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sábado, 5 de julho de 2014

Três tipos de Karma (1ª parte)

O texto desta semana foi retirado do número de abril de 2014 da publicação da Loja Unida de Teosofistas (LUT) “The Theosophical Movement”. Este boletim mensal editado pela LUT da Índia, também disponibilizado na internet, é uma das publicações regulares de maior qualidade existentes no meio teosófico, recomendando-se vivamente a sua leitura. Foi B.P. Wadia - o líder mais carismático da LUT a par do fundador Robert Crosbie – quem iniciou a publicação de “The Theosophical Movement” em 1930.


B.P. Wadia (1881-1958)

Avancemos agora para a tradução do excelente artigo “Três tipos de karma”. As ilustrações que intercalam o texto foram colocadas por mim, não fazendo parte do texto original.


Três tipos de karma

Karma é a lei de ação e reação; de causa e efeito. A lei do Karma ajusta cada efeito à sua causa e restabelece o equilíbrio perturbado. O Karma pode ser de três tipos: Sanchita, Agami e Prarabdha. Há uma bela analogia na literatura Vedanta. O arqueiro já disparou uma flecha que saiu das suas mãos. Não pode recuperá-la. Está prestes a disparar outra flecha. O conjunto de flechas da aljava nas suas costas é sanchita; a flecha que ele disparou é prarabdha e a flecha que está prestes a disparar do seu arco é agami. Destas, ele tem controlo sobre sanchita e sobre agami, mas tem seguramente de resolver o seu prarabdha. Tem que experienciar a pressão do passado que começou a se manifestar.

Sanchita karma é aquele que está acumulado e que não está a operar no momento, porque não existe o ambiente ou as condições apropriadas para trazê-lo à ação. É como o vapor em suspensão na atmosfera, que irá cair na terra como chuva, quando as condições forem as propícias. Quando plantamos diferentes variedades de sementes, elas crescem e dão fruto em diferentes alturas. O morangueiro ou a macieira darão fruto apenas na estação certa. Por sua vez, o mangueiro apenas dará fruto depois de muitos anos. Da mesma forma, o stock completo de karma não pode dar fruto todo de uma vez. Patanjali descreve o “karma acumulado” como resíduos mentais. Sentimos o efeito dos resíduos mentais criados pelos nossos pensamentos, ações e sentimentos de vidas passadas ou presentes, quando obtivermos o tipo correto de enquadramento mental ou corporal e o ambiente adequado para trazê-lo à ação. Algumas causas kármicas são mantidas em suspenso por pouco tempo, vindo a ser concretizadas rapidamente. Desta forma, por exemplo, comer demasiado ou ingerir comida estragada pode causar dores de estômago em poucas horas. Alguém que seja um fumador inveterado ou masque tabaco pode contrair cancro oral ou do pulmão numa idade mais avançada. Contudo, alguns atos não produzem frutos nesta vida, e aparentemente a pessoa passou incólume, mas na verdade não é esse o caso. Tais atos de uma vida são como as flechas disparadas do arco, agindo sobre nós na vida seguinte, produzindo as nossas recompensas e punições. É-nos dito que até que o instrumento apropriado seja encontrado, o karma relacionado permanece inesgotado. Por exemplo, enquanto alguém está no corpo de um homem, não pode ter a experiência da maternidade; quando alguém usufrui de um intelecto brilhante como resultado de bom karma mental de uma vida passada, não é possível experienciar a imbecilidade. Da mesma forma, uma pessoa desfrutando de riqueza como resultado de bom karma passado não pode, ao mesmo tempo, experienciar pobreza .




O Sr. Judge descreve Sanchit Karma como aquilo que ainda não começou a produzir qualquer efeito nas nossas vidas devido à ação de outras causas kármicas. Somos capazes de entender isto com base na lei da Física que diz que duas forças opostas tendem à neutralidade, e que uma força pode ser suficientemente poderosa para evitar temporariamente a ação de outra. Assim, o karma pode ser adiado desde vidas passadas e na vida atual, até o karma obstrutivo ser removido.

Da mesma forma que não vamos para as compras levando connosco todo o nosso extrato bancário, também o nosso Ego nasce apenas com uma porção de resíduos mentais ou causas kármicas, que ele tem de esgotar agora. Podemos chegar a uma altura na vida onde todas as causas anteriores se esgotam, e então novo karma ou karma não esgotado começa a operar. Assim, encontramos em certos casos, súbitos reveses da sorte, onde há mudanças para melhor ou para pior, seja nas circunstâncias ou no caráter. Às vezes o karma do Ego é suficientemente poderoso para fazê-lo nascer numa família pobre, mas nessa altura, novo karma começa a operar e a criança é adotada por pais abastados, e portanto colocada num ambiente diferente. O Sr. Judge ilustra isso com um sonho estranho de um Rajá, interpretado por um adivinho como tendo o Rajá de dar uma grande quantia de dinheiro à primeira pessoa que ele visse depois de acordar no dia seguinte, pretendendo o adivinho estar no local bem cedo. No dia seguinte, o rei levantou-se invulgarmente cedo, e quando se aproximou da janela viu um candala [hindu sem casta] varrendo a sujidade. Deu-lhe a sua fortuna, erguendo-o, num segundo, da pobreza abjeta à abundância.

Um aforismo sobre o karma diz que “enquanto um homem experiencia o karma no instrumento que lhe foi fornecido, o seu outro karma, ainda não manifestado não é esgotado por outros seres ou meios, mas é mantido em reserva para operar futuramente. Durante este lapso de tempo não é sentida qualquer operação daquele karma, o que não causa deterioração na sua força ou alteração na sua natureza.” Desta forma, a força do karma acumulado não se tornará mais forte nem será diluído devido ao lapso de tempo. A adequação do instrumento é determinada pela relação exata do karma com o corpo, mente e natureza intelectual e física adquiridos para utilização pelo Ego nessa vida particular.




Contudo, podem ocorrer mudanças no instrumento de modo a que o mesmo se torne adequado para a precipitação de karma acumulado ou de uma nova classe de karma. Tal mudança na constituição física, mental ou psíquica de uma pessoa pode ocorrer quer devido à intensidade de pensamento e do poder de um voto, ou devido à alteração natural resultante da completa exaustão de velhas causas, diz um aforismo sobre o karma. Então, quando uma pessoa decide tornar-se um engenheiro, ou um médico, ou um dançarino e avança nessa direção, todas as faculdades relacionadas com esse campo começam a ser treinadas e desenvolvidas. Portanto, as naturezas física, mental e psíquica são desenvolvidas de forma a fornecer o instrumento adequado com vista ao exercício dessa arte ou tema. Quando decidimos – através de um juramento ou de um voto – viver a vida espiritual, todos os aspetos da nossa natureza, sejam nobres ou de outra índole, começam a se desenvolver. Além disso, neste caso há uma precipitação mais rápida do karma. Aquele que se predispõe a trepar ao mundo do Espírito tem de enfrentar não apenas o seu Prarabdha Karma – aquela porção de karma com a qual nascemos, ou seja, o karma para cuja precipitação o terreno está preparado –  mas, devido à sua nova decisão de romper as limitações do Karma, ele rasga um canal através do qual algum do karma acumulado conhecido como Sanchita Karma começa a fluir tornando-se Prarabdha.

Continua na próxima semana.

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