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sábado, 19 de novembro de 2016

Kali-Yuga: uma idade de crescimento ou de decadência espiritual? (3.ª parte)


Esta semana publicamos a terceira parte do artigo de Barend Voorham "Kali-Yuga: uma idade de crescimento ou de decadência espiritual?".

Voorham é um membro da Sociedade Teosófica de Point Loma - Blavatskyhouse. Esta organização, além de publicar a revista Lucifer em holandês e inglês (de onde é originário este artigo), também promove um conjunto de palestras, também em língua inglesa, sobre variados temas que estão disponíveis online aqui.




Antes de prosseguir, recomenda-se a leitura das duas partes anteriores.


Satya-Yuga

Podemos observar vários aspetos na tabela acima. Primeiro, que para o homem as durações das idades são quase infinitamente longas. Estamos habituados a pensar em anos ou séculos no máximo. 

Uma idade com uma duração de mais de quatro milhões de anos está para além do nosso referencial.

Em segundo lugar, podemos observar que as idades mais virtuosas, nas quais o Dharma está mais implantado na sociedade, duram mais que as idades menos virtuosas. O Kali-Yuga dura não mais que um décimo da era completa e é quatro vezes mais curto que a Idade de Ouro, o Satya-Yuga.

Os antigos Gregos e Romanos referiam-se a esta idade como o século de Saturno. Esse era o século da inocência. É o período de tempo no qual o homem não tem nenhuma ou quase nenhuma responsabilidade e não é portanto sobrecarregado com preocupações. É a fase infantil. As crianças também vivem num mundo paradisíaco. Ainda não têm grandes responsabilidades. A criança pouco desenvolveu os aspetos da sua consciência.

Portanto, ainda não tem ainda todas as faculdades e é muito menos responsável do que um adulto com as capacidades normais.

No Mahâbhârata é dito que nesta idade não existem ricos nem pobres. Não havia necessidade de trabalhar, porque tudo aquilo que era preciso obtinha-se pela força de vontade. Não havia doenças, não se perdia capacidades com o envelhecer. Não havia ódio nem vaidade.

O Satya-Yuga era uma idade de abundância na qual a vida decorria calmamente. Não existiam grandes problemas, era um ambiente calmo, mas bastante estático. Provavelmente é atrativo para as pessoas das sociedades contemporâneas, pois temos um forte desejo pela serenidade. Contudo, a questão aqui é se realmente desejaríamos viver uma vida sem desafios. Alguém suspira pelo tempo em que era bebé?

A vida no Satya-Yuga era calma e pacífica. A duração da vida estava em linha com isto, dado que os textos antigos referem que esta duração de vida também está relacionada com os mesmos números: 4: 3:2: 1. No Satya-Yuga as pessoas viviam durante 400 anos, no Tretâ-Yuga por 300 anos, no Dwâpara-Yuga por 200 anos e finalmente no Kali-Yuga por 100 anos. Para nós, estes números parecem improváveis, embora em antigos mitos, como por exemplo, no Antigo Testamento, as pessoas supostamente tinham ainda mais idade. Não é referido que Matusalém viveu 969 anos?

É claro que isto são médias, contudo, no que se refere a indivíduos, a duração de vida no Kali-Yuga é quatro vezes mais pequena que o Satya-Yuga.


Kali-Yuga: a Idade Negra

O descanso bem-aventurado do Satya-Yuga é gradualmente substituído por mais inquietação. Não vamos discutir aqui as outras duas fases. Elas têm uma posição intermédia entre a paz da Idade de Ouro e a inquietude da Idade do Ferro. Podemos vê-las como uma versão proporcionalmente mais calma do Kali-Yuga. Esta última tem uma má reputação. A guerra e a violência e todos os sofrimentos com ela relacionados, são muitas vezes atribuídos a esta Idade Negra.


Nandi, o boi do Dharma


Nandi, o boi do Dharma, é usado como uma metáfora para a decadência ética nas quatro idades. Por exemplo, no “Mahâbhârata” é referido: “…no Satya-Yuga, a ética é como um boi entre os homens que se apoia nas quatro patas. No Treta-Yuga, o pecado levou uma dessas patas, a ética ficou apenas com três patas. No Dwâpara-Yuga existe tanto pecado como ética, e portanto diz-se que a ética só tem duas patas. Na idade negra de Kali (…) a ética existe entre as pessoas com três partes de pecado. 

Portanto, diz-se que a ética aguarda entre as pessoas, com apenas com a quarta parte que lhe resta.
Saiba, Ó Yudhishthira,o período de vida, a energia, o intelecto e o poder físico do homem diminuem em cada Yuga.” (1)
  
De acordo com o Surya Siddhanta – um livro astrológico com uma idade incomensurável – o Kali Yuga começou à meia-noite do dia 23 de janeiro de 3102 A.C.. Portanto, o Kali Yuga começou há 5116 anos [NT: o artigo foi escrito em 2014]. No início do período havia uma peculiar disposição planetária; quase todos os planetas estavam alinhados. Começou com a morte de Krishna, que é a descrita no grande épico “Mahâbhârata. O fulcro deste épico notável é uma guerra entre dois lados de uma família. Parece que este conflito dá uma indicação clara das caraterísticas do Kali-Yuga: guerra, infidelidade e violência, em suma, tudo aquilo que podemos ler também nos jornais dos dias de hoje. Em muitas obras em Sânscrito, o Kali Yuga é descrito como uma época na qual o Dharma definha. É um tempo de ignorância. As pessoas não mantêm as suas promessas e acordos. Não entendem que a ganância é algo errado, e alguns não se apercebem de que a hostilidade ou mesmo o homicídio não são toleráveis. 

Nos livros Hindus, como o “Vishnu Purâna”, esta idade negra é descrita da seguinte maneira: os bárbaros serão os donos na fronteira do rio Indo. Os reis estarão viciados no poder e estarão em guerra uns com os outros continuamente. O mais forte será aquele que governará. Haverá violência, malícia e perversidade. O bem-estar diminuirá. A riqueza será a única forma de devoção. A palavra dos ricos prevalecerá. Os pobres não têm escolha. O único compromisso entre sexos vem da paixão. A erudição é ridicularizada. Não haverá compaixão. Haverá todo o tipo de vício, que advém do facto das pessoas verem o seu trabalho como esgotante e insatisfatório. A divisão natural entre as quatro castas cairá. Os instrutores sábios (Brahmans) não serão reconhecidos. Os guerreiros (Kshatriyas) não mais serão corajosos. Os comerciantes (Vaiśyas) já não serão honestos e os servos (Śudras) já não serão humildes. (2)


Notas:

(1)  Mahâbhârata, Livro 3: VanaParva:Markandeya-Samasya Parva: Secção CLXXXIX, http://www.sacred-texts.com/hin/m03/m03189.htm

(2) Ver: H.P. Blavatsky, The Secret Doctrine. 2 Volumes, Theosophical University Press, Pasadena 1988, Volume 1, pag. 424-425 (pag. 377-378 orig. edição original em Inglês; pág. 84-85 do vol.II da edição em língua Portuguesa).

Continua na próxima semana.

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