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sábado, 30 de março de 2013

A Crise da Zona Euro vista pela astrologia


No início de março passado, o site da revista de astrologia “The Mountain Astrologer” publicou um interessante texto escrito por Nicholas Campion sobre os desenvolvimentos da crise na Zona Euro à luz da astrologia. A turbulência na economia mundial havia sido prevista há vários anos por muitos astrólogos e já havíamos falado dela aqui. Na verdade, os trânsitos de Plutão e Urano eram bastante reveladores. Tendo entrado em signos cardinais em alturas muito próximas (Capricórnio e Carneiro respetivamente), aqueles dois planetas exteriores, que fazem nesta fase uma quadratura entre si (ou seja distam 90 graus um do outro), não auguravam bons tempos. Plutão em Capricórnio, por exemplo, é normalmente associado à destruição de estruturas da sociedade e realmente tem abalado de forma muito notória a estrutura financeira das economias mundiais com repercussões na chamada economia real. Plutão continuará em Capricórnio até 2024. Urano em Carneiro é considerado um promotor de extremismos. Neste artigo, a astróloga australiana Michelle Finey define os ciclos de interação entre estes dois planetas exteriores como a luta entre a liberdade (Urano) e a sobrevivência (Plutão).


Voltando a Campion (no video abaixo falando sobre a história e a astrologia), ele começa por se debruçar sobre a importância de ciclos planetários, salientando Platão, que no Timeu argumentava que como os planetas voltavam inevitavelmente ao mesmo lugar, os temas repetem-se, embora os detalhes naturalmente variem. Este aparente determinismo acaba por ser temperado pela ação humana e pelo livre-arbítrio. Na cosmologia ptolemaica (e também na de Kepler), a previsão astrológica tem como objetivo poder alterar o futuro, no sentido, em que se tenta evitar um desfecho provavelmente desfavorável.


A discussão sobre o peso do destino por contraponto com o livre-arbítrio é omnipresente na astrologia e no caso da astrologia mundana não é exceção (note-se que Campion prefere lhe chamar de astronomia política ou de cosmologia arquetípica em vez de astrologia mundana,  por não se usar as casas, nem as posições dos planetas nos signos).

Relativamente à crise da zona Euro, Campion refere que efetivamente a previsão determinista é da pulverização da moeda única tal como ela está configurada, ou seja, com os 17 países que aderiram ao Euro. Esta posição é também parcialmente fundamentada numa análise económica, sustentada no facto de os níveis de endividamento serem muito elevados em alguns dos países, sendo a solução mais óbvia a de voltarem às suas moedas nacionais e procederem a uma depreciação. Além do mais, acrescenta Campion, haverá a tendência para os governos pró-austeridade perderem as eleições e serem substituídos por outros que acabem por agravar os problemas de dívida deterioriando ainda mais a situação.

Johannes Kepler (1571-1630)

Campion classifica o modelo de previsão astrológico como idealista, em contraponto com o materialista (o dos analistas económicos), que tem repetidamente falhado, pois os modelos de previsão não funcionam bem em alturas tão turbulentas. Normalmente os modelos de previsão tentam prever os crescimentos do Produto Interno Bruto (PIB) com base no histórico. Os economistas reconhecem estas limitações, e num registo de bom humor dizem que equivale a guiar um carro olhando pelo espelho retrovisor. Ao invés, a astrologia permite identificar as alturas de viragem, positivas e negativas (se bem que alguns modelos econométricos contemplem a consideração dos altos e baixos na economia, que são na verdade, cíclicos). A astrologia alertará para aquilo que no modelo materialista seria completamente inesperado.

Concretamente no caso da crise da zona Euro, a quadratura Urano-Plutão arrasta consigo algum pessimismo face ao desfecho da situação atual, cuja solução parece difícil de encontrar até que a quadratura se desfaça por no fim do primeiro trimestre de 2015.

