anual das organizações teosóficas.

4. Unir as pessoas na partilha da Filosofia da Teosodia, estudando e explorando cada vez mais a Religião, a Filosofia e a Ciência a partir de uma perspetiva teosófica.


Seguimos agora para a tradução da 4.ª parte do artigo de Barend Voorham, não sem antes se recomendar a leitura das partes anteriores.

A Luz Astral

Contudo, a questão levanta-se sobre se estas caraterísticas que na verdade caraterizam a nossa presente era, são causadas pelo Kali-Yuga?

William Quan Judge disse que as pessoas são bastante afetadas pela Luz Astral no Kali-Yuga. (3) Uma das caraterísticas da Luz Astral é a de que todas as ações e pensamentos são aí gravados. É como se fosse uma galeria de imagens.

As pessoas são influenciadas pela Luz Astral. Claro que a influência não ocorre indiscriminadamente, mas apenas se nos identificarmos com uma certa camada desta esfera astral. Portanto, uma pessoa focada no material, que esteja sobrecarregada com fortes desejos egoístas, irá obter imagens e impulsos correspondentes da Luz Astral. Portanto, durante o Kali-Yuga as pessoas recebem impulsos de determinadas camadas da Luz Astral completamente distintas de quando se está nos outros Yugas.

Todos os desejos materiais, toda a adoração do corpo e da matéria, derivam de impressões que os nossos antepassados imprimiram na Luz Astral durante o Kali-Yuga do último Mahâ-Yuga (de que falaremos adiante). Para clarificar: nós próprios somos esses antepassados! No presente Kali-Yuga essas impressões ainda pesarão em nós.

Somos confrontados com todas as nossas inclinações materiais do passado. Portanto, estamos confrontados com causas que nós próprios criámos. Colhemos aquilo que semeámos.

Colhemos agora as causas do último Kali-Yuga. Isto também explica, por exemplo como novos desenvolvimentos, como a tecnologia de informação, são aceites e usados tão rapidamente. Apanhamos o fio do último Kali-Yuga.


Kali-Yuga: a idade intensa

Kali-Yuga é a idade mais rápida. As consequências sucedem-se quase imediatamente às causas, pelo menos em comparação com os outros Yugas. Isto conduz a pressão e tensão. Muitas coisas acontecem ao mesmo tempo. Uma nova moda ou tendência, uma revolução política ou uma invenção tecnológica mal apareceram e já algo novo acaba por surgir.

Não parece isto o nosso mundo de hoje? Os países mudam de governantes como as pessoas mudam de roupa. Em todo o lado acontecem revoluções. Novas modas e invenções sucedem-se numa velocidade incompreensível. Em poucos minutos ouvimos e vemos o que está a acontecer noutra parte do mundo. Os media informam-nos sobre o que está a acontecer noutras partes do mundo durante todo o dia. Os desenvolvimentos vão rebolando tal como fazem os cães sobre si próprios quando são pequeninos.

O Kali-Yuga é uma idade de rapidez. E, embora possa parecer contraditório, é nesta era em que o maior crescimento espiritual pode ser conseguido.

Nos Yugas mais calmos existiam chelas – estudantes dos Mestres de Sabedoria – que ansiavam pelo Kali-Yuga por essa razão. Um mais rápido crescimento é aí possível, pois os resultados das nossas tentativas são obtidos mais rapidamente. Cada ato e pensamento resulta em consequências quatro vezes mais rápidas comparativamente ao Satya-Yuga. Isto aplica-se a ações motivadas por desejos egoístas, mas também atos motivados pela compaixão. Portanto, podemos atingir uma compreensão da elevação espiritual, a maestria, mais rapidamente. Podemos contribuir mais para os nossos semelhantes.

O Kali-Yuga é o grande paradoxo. É a idade mais negra e ao mesmo tempo é a idade na qual podemos atingir a sabedoria e o discernimento espiritual mais rapidamente.


