Continuamos com a tradução (adaptada) do texto “O Conde deSt. Germain” de David Pratt.
6. Viajando na Alemanha
Em 1774 Saint-Germain estava em Ansbach, localidade que hoje
pertence à Bavaria, a sudoeste de Nuremberga. Vivia sob o nome de Conde Tsarogy
e mais tarde foi descrito assim:
“Este homem singular, que no seu tempo causou tanta sensação
imerecida, viveu durante vários anos no Principado de Ansbach, sem ninguém ter
a mínima ideia de que ele era o misterioso aventureiro sobre quem as pessoas
atribuíam histórias tão extraordinárias.”
Saint-Germain é descrito como alguém que vivia muito
retirado e em reclusão, mas que não deixava de fazer atos benevolentes.
“O estrangeiro parecia ter 60 a 70 anos, sendo de média
estatura, mais magro que corpulento, o seu cabelo grisalho escondido por baixo
de uma cabeleira, parecendo um homem vulgar, um italiano idoso. As suas roupas
eram muito simples, a sua aparência não mostrava nada de extraordinário.”
“Ele não tinha criados, comia sozinho e da forma mais
simples possível, no seu próprio quarto, que ele poucas vezes abandonava. As
suas necessidades eram reduzidas ao mínimo. Não tinha círculo social, mas
passava as noites com o Markgraf e a Senhorita Clairon e amigos trazidos pelo
Markgraf. Ele não podia ser persuadido a comer na mesa real.
A sua conversa era sempre interessante e mostrava muito
conhecimento do mundo e das pessoas, mas às vezes surgia uma referência misteriosa e ele interrompia a
conversa ou mudava de assunto quando alguém tentava saber mais dele. Ele gostava
de falar sobre a sua infância e da sua mãe, de quem ele nunca falava sem
emoção. Acreditando nele, a sua educação
deverá ter sido a de um príncipe.
O que este homem singular fazia durante cada dia seria
difícil de dizer. Ele não tinha livros com ele, exceto uma cópia suja de Pastor
Fido. Ele muito raramente deixava alguém entrar no seu quarto, mas quando
alguém o fazia, usualmente encontravam-no com a sua cabeça envolta num pano
preto. A sua ocupação preferida era a preparação de todo o tipo de corantes. A
janela do seu quarto, que dava para o jardim, estava tão salpicado de corantes
que não se conseguia ver através dela. (…)”
[Tsarogy] confessou ao Markgraf que o nome Tsarogy era falso, ou uma espécie de anagrama, e que
ele era na verdade um Rákóczy, o último descendente do príncipe Rákóczy da
Transilvânia, do tempo do Imperador Leopoldo.
Mas, mais tarde chegam relatos contrários sobre as origens
de Tsarogy aos ouvidos de Markgraf, que fica a saber de vários nomes que ele
tinha usado nos seus diversos pontos de paragem. Quando Saint-Germain é
confrontado com isso e com o desagrado do Markgraf com o abuso da sua boa
vontade…
“…ouviu todas as acusações num modo completamente relaxado e
disse que ele havia, numa altura ou noutra, usado todos os nomes referidos (…)
mas, disse que sob todos esses nomes foi conhecido com um homem de honra…Não
tinha receio de nada, pois nada havia para alimentar o seu descrédito. Ele
afirmou com uma certeza inabalável que nada tinha dito de falso ao Markgraf em
relação ao seu nome e revelou-lhe a sua verdadeira família. Ele julgava que
como nada tinha pedido ao Markgraf, não tinha magoado ninguém e não havia
causado problemas, seria simplesmente julgado pela sua conduta.”
No que diz respeito aos conhecimentos médicos de Saint-Germain,
Gemmigen-Guttenberg diz:
“A prescrição dele consistia basicamente numa estrita dieta
e num chá, a que ele chamava de Chá da Rússia ou Acqua Benedetta (…) Seria uma
ingratidão chamá-lo de trapaceiro. Enquanto ele ficou com o Markgraf, nunca
pediu nada, não recebeu nada de valor nem nunca se envolveu em algo impróprio.
Devido ao estilo de vida muito simples, as suas necessidades eram quase
nenhumas. Se ele tivesse dinheiro, ele partilhava-o com os pobres. Não deixou
quaisquer dívidas.”
Em 1776, Saint-Germain chega a Leipzig usando outro nome e
essas notícias chegam aos ouvidos de Frederico, o Grande que tenta descobrir os
propósitos do Conde. Von Bosch, também
ele conde, banqueiro, maçon e com um alto cargo de Estado informará Frederico
que Saint-Germain não era um Adepto, apenas um teosofista (na linha de Boehme).