Foto de Urano tirada pelo Voyager 2

Em 2013 e 2014 os trânsitos mais relevantes para Campion são os seguintes:

2013

Maio:  Urano em quadratura a Plutão nos dias 20 e 21;
Julho:  Marte em  Caranguejo fazendo quadratura a Urano no dia 1 e Júpiter no mesmo signo  oposto a Plutão no dia 6, fazendo quadratura a Urano no dia 21.
Novembro:  Urano faz quadratura a Plutão no dia 1;
Dezembro:  Marte em Balança oposto a Urano no  dia 25 e fazendo quadratura a Plutão a 31.

2014

Fevereiro:  Júpiter em Caranguejo oposto e Plutão no dia 1 e em quadratura a Urano no dia 26;
Abril:  Júpiter em Caranguejo oposto a Plutão em quadratura a Urano a 19-20; Urano em quadratura a Plutão no dia seguinte; Marte em Balança oposto a Urano e em quadratura a Plutão nos dias 23 e 24;
Junho: Marte em Balança faz quadratura a Plutão no dia 14 e oposto a Urano no dia 25;
Novembro: Marte em Capricórnio conjunto a Plutão no dia 10 e em quadratura e Urano no dia 13.

2015

Março: Marte em Carneiro conjunto a Urano e em quadratura a Plutão no dia 11; Urano e Plutão em quadratura no dia 17.


Campion considera que as alturas de maior pressão serão os meses de julho e agosto já este ano e fim de abril/início de maio no próximo ano. A análise puramente determinista traduzir-se-ia no facto de nestas datas se poder assistir ao fim da zona Euro tal como ela existe presentemente. Contudo, uma análise na linha de Platão ou Kepler, introduz um ponto importante que é de políticas adequadas poderem evitar um desfecho desses. Decisões de cariz político que poderão passar pela introdução de mais liquidez nos mercados financeiros por parte do Banco Central ou maior integração financeira.

Imagem gerada por computador
de Plutão
Campion apresenta no seu artigo dois mapas, um da formação da Comunidade Económica Europeia (em 1 de janeiro de 1958) e outro do Euro (em 1 de janeiro de 1999), ambos incluídos no seu livro “The Book of World Horoscopes”, onde Campion apresenta quase 500 mapas para países e eventos mundiais e que é uma referência para quem estuda astrologia mundana. Campion também foi o autor de outros livros de onde se destaca o excelente “History of Western Astrology” (2 volumes) e tem ligações ao meio universitário, mais concretamente à University of Wales Trinity Saint David. Aqui está o seu site pessoal.



Quanto a quem acerta mais, se os economistas se os astrólogos, o debate continuará no meio de algumas piadas. Há também quem entenda das duas coisas...

sábado, 23 de março de 2013

Mahatmas versus Mestres Ascensos (4ª parte)


Com este post termina a tradução do artigo “Mahatmas versus Ascended Masters” de Pablo D. Sender.

"Os Mestres Ascensos são apresentados como pais cósmicos que vão tomar conta dos problemas dos seus seguidores. Ao invés, o Mahatma M. disse: “ Nós somos líderes, mas não amas-secas” (Sven Eek, Damodar and the Pioneers of the Theosophical Movement, p.605). Os adeptos são impessoais, forças universais, e respondem apenas àqueles que se desenvolvem nessa direção:

“Embora toda a humanidade esteja dentro da visão mental dos Mahatmas, não se pode esperar que deem especial atenção a cada ser humano, a menos que esse ser pelos seus atos atraia a atenção particular sobre ele. Os interesses mais elevados da humanidade, como um todo, são a sua principal preocupação, pois eles identificaram-se com aquela Alma Universal que abarca toda a humanidade, e aquele que queira chamar à atenção, deve fazê-lo através daquela Alma que tudo abrange (HPB Collected Writings, 6:240).