O homem faz os tempos; os tempos não fazem o homem

Portanto, com base nos conhecimentos da Theosophia, não gostaríamos de afirmar que o Kali-Yuga é uma idade maligna. Uma idade é em si própria neutra. Será um dia de inverno pior que um de outono? Será um dia de 2014 pior que um de 1914? As idades são neutras.
As pessoas é que dão o colorido às eras. O homem faz os tempos; os tempos não fazem o homem.

Evidentemente, cada idade oferece as suas próprias possibilidades. Durante o inverno fazemos coisas diferentes de quando é verão. Contudo, o recurso a essas possibilidades está dependente do próprio ser humano. Nós próprios é que fazemos a idade. Não há nenhum fado que nos traga a guerra, a violência ou o crescimento espiritual. É o homem que se encarrega disso. Cada um de nós faz as suas escolhas individualmente e decide se usará as oportunidades de uma idade para maior crescimento espiritual ou para egoísmo e para cultivar um sentimento de separatividade. Deste modo moldamos coletivamente a sociedade. O tempo não o faz, fazemo-lo nós próprios.

Ora, o Kali-Yuga força-nos a fazer mais escolhas que qualquer outra era. Quando há pressão e tudo é tão intenso, somos forçados a mostrar quem realmente somos.

Compare-se a uma situação de guerra. Nos tempos de paz e de felicidade não há necessidade de mostrar quem somos. Contudo, quando há tensão e perigo, somos forçados a fazer escolhas. Por exemplo, escolhemos nos salvaguardar à custa dos demais, ou sacrificamo-nos e ajudamos os nossos irmãos, ignorando perigos mortais? Este género de situações de pressão forçam-nos a assumir uma posição. Se escolhermos a unidade e o TODO, crescemos.

Durante o Kali-Yuga, o sofrimento pode ser enorme. Há adversidade, há provação. Contudo, a adversidade pode ser um incentivo para o desenvolvimento espiritual. Através da luta, através da dor, somos capazes de praticar a paciência, a perseverança, o nosso sentido de proporcionalidade, de compaixão. Também podemos mostrar que princípios formam a verdadeira base para os nossos atos.

Muitas vezes o homem eleva-se a grandes alturas em circunstâncias estranhas, em tempos de caos, guerra, tirania ou pobreza extrema. Não é verdade que estas desgraças sejam necessárias para o crescimento da consciência, mas parece que exatamente durante estes tempos negros, as pessoas têm uma noção mais profunda do significado da vida e exprimem isto realizando grandes obras.

Tudo se torna mais líquido sob pressão. Portanto, o Kali Yuga pode funcionar como um catalisador, pelo qual os elementos inferiores e superiores quer do homem individual e da humanidade se separam. Em tempos difíceis temos a oportunidade para apelar aos aspetos mais nobres da nossa consciência e mostrar aquilo que somos intrinsecamente: um ser divino.

Continua na próxima semana.


sábado, 19 de novembro de 2016

Kali-Yuga: uma idade de crescimento ou de decadência espiritual? (3.ª parte)


Esta semana publicamos a terceira parte do artigo de Barend Voorham "Kali-Yuga: uma idade de crescimento ou de decadência espiritual?".

Voorham é um membro da Sociedade Teosófica de Point Loma - Blavatskyhouse. Esta organização, além de publicar a revista Lucifer em holandês e inglês (de onde é originário este artigo), também promove um conjunto de palestras, também em língua inglesa, sobre variados temas que estão disponíveis online aqui.




Antes de prosseguir, recomenda-se a leitura das duas partes anteriores.


Satya-Yuga

Podemos observar vários aspetos na tabela acima. Primeiro, que para o homem as durações das idades são quase infinitamente longas. Estamos habituados a pensar em anos ou séculos no máximo. 

Uma idade com uma duração de mais de quatro milhões de anos está para além do nosso referencial.

Em segundo lugar, podemos observar que as idades mais virtuosas, nas quais o Dharma está mais implantado na sociedade, duram mais que as idades menos virtuosas. O Kali-Yuga dura não mais que um décimo da era completa e é quatro vezes mais curto que a Idade de Ouro, o Satya-Yuga.