Von Bosch deixa de falar com Saint-Germain quando este lhe pede dinheiro
emprestado. Jean Overton Fuller interroga-se se o facto de Saint-Germain ter
revelado a sua identidade, teria a ver com a queda dos Orlovs na Rússia, pois
assim a Prússia poderia ajudá-lo a libertar a Transilvânia, mudando a balança
do poder na Europa, no sentido de se generalizar a liberdade de pensamento.
Outro conhecido de Frederico dir-lhe-á que Saint-Germain “não é um um maçon, um
mago, nem sequer um teosofista.”
Frederico Augusto de Brunswick (foto wikipedia) |
Em 1777, o Conde Lehndorff, camareiro da Rainha da Prússia,
escreveu no seu diário que havia passado três dias com Saint-Germain, o “homem
mais notável na Europa”:
“Ele segue uma dieta rigorosa, observa grande frugalidade,
bebe apenas água nunca vinho e apenas toma uma refeição por dia…Ele prega a
virtude, a abstinência e as boas ações e constitui um exemplo a este respeito. Ninguém
pode censurá-lo pelo mínimo de impropriedade em qualquer assunto. Ele não parece
ser tão rico quanto era antes…
A sua expressão dá uma impressão de extraordinária
espiritualidade. O seu discurso é espirituoso e prende a atenção, mas ele não
gosta de contraditório.
As pessoas inventam mitos sobre ele e sobre aquilo que ele
não diz. Alguns pensam que ele é um judeu português, outros de que tem duzentos
anos de idade e que é um príncipe destronado. Alguns acusam-no de fazerem as
pessoas acreditar que ele deve ser o terceiro filho do príncipe Rákóczy.
Ele fala como um grande médico. Acima de tudo, ele é um
doutor e fala do seu pó precioso, que deve ser bebido como chá. Deixei que ele
me enchesse uma xícara. Tinha gosto de anis, e os efeitos foram idênticos aos
do anis. Ele discursa constantemente sobre o equilíbrio entre o corpo e a alma.
Quando isso é observado, diz ele, a nossa máquina [NT:life-machine no original]
não se avaria.”
Outro maçon comentou também em 1777:
“Sabendo que ele havia rejeitado certas pessoas que o
consideravam um fazedor de milagres, eu procedi de modo inverso tratando-o como
um homem comum, cujo conhecimento de química e física despertou a minha
curiosidade.
Ele pareceu-me um homem entre 60 e 70, jovem para a sua
idade, rindo com desdém daqueles que lhe creditam uma idade extraordinária.
Espera contudo viver por muito tempo, graças ao seu regime alimentar e
remédios. Contudo, a sua aparência não parecia prometer uma vida muito mais
longa. (…)
Tendo ganho a sua confiança, levei-o a falar de Maçonaria.
Sem evidenciar muito zelo ou mesmo particular atenção, ele confessou ser do 4º
grau, embora não fosse capaz de se lembrar dos sinais. Ele parecia não saber
nada do sistema de Estrita Observância, e por isso, não consegui ir mais além
na conversa.
Por tudo isto, posso concluir que ou ele dissimula ou então
não é dos nossos. Inclino-me mais para esta hipótese, principalmente porque no
que diz respeito a religião e filosofia ele é um puro materialista”.
Outros maçons também catalogaram St. Germain de “puro
materialista”, mas inclusive alguns dos seus poemas mostravam que reconhecia um
lado espiritual no cosmos.
O embaixador prussiano na Saxónia em 1777 escreveu o
seguinte sobre Saint-Germain:
“Ele diz que é o príncipe Ragotzi e para fornecer-me provas de
particular confiança acrescenta que tinha dois irmãos, que se rebaixaram para
se submeterem ao seu destino infeliz e que a certa altura ele tomou o nome
Conde de Saint-Germain, que significa o sagrado entre os irmãos [sanctus
germanus=irmão sagrado].
(…)
Voltando à questão francesa, existe uma lenda bem conhecida
de que Saint-Germain visitou Maria Antonieta quando esta era rainha para lhe
avisar da Revolução e da carnificina que aconteceria. Contudo o livro que conta
esta história não é da pessoa a quem foi atribuído (uma confidente de Maria
Antonieta).
Maria Antonieta (foto wikipedia) |
Continua na próxima semana…
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