Os Mahatmas não se comunicam de forma indiscriminada com pessoas que não entendem a ilusão do eu pessoal, ou que são dirigidas pelos desejos, medos e ambições:

“Eles trabalham neste plano através de dois tipos de agentes: diretos e indiretos. Qualquer pessoa sincera e não egoísta trabalhando em linha com os Mestres pode receber a sua inspiração mesmo que não os conheça. Os seus agentes diretos são os seus discípulos aceites, que trabalham conscientemente com os Mestres” (Clara Codd, Theosophy as the Masters see it, TPH, 2000).

Clara Codd (1876-1971)

A sua influência está sempre disponível para aqueles de nós que agem com altruísmo e compaixão, embora nós estejamos completamente inconscientes disso. Como K.H. escreveu a Annie Besant: “Em períodos favoráveis, libertamos influências elevadoras que impressionam várias pessoas de diferentes maneiras. (Cartas dos Mestres de Sabedoria, p.106). Assim cada ato filantrópico que realizamos pode ser parte do trabalho dos Mahatmas. Contudo, apenas discípulos aceites têm uma relação pessoal e consciente com eles. As qualificações morais e espirituais necessárias para ser um discípulo aceite são muito profundas e exigentes e muito poucos na humanidade têm o nível de maturidade espiritual para atingi-las.

Os ensinamentos dos Mahatmas têm como finalidade ajudar as pessoas a se erguerem acima do ego pessoal e a perceber o Eu espiritual. Abordagens como aquelas que vemos no meio do New Age têm sido caracterizadas pelo lama tibetano Chögyam Trungpa como “materialismo espiritual”. Embora não se negue a realidade do espiritual, estes indivíduos tentam pô-lo ao serviço daquilo que é pessoal e material. Esta abordagem é apelativa para muitos que não estão preparados para transcender o ego pessoal, e tornou o New Age num importante negócio.

Quem são os Mestres Acensos?

Quem, então, são estes Mestres Ascensos que se têm comunicado com milhares de canais em todo o Mundo? Não podemos ter a certeza. Mas para analisar esta questão é necessário perceber que os planos internos são habitados por todos os tipos de entidades (elementais, formas-pensamento, pessoas que faleceram, pessoas vivas cujos corpos descansam, etc…) Muitas destas entidades gostam de representar o papel de mestres, santos e outras importantes figuras históricas.

Mesmo nos primeiros dias da ST, médiuns e sensitivos começaram a canalizar mensagens de falsos Mahatmas. Por exemplo, depois de um sensitivo chamado Oxley ter declarado que K.H. tinha-o “visitado três vezes em forma astral e ... que tinha conversado com o Sr. Oxley”, o Mahatma pediu ao seu discípulo Djual Kool, para escrever ao Sr. Sinnett dizendo: “Quem quer que seja que o Sr. Oxley possa ter visto e com quem tenha conversado na ocasião descrita não é Koot Hoomi” (Cartas dos Mahatmas para A.P.Sinnett, vol.II , p.31).

A.P. Sinnett

Num outro momento, havia um médium que alegava estar em contacto com personagens como Jesus, João Baptista, Hermes e Elias. Numa carta para o Sr. Sinnett referindo-se a este tipo de comunicação psíquica, K.H. escreveu: “Mistério, mistério, exclamará você. IGNORÂNCIA, nós respondemos: a criação daquilo em que cremos e que nós queremos ver.” (Cartas dos Mahatmas para A.P.Sinnett, vol.II , p.185).