Os antigos Gregos e Romanos referiam-se a esta idade como o século de Saturno. Esse era o século da inocência. É o período de tempo no qual o homem não tem nenhuma ou quase nenhuma responsabilidade e não é portanto sobrecarregado com preocupações. É a fase infantil. As crianças também vivem num mundo paradisíaco. Ainda não têm grandes responsabilidades. A criança pouco desenvolveu os aspetos da sua consciência.

Portanto, ainda não tem ainda todas as faculdades e é muito menos responsável do que um adulto com as capacidades normais.

No Mahâbhârata é dito que nesta idade não existem ricos nem pobres. Não havia necessidade de trabalhar, porque tudo aquilo que era preciso obtinha-se pela força de vontade. Não havia doenças, não se perdia capacidades com o envelhecer. Não havia ódio nem vaidade.

O Satya-Yuga era uma idade de abundância na qual a vida decorria calmamente. Não existiam grandes problemas, era um ambiente calmo, mas bastante estático. Provavelmente é atrativo para as pessoas das sociedades contemporâneas, pois temos um forte desejo pela serenidade. Contudo, a questão aqui é se realmente desejaríamos viver uma vida sem desafios. Alguém suspira pelo tempo em que era bebé?

A vida no Satya-Yuga era calma e pacífica. A duração da vida estava em linha com isto, dado que os textos antigos referem que esta duração de vida também está relacionada com os mesmos números: 4: 3:2: 1. No Satya-Yuga as pessoas viviam durante 400 anos, no Tretâ-Yuga por 300 anos, no Dwâpara-Yuga por 200 anos e finalmente no Kali-Yuga por 100 anos. Para nós, estes números parecem improváveis, embora em antigos mitos, como por exemplo, no Antigo Testamento, as pessoas supostamente tinham ainda mais idade. Não é referido que Matusalém viveu 969 anos?

É claro que isto são médias, contudo, no que se refere a indivíduos, a duração de vida no Kali-Yuga é quatro vezes mais pequena que o Satya-Yuga.


Kali-Yuga: a Idade Negra

O descanso bem-aventurado do Satya-Yuga é gradualmente substituído por mais inquietação. Não vamos discutir aqui as outras duas fases. Elas têm uma posição intermédia entre a paz da Idade de Ouro e a inquietude da Idade do Ferro. Podemos vê-las como uma versão proporcionalmente mais calma do Kali-Yuga. Esta última tem uma má reputação. A guerra e a violência e todos os sofrimentos com ela relacionados, são muitas vezes atribuídos a esta Idade Negra.


Nandi, o boi do Dharma


Nandi, o boi do Dharma, é usado como uma metáfora para a decadência ética nas quatro idades. Por exemplo, no “Mahâbhârata” é referido: “…no Satya-Yuga, a ética é como um boi entre os homens que se apoia nas quatro patas. No Treta-Yuga, o pecado levou uma dessas patas, a ética ficou apenas com três patas. No Dwâpara-Yuga existe tanto pecado como ética, e portanto diz-se que a ética só tem duas patas. Na idade negra de Kali (…) a ética existe entre as pessoas com três partes de pecado. 

Portanto, diz-se que a ética aguarda entre as pessoas, com apenas com a quarta parte que lhe resta.
Saiba, Ó Yudhishthira,o período de vida, a energia, o intelecto e o poder físico do homem diminuem em cada Yuga.” (1)
  
De acordo com o Surya Siddhanta – um livro astrológico com uma idade incomensurável – o Kali Yuga começou à meia-noite do dia 23 de janeiro de 3102 A.C.. Portanto, o Kali Yuga começou há 5116 anos [NT: o artigo foi escrito em 2014]. No início do período havia uma peculiar disposição planetária; quase todos os planetas estavam alinhados. Começou com a morte de Krishna, que é a descrita no grande épico “Mahâbhârata. O fulcro deste épico notável é uma guerra entre dois lados de uma família. Parece que este conflito dá uma indicação clara das caraterísticas do Kali-Yuga: guerra, infidelidade e violência, em suma, tudo aquilo que podemos ler também nos jornais dos dias de hoje. Em muitas obras em Sânscrito, o Kali Yuga é descrito como uma época na qual o Dharma definha. É um tempo de ignorância. As pessoas não mantêm as suas promessas e acordos. Não entendem que a ganância é algo errado, e alguns não se apercebem de que a hostilidade ou mesmo o homicídio não são toleráveis. 