Temos de ter presente que “(…) o mundo psíquico das perceções supersensíveis e visões enganosas – o mundo dos médiuns (…) é o mundo da Grande Ilusão.” (H.P. Blavatsky, A Voz do Silêncio, p.48, Ed. Pensamento). Naquele domínio diferentes entidades assumem qualquer forma de acordo com o que veem na mente do vidente. Profundos poderes de clarividência, longo treinamento e uma grande maturidade espiritual são necessárias para não ser enganado por estas entidades, porque:

“O mais leve desejo de concretização lá [no plano psíquico] toma conteúdo e forma. Uma forma-pensamento pode ser animada por um espírito da Natureza…e assim aparecer com um anjo de luz, dizendo-nos aquilo que queremos ouvir” (Clara Codd, The Way of the Disciple, TPH, 1988)

Corroborando isto, Blavatsky oferece um sugestivo facto histórico. Escrevendo em 1889, ela observa:

“(…) há apenas catorze anos atrás, antes da Sociedade Teosófica ser fundada, tudo o que se falava era sobre “espíritos”(…) e ninguém, nem mesmo por acaso, sequer sonhava em falar sobre “Adeptos vivos”, Mahatmas ou “Mestres” (…) Agora tudo isso mudou. Nós, teosofistas, infelizmente, fomos os primeiros a falar destas coisas (…) e agora o nome tornou-se propriedade comum.” (H.P. Blavatsky, A Chave para a Teosofia, p.257)
HP Blavatsky

“Quase não há mais um médium que não declare tê-los visto. Todas as sociedades falsas e espúrias, com propósitos comerciais, declaram agora ser guiadas e direcionadas por “Mestres”, que com frequência se supõem ser muito superiores aos nossos!” (op.cit., p.256)

O conceito dos Mestres Ascensos é difícil de acreditar para muitas pessoas espiritualizadas, que veem neles nada mais do que o reemergir dos deuses tribais de antigamente. Esperamos que este artigo sirva para remover alguns dos equívocos."

Assim, termina o texto de Pablo Sender, que recebeu algumas críticas, que podem ser lidas aqui e aqui.

sábado, 16 de março de 2013

Mahatmas versus Mestres Ascensos (3ª parte)


Seguimos com a 3ª parte da tradução do artigo “Mahatmas versus Ascended Masters” de Pablo D. Sender.

"O verdadeiro Mahatma é portanto primordialmente visto, como um estado de consciência espiritual, e as formas assumidas pelo seu aspeto pessoal são apenas sombras. Para ter a certeza, nós podemos encontrar descrições do aspeto da “forma” dos Mahatmas na literatura teosófica, não porque este aspeto seja importante em si mesmo, mas porque ele fornece algo para ser apreendido e compreendido pelas nossas mentes limitadas. Mas este aspeto pessoal é suposto ser transcendido e quem se satisfizer apenas com ele está preso no mundo da ilusão.

O trabalho dos mestres pela Humanidade

Hoje em dia, milhares de pessoas alegam que estão a canalizar Mestres Ascensos. É ponto assente que estes Mestres Ascensos têm a sua atenção virada para este plano físico, fazendo pouco mais do que comunicar connosco através de canais. Isto é, uma vez mais, outra diferença com os ensinamentos teosóficos. Na Teosofia, assim como na maior parte das tradições espirituais, este plano físico é visto como uma ilusão. O Maha Chohan, um dos adeptos mais elevados, disse: “Ensine-se o povo a ver que a vida nesta Terra, mesmo a mais feliz, é apenas um fardo e uma ilusão (…)” (Cartas dos Mestres de Sabedoria, p.20). Este conceito faz eco dos ensinamentos de Platão, que disse que este mundo é apenas uma sombra da Realidade. Também está relacionado com a primeira Nobre Verdade que o Buda ensinou depois da sua iluminação: “Tudo é dukkha (sofrimento) neste mundo.”


Consequentemente, tal como disse Annie Besant dos Mestres, “a menor parte do seu trabalho é feito aqui”  em conexão com o plano físico. Esta é a razão de eles viverem em reclusão – a maior parte da sua atividade tem lugar nos planos superiores. Isto é de facto, baseado num profundo conhecimento da estrutura do cosmos:

“Poderá ser facilmente observado por quem examina a natureza da dinâmica oculta, que uma certa quantidade de energia despendida no plano astral ou espiritual produz muito maiores resultados que a mesma quantidade despendida no plano objetivo físico da existência.“ (HPB Collected Writings, 5:338-39).

Então, qual é o trabalho dos Mestres nestes planos?

Este complexo assunto está para lá do âmbito deste artigo. Quando questionada sobre isto, Blavatsky respondeu: “ Você nunca entenderia, a menos que fosse um Adepto. Mas eles mantêm viva a vida espiritual da humanidade” (op.cit., 8:401).

Ao invés, comunicações canalizadas de Mestres Ascensos mostram uma grande preocupação com as vidas físicas e os anseios dos seus seguidores. A literatura dos Mestres Ascensos está cheia de promessas de milagres mágicos de saúde, riqueza infinita e felicidade perfeita, e “decretos” são fornecidos para permitir que as pessoas “manifestem” estas coisas nas suas vidas. Esta atitude é exatamente a oposta à teosófica.

Mestre M, retrato da autoria de Schmiechen

A Teosofia diz que o ego psicológico é falso, que a ideia de que somos este corpo, emoções e mente é um erro de perceção e fonte de sofrimento. Argumenta que a verdadeira felicidade vem como resultado de reduzir e não aumentar o nosso apego e identificação com o pessoal. É por isto que Blavatsky escreve que “O Ocultismo não é…a procura da felicidade tal como o ser humano entende essa palavra, pois o primeiro passo é o sacrifício e o segundo a renúncia” (op.cit, 8:14). K.H. concordava com isto quando escreveu: “Nós, os criticados e mal-entendidos Irmãos, tentamos levar os homens a sacrificar a sua personalidade – um relâmpago passageiro – pelo bem-estar de toda a humanidade (…)” (Cartas dos Mahatmas para A.P.Sinnett, vol.I , p.344). Os Mahatmas teosóficos nunca dariam atenção a desejos pessoais. Durante os primeiros tempos da Sociedade Teosófica, alguns membros, completamente equivocados sobre a natureza dos Mahatmas, levavam a HPB alguns pedidos pessoais para lhes serem feitos. Numa carta, Blavatsky explicou:

“Os Mestres não se iriam inclinar por um só momento a dedicar um momento de reflexão para o individual - assuntos privados relacionados com uma ou até dez pessoas, o seu bem-estar, infortúnios e felicidade neste mundo de Maya [ilusão] - por nada que não fosse de verdadeira importância universal. Foram vocês teosofistas, que depreciaram nas vossas mentes os ideais dos nossos Mestres. Vocês que inconscientemente e com a melhor das intenções e completa sinceridade, profanaram-nos, pensando por um momento, e acreditando que eles se incomodariam com os vossos assuntos mundanos, filhos por nascer, filhas para casar, casas para serem construídas, etc, etc…” (Jinarajadasa, The Early Teachings of the Masters).

Jinarajadasa

E contudo, é exatamente com este tipo de coisas que os Mestres Ascensos parecem estar preocupados. 

Eles até ensinam supostos meios de dissolver karma desagradável, um conceito que os Mahatmas teosóficos enfaticamente se opuseram. K.H. escreveu:

“Especialmente, você tem que ter em mente que a mais leve causa produzida, mesmo inconscientemente e com qualquer intenção, não pode ser desfeita, nem é possível intercetar o progresso dos seus efeitos – nem com a força combinada de milhares de deuses, demónios e homens.” (Cartas dos Mahatmas para A.P.Sinnett, vol.I , p.141).

Continua na próxima semana…

sábado, 9 de março de 2013

Mahatmas versus Mestres Ascensos (2ª parte)


Seguimos com a tradução do artigo “Mahatmas versus Ascended Masters” de Pablo D. Sender.