Nos livros Hindus, como o “Vishnu Purâna”, esta idade negra é descrita da seguinte maneira: os bárbaros serão os donos na fronteira do rio Indo. Os reis estarão viciados no poder e estarão em guerra uns com os outros continuamente. O mais forte será aquele que governará. Haverá violência, malícia e perversidade. O bem-estar diminuirá. A riqueza será a única forma de devoção. A palavra dos ricos prevalecerá. Os pobres não têm escolha. O único compromisso entre sexos vem da paixão. A erudição é ridicularizada. Não haverá compaixão. Haverá todo o tipo de vício, que advém do facto das pessoas verem o seu trabalho como esgotante e insatisfatório. A divisão natural entre as quatro castas cairá. Os instrutores sábios (Brahmans) não serão reconhecidos. Os guerreiros (Kshatriyas) não mais serão corajosos. Os comerciantes (Vaiśyas) já não serão honestos e os servos (Śudras) já não serão humildes. (2)


Notas:

(1)  Mahâbhârata, Livro 3: VanaParva:Markandeya-Samasya Parva: Secção CLXXXIX, http://www.sacred-texts.com/hin/m03/m03189.htm

(2) Ver: H.P. Blavatsky, The Secret Doctrine. 2 Volumes, Theosophical University Press, Pasadena 1988, Volume 1, pag. 424-425 (pag. 377-378 orig. edição original em Inglês; pág. 84-85 do vol.II da edição em língua Portuguesa).

Continua na próxima semana.

sábado, 12 de novembro de 2016

Kali-Yuga: uma idade de crescimento ou de decadência espiritual? (2.ª parte)

Na semana passada iniciámos a tradução do artigo "Kali-Yuga: uma idade de crescimento ou de decadência espiritual?" retirado desta edição da Lucifer em inglês, que é publicada pela Sociedade Teosófica de Point Loma - Blavatskyhouse, que tem sede em Haia, na Holanda.

Esta organização é uma das mais ativas hoje em dia na promoção da Teosofia, embora só esteja efetivamente presente na Holanda e na Alemanha. A mesma é herdeira da chamada tradição de Point Loma. Em 1895 dá-se a cisão na Sociedade Teosófica. Judge forma a sua própria organização que irá assentar arraiais em Point Loma, na costa ocidental dos EUA. Seria palco de uma grande comunidade de teosofistas, cuja história é contada magistralmente neste artigo do San Diego Reader. Nos anos 50, já instalada noutro espaço (em Pasadena, depois de ter saído de Point Loma em 1942, por questões financeiras, tendo ainda se instalado em Covina até 1945), dá-se um problema na sucessão desta organização teosófica. William Hartley, derrotado nesse processo altamente controverso vai fundar uma nova organização, a ST Point Loma - Blavatskyhouse. Herman Vermeulen, é o seu presidente desde 1985.


Herman Vermeulen
(foto retirada de: blavatskytheosophy.com)



Antes de prosseguir para a 2.ª parte, recomenda-se a leitura da introdução que antecedeu a publicação da 1.ª parte, feita na semana passada.





Yugas

Como já foi explicado, no ilimitado só existem pontos de início e de fim relativos. No Oriente, estes são descritos como a inspiração e expiração da divindade Brahmâ. Quando Brahmâ expira, existe um início relativo: a manifestação começa. Quando Brahmâ inspira há um fim relativo: a manifestação cessa de existir. Contudo, depois de um período de repouso, Brahmâ expira novamente e uma vez mais o Cosmos vem à existência.