Pablo D. Sender

“O facto dos Mahatmas manterem os seus corpos é de grande importância. Eles são iogues iluminados, semelhantes em alguns aspetos àqueles que são tradicionalmente conhecidos no Oriente. Mas existe uma diferença. Um iluminado, depois de ter atingido a Verdade, ganhou o direito de se fundir com o Todo num estado de pura bem-aventurança (chamado de moksha ou nirvana). Este impede-o de estar em contacto com a humanidade, pois ele tem de abandonar os veículos inferiores da consciência. Ao invés, os mestres teosóficos, por compaixão, decidiram abdicar de entrar no nirvana para poderem ajudar-nos na nossa luta para atingir a Verdade. (…)

Os Mahatmas são, neste respeito, aquilo a que os Budistas Mahayana chamam de bodhisattvas. Eles escolhem manter o corpo, não por existir alguma falha no seu desenvolvimento mas como um ato de auto-sacrifício. Possuir um corpo físico sujeita os adeptos a inevitáveis limitações. Como disse Blavatsky, “eles são homens vivos, nascidos da mesma forma que nós, e condenados a morrer como todos os outros mortais.” [A Chave para a Teosofia, p.246]. Sendo iogues perfeitos, eles aprenderam como tomar conta dos seus corpos para que possam viver mais tempo que os seres humanos comuns. Não obstante, os corpos têm, por fim, de morrer.


As Cartas dos Mahatmas têm várias passagens sobre as limitações intrínsecas à existência física. Por exemplo, o Mahatma K.H. escreveu: “Eu estava fisicamente muito cansado por cavalgar 48 horas sem interrupção” (Cartas dos Mahatmas para A.P.Sinnett, vol.I I, p.241). Ele também disse que ficava limitado aos seus sentidos físicos e às funções do cérebro “quando sento para as minhas refeições, ou quando estou me vestindo, lendo ou ocupado de outro modo (…)” (Cartas dos Mahatmas para A.P.Sinnett, vol.II, p.37).

Mas o corpo físico é onde o desenvolvimento do Mestre é menos notório. Diz-se que se vemos um Adepto no plano físico, podemos não reconhecer nele nada mais que um homem bom e sábio. Contudo nos planos internos, a sua natureza está para lá daqueles que são apanhados na ilusão. Nas suas cartas, os Mahatmas diferenciam entre “homem interno” (o Eu espiritual do adepto que é relativamente omnisciente e que está para além das limitações) e o “homem externo”, que é uma expressão muito limitada do Eu espiritual funcionando através da personalidade psicofísica. É por isto que K.H. escreve “Nós não somos em todas as horas do dia, “Mahatmas” infalíveis, capazes de prever tudo (…)”(Cartas dos Mahatmas para A.P.Sinnett, vol.I I, p.315). Tal como ele explicou: “Um adepto – tanto o mais elevado como o mais inferior – é adepto apenas durante o exercício dos seus poderes ocultos. (Cartas dos Mahatmas para A.P.Sinnett, vol.I I, p.36).

Mestre KH, num retrato da autoria de Schmiechen

Estes adeptos, então, não são como os Mestres Ascensos do New Age, que se diz serem divinos, seres todo-poderosos que estão acima das leis da Natureza. Nos seus ensinamentos, os Mahatmas até negaram que tais seres existissem. K.H. escreveu:  “Se tivéssemos o poder do Deus Pessoal imaginário, e as leis universais e imutáveis fossem apenas brinquedos nas nossas mãos, realmente nós poderíamos haver criado condições que teriam transformado esta terra numa Arcádia de almas elevadas.”  (op.cit.,p.346). Nas suas cartas os Mahatmas constantemente falavam das “leis imutáveis” do Universo e dizem que só podem ajudar a humanidade dentro dos limites destas leis. Não podem produzir uma Nova Era por magia; quer gostemos ou não, esse trabalho é nosso.