Portanto, existe um processo cíclico contínuo de expiração e inspiração. Temos de ver a noção de Yuga dessa perspetiva. Yuga é uma palavra sânscrita, que literalmente significa “ciclo”. Um ciclo não é tanto um círculo, mas uma espiral. Como numa escada em espiral, sobe-se em círculos.

Existe outra palavra sânscrita que expressa a mesma ideia: Kala-Chakra, a roda do tempo. O tempo gira como uma roda. As idades vão e vêm e voltam de novo. E sempre retornam num nível ligeiramente superior.

Ora, esta roda gira numa determinada proporção, que é 4, 3, 2, 1 ou repouso, e depois 4, 3, 2, 1 outra vez e assim por diante. De acordo com a literatura Sânscrita estas proporções numéricas existem em todo o lado na natureza. Aplicam-se da mesma forma à vida num planeta, a um sol, bem como à vida da Terra, ou a uma fase da vida na Terra. Sempre encontramos esta mesma relação do 4, 3, 2 e 1. Portanto, um ciclo consiste de quatro idades.


Os quatro Yugas

O famigerado Kali-Yuga é uma destas quatro idades. É parte de um grande ciclo de mais de 4 milhões de anos, chamado pelos Hindus de Mahâ-Yuga, ou Grande Yuga. Mil Mahâ-Yugas constituem um ciclo de vida de um planeta. Nesse Mahâ-Yuga estas quatro idades são assim designadas:

Satya-Yuga     4
Tretâ-Yuga      3
Dwâpara-Yuga      2
Kali-Yuga       1

Os números que colocámos à frente de cada idade indicam as proporções entre estes quatro Yugas. Portanto, o Satya-Yuga – literalmente a idade da verdade – é quatro vezes mais longa que a idade mais curta, o Kali-Yuga.

De facto, não interessa a que ciclos se aplicam estes rácios. Eles são universais, e portanto, aplicáveis à vida de um sistema solar – a vida de Brahmâ – como à de um planeta, de um povo e até de homem. A única coisa que precisamos de fazer é pegar nos números 4, 3, 2, 1 como ponto de partida e por exemplo colocar um, dois, três ou dez zeros à frente. Quando diz respeito a eras de pequena duração devemos colocar um ou mais zeros antes de um ponto. Contudo, estes números também indicam as caraterísticas destes Yugas, ou seja, estão associados com o Dharma. Dharma significa Lei ou Dever no sentido da lei natural divina. Portanto, também podemos entender o Dharma como a religião, filosofia, ciência e ética verdadeiras. É a expressão da perfeita harmonia e unidade. Quando o Dharma é praticado, temos uma sociedade baseada na ética, dignidade humana, compaixão e respeito. As pessoas vivem de acordo com as regras éticas universais.

Nas metáforas típicas dos Hindus diz-se que o boi do Dharma – o símbolo da vivência de acordo com o Dharma – está apoiado nas quatro patas no Satya-Yuga, em três no Tretâ-Yuga, em duas do Dwâpara-Yuga e apenas numa no Kali-Yuga. Desta forma, a decadência, a degeneração da ética é salientada. (1)

Podemos encontrar uma ideia similar na Grécia antiga. Aí, as quatro idades eram chamadas de Idades do Ouro, da Prata, do Bronze e do Ferro. O nível interno da civilização decresce continuamente. Os Babilónios devem ter conhecido também estas idades, avaliando pelo sonho de Nabucodonosor mencionado na Bíblia (Daniel 2:32-33). Ele sonha com uma estátua gigante com uma cabeça dourada, peito de prata, ventre de cobre e pernas de ferro. É uma representação simbólica da evolução da humanidade, que se estende por mais de quatro idades.

Quanto tempo duram estas idades?

Como já foi explicado, em princípio podemos aplicar estes quatro Yugas a cada ciclo de vida, pequeno ou grande. Contudo, na maior parte dos casos, eles são aplicados ao que se designa por Mahâ-Yuga.