Os proponentes dos Mestres Ascensos por vezes tentam justificar estas discrepâncias alegando que quando a ST foi fundada a maior parte dos Mestres teosóficos não tinham ainda ascendido. Isto deixa espaço para demarcar os Mestres Ascensos das limitações que todos os Mahatmas, “os mais elevados e os mais inferiores”, dizem ter. Mas de acordo com os ensinamentos teosóficos, quanto mais elevado o adepto, menos provável é ouvirmos falar dele:

“Quanto mais espiritual se torna o adepto, menos pode ele imiscuir-se com os assuntos mais grosseiros, mundanos e mais ele tem de se confinar a um trabalho espiritual…Portanto, os Adeptos muito elevados, ajudam a humanidade, mas apenas espiritualmente: eles são estruturalmente incapazes de se imiscuir em assuntos mundanos (HPB Collected Writings, 6:247).

HP Blavatsky


Outra característica dos ensinamentos dos Mestres Ascensos é que eles estão principalmente preocupados com o aspeto da “forma” dos Mestres (a sua aparência, nome, caráter, etc…). A visão teosófica, quando bem entendida é muito diferente. Blavatsky escreveu “O mahatma verdadeiro não é o seu corpo físico mas o Manas superior [a mente espiritual] que está inseparavelmente ligada ao Atma [o Eu verdadeiro] e o seu veículo [a Alma espiritual] ”. E ela acrescenta que quem quiser “ver” um Mahatma tem de elevar a sua perceção para os planos espirituais, porque “as coisas mais elevadas podem ser percebidas apenas pelo sentido que pertence a essas coisas mais elevadas”. Os planos espirituais, onde as formas e a separação desaparecem e a unidade prevalece, são muito mais elevadas que os planos psíquicos, que são aqueles a que tem acesso os videntes naturais. Aqueles que atingirem o estado de consciência elevado que transcenda todo o sentido de separabilidade “verão o Mahatma onde quer que ele esteja, pois, estando fundidos com o sexto e sétimo princípios, que são ubíquos e omnipresentes, pode-se dizer que os Mahatmas estão em toda a parte” (op.cit, 6:239).

Continua na próxima semana…

sábado, 2 de março de 2013

Mahatmas versus Mestres Ascensos (1ª parte)


Este texto é uma tradução quase na íntegra do artigo “Mahatmas versus Ascended Masters” publicado na edição do Verão/2011 da  revista Quest, que é editada pela Theosophical Society in America (ligada à ST Adyar). O autor é Pablo D. Sender, um ativo teosofista argentino, radicado nos Estados Unidos (as imagens foram colocadas por mim). 

Podem vê-lo aqui numa entrevista a explicar como tomou contacto com a Teosofia.


O artigo de Sender começa assim:

“H.P. Blavatsky foi a primeira pessoa a introduzir o conceito de Mahatma (também chamado de Adepto ou Mestre) no Ocidente. Inicialmente ela falava sobre eles em privado, mas alguns anos depois, dois destes Adeptos, conhecidos pelos pseudónimos de Koot Hoomi (K.H.) e Morya (M.) concordaram em se corresponder com dois teosofistas britânicos – A.P. Sinnett e A.O. Hume. Esta comunicação teve lugar de 1880 a 1885 e durante estes anos o conhecimento sobre os Mahatmas foi progressivamente tornado público. As cartas originais estão presentemente guardadas na British Library em Londres como um valioso artigo histórico e foram publicadas no livro “As Cartas dos Mahatmas”. Este livro continua a ser uma fonte única de informação em primeira mão sobre os Mahatmas e os seus ensinamentos.


Em 1930, cinquenta anos depois desta correspondência ter começado, Guy Ballard, um antigo estudante de Teosofia, foi alegadamente contactado durante uma caminhada no Monte Shasta na Califórnia por um misterioso personagem não-físico. Esta figura identificou-se como um dos Mahatmas teosóficos, o ocultista do séc. XVIII conhecido com o Conde de Saint-Germain. Ele encarregou Ballard da tarefa de transmitir as lições da “Grande Lei da Vida”, nascendo assim aquilo que seria chamado do “movimento I AM”.