A duração destes destas quatro idades é fornecida em antigos textos Hindus como o Vishnu Purâna. Aí, os números elementares 4, 3, 2 e 1 surgem novamente. Contudo, cada uma das quatro idades tem uma fase inicial e outra terminal. Por outras palavras, existe uma alvorada e um crepúsculo. Em Sânscrito, isso é designado, respetivamente, por Sandhyâ e Sandhyânsa. A duração, quer da Sandhyâ quer da Sandhyânsa é de um décimo do respetivo Yuga. Isso é explicitado na imagem abaixo:
Caso queiramos saber quanto isto representa em anos terrestres, há que multiplicar estes números por 360.




Este número está relacionado com a rotação de outros planetas à volta do Sol. Afinal de contas, os ciclos na Terra estão relacionados com os movimentos de outros corpos celestes. Existe uma relação próxima entre o Sol e os planetas. Eles influenciam-se mutuamente.

Conforme mostra a tabela, existe uma regularidade matemática nestes ciclos orbitais. Há uma correspondência entre as suas frequências. Note-se que a tabela tem os números arredondados. Ao longo de muitos séculos de existência, os planetas podem mudar ligeiramente a sua velocidade de rotação. Isto tem a ver com o livre arbítrio, que todo o ser vivo tem.

A rotação de Júpiter e de Saturno tem a duração mais longa. Quando se multiplica os seus períodos orbitais (12x30), obtemos o número 360. Um ciclo completo leva 360 anos terrestres. Assim, para os planetas visíveis a partir da Terra, todas as combinações possíveis estão identificadas.


É por esta razão que o número 360 era muito importante para os Hindus e também para os Babilónios, os Maias e muitos outros povos. Portanto, caso queiramos saber a duração dos Yugas em anos terrestres, temos que multiplicar os anos divinos por 360. (ver quadro).




Continua na próxima semana.

sábado, 5 de novembro de 2016

Kali-Yuga: uma idade de crescimento ou de decadência espiritual? (1.ª parte)

O Lua em Escorpião inicia hoje a publicação de um artigo que fez parte integrante do número 2/2014 da revista Lucifer, da Sociedade Teosófica de Point Loma-Blavatskyhouse. O mesmo trata sobre o Kali Yuga, o período em que nos encontramos atualmente e que se iniciou com a morte de Krishna, a 23 de janeiro de 3102 A.C.

O autor deste texto, é Barend Voorham, um dos mais proeminentes membros daquela organização teosófica. Voorham esteve recentemente no Brasil, mais precisamente na edição de 2016 da Escola Teosófica Internacional, onde fez várias comunicações. Esta colaboração entre tradições teosóficas distintas é o reflexo benéfico de uma das ideias saídas das Conferências Internacionais de Teosofia, mais precisamente a da "polinização cruzada", que pode ser concretizada - como foi aqui o caso - pela presença de oradores de organizações teosóficas distintas nas conferências e palestras.


Barend Voorham


O Lua em Escorpião acabou também por estar ligado indiretamente a este evento. Aproveitando a quantidade de artigos já publicados em língua portuguesa por este blogue, a Blavatskyhouse elaborou uma edição especial em língua portuguesa, que foi distribuída a alguns dos presentes na Escola Teosófica Internacional (e que rapidamente se esgotou, segundo os relatos que nos chegaram). A mesma está disponível aqui. Neste número, está já incluído o texto que hoje, o Lua em Escorpião começa a publicar. Com efeito, o texto foi por nós enviado a Barend Voorham para ser integrado nesta edição especial.

Avancemos para a publicação da primeira de seis partes deste excelente artigo.



Kali-Yuga: uma idade de crescimento ou de decadência espiritual?

por Barend Voorham



Vivemos tempos de inquietude. De acordo com algumas pessoas os tempos são tão negros e sinistros, que estamos caminhando rapidamente para a nossa perdição.

“Vivemos no fim dos tempos”, dizem as pessoas. Diz-se que isto está relacionado com o Kali-Yuga, a Idade do Ferro.

É na verdade o Kali-Yuga uma idade tão negra?

Esta é uma investigação aos antigos textos hindus e à nossa era moderna.



Nandi, o boi do Dharma


IDEIAS-CHAVE

  • As idades têm tudo a ver com os ciclos cósmicos.

  • Um ciclo pode ser dividido em quatro idades, que estão relacionadas entre si através de 4 : 3 : 2 :1.

  • Cada uma destas idades tem uma fase inicial e uma fase final.


  • O Satya-Yuga é a idade espiritual e de paz. É a fase infantil. As pessoas não têm ainda muita responsabilidade.


  • O Kali-Yuga começou em 3102 A.C. durante uma circunstância cósmica especial.


  • No Kali Yuga a ética está sob pressão; tudo é intenso e acontece rapidamente; há uma forte influência da Luz Astral; há grandes oportunidades para crescimento e declínio espiritual.


  • Durante o Kali-Yuga o novo grande ciclo (raça-raiz) desponta.


  • Cada novo ciclo começa com um pequeno número de pessoas com uma mentalidade diferente.


Tal como todos os outros povos da Antiguidade, os Hindus tinham uma visão cíclica do tempo. Não há um início absoluto, o momento em que o tempo começou. Em sentido absoluto, o universo não começou com um big bang, depois do qual a vida e o tempo vieram à existência. Da mesma forma uma vida individual não começa com a conceção.

Os antigos textos hindus retratam o conceito de ilimitado. A bem conhecida afirmação dos Upanixades “TAT twam asi” – tu és AQUILO, ou: tu és o Ilimitado, expressam isto de modo conciso.

Portanto, nada é criado no sentido literal da palavra; nada foi feito a partir do nada. Tudo esteve sempre lá. E tudo – o cosmos, o homem ou o átomo – aparece ciclicamente. Mal a consciência adormecida desperta novamente, o tempo começa. O SER eterno, a nossa essência mais profunda, não conhece o tempo, apenas a Duração ilimitada.


Capa da edição especial da Lúcifer
em língua portuguesa


O que são idades?

No que se refere ao tempo, a primeira coisa que podemos notar é que está relacionado com a perceção de movimentos de objetos ou corpos. Tomamos o ciclo astronómico como a unidade do tempo, por exemplo, a rotação do nosso planeta à volta do seu eixo. Isto dá-nos o ritmo do dia e da noite. Dividimos este período em 24 unidades, a que chamamos horas. Além disso, a Terra orbita à volta do Sol em 365,25 dias, ou seja revolve 365,25 vezes à volta do seu eixo, enquanto completa a sua órbita à volta do Sol.

Portanto, são sempre fenómenos externos, como a rotação da Terra à volta do Sol e da Lua à volta da Terra em órbitas cíclicas, que interpretamos e explicamos através de determinadas unidades de tempo.

Contudo, quando não estamos neste mundo dos fenómenos, por exemplo, quando estamos a dormir, a sonhar, ou mortos, desconhecemos de todo o tempo. Não existem relógios nos nossos sonhos. Quando acordamos depois de um sonho, muitas vezes não sabemos se dormimos por uma ou duas horas ou apenas por alguns minutos. A forma como valorizamos o tempo depende do nosso estado de espírito. Não parece que as duas horas no cinema passaram muito mais rapidamente do que meia hora na cadeira do dentista? Em resumo, o tempo está sempre relacionado com a manifestação - com as coisas, com os fenómenos, com a interpretação, com a apreciação, e portanto é uma ilusão.

Em Sânscrito isto é chamado de Mâyâ, o que significa “medida”. Tudo o que pode ser medido é uma ilusão. Isso significa: é de uma natureza transitória e não tem sustentabilidade por si só. É a consequência de algo que se esconde por trás dessa aparência. Portanto, uma idade é o período em que algo é manifestado.

Por exemplo, um homem nasce. A sua “idade” começa. Depois de cerca de 70 anos ele morre. Então, num certo sentido, também o tempo para, pelo menos para ele, dado que não há manifestação. Só quando este homem nasce outra vez e reaparece neste mundo ilusório, existe de novo uma noção de tempo.

Devemos entender as grandes idades da mesma forma. Elas são os ciclos de vida de um ser ou de um grupo de seres.

Continua na próxima semana.