Ballard e a sua mulher Edna cedo ganharam um largo séquito com a sua versão dos ensinamentos de Saint Germain, criando a Fundação Saint Germain em 1932. O “movimento I AM” atingiu o seu apogeu no final dos anos 30. A morte de Guy Ballard em 1939, combinada com questões legais, incluindo uma petição lançada pelo Governo Federal alegando fraude postal, levou à diminuição de popularidade. A organização continua a existir hoje, embora mantenha uma postura discreta (Wouter J. Hanegraaf, Dictionary of Gnosis and Western Esotericism, 2:587).

Guy e Edna Ballard

O movimento dos Mestres Ascensos atingiu novo patamar em 1958, quando Mark Prophet, um antigo estudante da Fundação Saint Germain, alegou que lhe havia sido encomendado pelo “Mestre Ascenso El Morya” a transmissão dos ensinamentos da Grande Fraternidade Branca através de uma organização chamada “Summit Lighthouse”.

Depois da morte de Mark Prophet em 1973, a liderança da organização ficou a cargo da mulher, Elizabeth Clare Prophet, que mudou o seu nome para Igreja Universal e Triunfante. Em 1999, Prophet retirou-se das atividades da Igreja, vindo a morrer em 2009 (op.cit., 2:1093-6).

Mark e Elizabeth Prophet


Hoje, como resultado do Movimento I AM e da atividade dos Prophet, a ideia dos Mestres Ascensos é prevalecente no meio New Age. Desde que os Ballard e os Prophet usaram os nomes e os retratos dos Mahatmas teosóficos para os seus Mestres Ascensos, muitas pessoas assumiram que eram os mesmos. Contudo, como vamos ver neste artigo, eles diferem em muitos aspetos importantes.

Ascensos ou vivos?

Os Mestres Ascensos, como o seu nome sugere, é suposto serem Mestres que experienciaram o milagre da ascensão, como se diz que Jesus viveu. O ensinamento original, canalizado por Guy Ballard, foi o de que um Mestre Ascenso não morreria mas que levaria o corpo com ele. Este ensinamento da ascensão está em direta oposição com os ensinamentos teosóficos. O Mahatma K.H. refere-se à ideia depreciativamente, numa das suas cartas para Sinnett: ”Lembre-se de que há somente uma mulher histérica que alega ter estado presente na suposta ascensão, e que o fenómeno nunca foi corroborado pela sua repetição” (Cartas dos Mahatmas para A.P.Sinnett, vol I, p.41). HPB também rejeita a ascensão como um facto, apelidando-a  de “uma alegoria tão velha quanto o mundo” (HPB Collected Writings 8:389; ver também 4:359-60).

Depois de Ballard (que supostamente chegou à fase da ascensão) ter morrido de esclerose arterial cardíaca, mas não ter levado o seu corpo com ele, a sua esposa, Edna, disse que era possível ascender depois do corpo ter morrido. Assim, a ideia de ascensão mudou ao longo dos anos, e hoje os Mestres Ascensos são considerados espíritos desencarnados, que transcenderam os seus corpos físicos. Isto, uma vez mais, é contrário aos ensinamentos teosóficos sobre os Mahatmas. Nos primeiros dias da ST, antes de alguém no Ocidente saber alguma coisa sobre os Mestres, Henry Steel Olcott começou a receber cartas de alguns deles. Numa das primeiras cartas, o Mestre Serapis escreveu:

Henry Steel Olcott


“Chegou a hora de deixá-lo saber quem sou. Não sou um espírito desencarnado, irmão. Sou um homem vivo (…)” [Cartas dos Mestre de Sabedoria, p.179]”. HPB, que viveu com alguns deles perto do Tibete durante vários anos aquando do seu treino em ocultismo, testemunhou que eles eram homens vivos. Mais tarde, Olcott e vários outros teosofistas também conheceram alguns dos Mahatmas nos seus corpos físicos em diferentes momentos e partes do mundo.

Continua na próxima semana…