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sábado, 8 de fevereiro de 2014

Sobre a continuidade da nossa consciência (3ª parte)

Continuamos com a tradução de alguns excertos do artigo do Dr. Pim van Lommel “Sobre a continuidade da nossa consciência”. Para perceber o contexto convém ler as duas partes anteriores, aqui e aqui.

Prossigamos pois com a descrição de alguns elementos típicos das Experiências de Quase-Morte (EQM).




A Experiência fora-do-corpo

Nesta experiência, as pessoas têm perceções verídicas a partir de uma posição fora e acima do seu corpo sem vida. Há a sensação de que se despiram do seu corpo como quem tira um velho casaco e para sua surpresa parece que retiveram a sua própria identidade com a possibilidade de perceção, emoções e perfeita consciência. Esta experiência fora-do-corpo é cientificamente importante porque médicos, enfermeiras e familiares podem verificar as perceções relatadas. Este é o relatório de uma enfermeira de uma unidade de cuidados coronários:

“Durante o turno da noite uma ambulância chega com um homem de 44 anos, cianótico [pele azul-arroxeada] e em estado comatoso à unidade de cuidados coronários. Ele tinha sido encontrado em coma cerca de 30 minutos antes num prado. Quando fomos intubar o paciente reparámos que ele tinha uma dentadura na boca. Eu removi a sua dentadura superior e coloquei-a no carrinho de enfermagem. Depois de cerca de uma hora e meia, o paciente apresentava suficiente ritmo cardíaco e pressão sanguínea, mas ainda estava ventilado e intubado e em estado comatoso. Ele é transferido para a unidade de cuidados intensivos para continuar a necessária respiração artificial.  Passada mais de uma semana encontro-me novamente com o paciente, que passou para a ala de cardiologia. Quando me vê diz-me: “Oh, aquela enfermeira sabe onde está a minha dentadura”. Fico muito surpreendida. Então ele explica: ”Você estava lá, quando eu fui transportado para o hospital e você retirou a dentadura da minha boca e pô-la em cima do carrinho, onde estavam muitos frascos e havia esta gaveta deslizante por baixo e foi aí que você pôs os meus dentes.” Eu fiquei especialmente atónita porque lembrei-me de isto ter acontecido enquanto o homem estava num coma profundo e no processo de reanimação cardiopulmonar. Parece que o homem tinha-se visto a si próprio na cama e apercebido de cima, do modo como as enfermeiras e os médicos tinham estado ocupados na reanimação. Ele também foi capaz de descrever correta e detalhadamente o pequeno quarto onde havia sido reanimado bem como daqueles que estavam presentes, como eu. Ele está profundamente impressionado com a sua experiência e diz que não tem mais medo da morte.”


Foto:dailymail.co.uk


A revisão de vida holográfica

Durante esta revisão de vida o sujeito sente não só a presença e a experiência renovada de cada ato, mas também de cada pensamento da sua vida passada e percebe que tudo isso é um campo de energia que o influencia assim como aos outros. Tudo aquilo que foi feito e pensado parece ter sido significativo e armazenado. Fica-se a saber se foi dado amor ou pelo contrário, negado. Porque estamos ligados às memórias, emoções e consciência dos outros, experienciamos as consequências dos nossos próprios pensamentos, palavras e ações nessas pessoas no exato momento do passado em que elas ocorreram. 

Portanto, durante a revisão de vida existe uma ligação com os campos de consciência de outras pessoas, bem como os nossos próprios campos de consciência (interligação). Os pacientes examinam toda a sua vida num abrir e fechar de olhos; tempo e espaço parecem não existir durante uma experiência destas.

Instantaneamente eles estão onde se encontram focados (não-localidade) e podem falar durante horas sobre o conteúdo da revisão de vida embora a reanimação tenha demorado apenas minutos. Um relato:

“Toda a minha vida até ao presente parece-me ter sido posta à frente numa espécie de revisão panorâmica tridimensional e cada acontecimento pareceu ser acompanhado por uma consciência de bem ou de mal ou por um conhecimento de causa e efeito. Não só compreendia tudo do meu próprio ponto de vista, mas também entendia os pensamentos de todos os envolvidos no acontecimento, como se os seus pensamentos estivessem dentro de mim. Isto significa não só aquilo que tinha feito ou pensado, mas mesmo de que modo isso tinha influenciado outros, como se visse as coisas com olhos de quem tudo vê. Parece que os nossos pensamentos não desaparecem simplesmente. Durante todo o tempo da revisão, a importância do amor era enfatizada. Olhando retrospetivamente não consigo dizer quanto tempo durou esta revisão e perceção de vida; poderá ter sido longa pois todos os assuntos foram abordados, mas ao mesmo tempo pareceu apenas uma fração de segundo, porque percecionei tudo no mesmo momento. O tempo e a distância pareciam não existir. Eu estava em todo o lado ao mesmo tempo e às vezes a minha atenção era atraída para alguma coisa e então eu ia para lá”.



Também uma antevisão pode ser experienciada, em que imagens de acontecimentos pessoais futuros (mais tarde recordados sob a forma de “déjà vu”) bem como de imagens gerais do futuro aparecem, embora deva ser relevado que estas imagens devem ser consideradas apenas como possibilidades. Uma vez mais parece que tempo e espaço não existem durante esta revisão: Um relato:

“Eu tive um agradável contacto visual, olharam-me cheios de amor e então examinei grande parte da minha vida vindoura; a preocupação com os meus filhos, a doença terminal da minha esposa, as circunstâncias em que estaria envolvido no meu trabalho e não só. Eu examinei de forma completa, e senti que teria de decidir naquele momento: “Poderei ficar aqui ou ir embora”, mas teria que decidir naquele momento.”

O encontro com parentes falecidos

Se conhecidos ou parentes já falecidos são encontrados numa outra dimensão, são habitualmente reconhecidos pela sua aparência, sendo a comunicação possível através de transferência de pensamento. Portanto, durante um EQM é também possível entrar em contacto com o campo de consciência de pessoas falecidas (interligação).  Durante uma EQM, encontram-se algumas pessoas sobre cuja morte era impossível saber e às vezes pessoas desconhecidas para elas, são encontradas durante uma EQM. Um relato:


Foi este livro que espoletou todo o
frenesim à volta das EQM. Esta
é a capa da versão portuguesa.
O livro foi originalmente publicado
nos EUA, em 1975.
“Durante a minha paragem cardíaca eu tive uma ampla experiência (…) e mais tarde vi, além da minha falecida avó, um homem que olhou para mim de forma amável, mas que eu desconhecia. Mais de 10 anos depois, no leito de morte da minha mãe, ela confessou-me que eu tinha nascido de uma relação extramarital, sendo o meu pai um judeu que tinha sido deportado e morto durante a II Guerra Mundial, e a minha mãe mostrou-me a fotografia dele. O homem desconhecido que eu tinha visto mais de dez anos antes durante a minha EQM, afinal era o meu pai biológico.”

O regresso ao corpo

Alguns pacientes podem descrever a forma como eles regressaram ao seu corpo, a maior parte das vezes através do topo da cabeça, depois de terem percebido através de uma comunicação sem palavras com um ser de luz ou com um parente falecido que “não era ainda a sua vez” ou que “tinham uma tarefa para cumprir”. O regresso consciente ao corpo é experienciado como algo muito opressivo. Eles recuperam a consciência no seu corpo e percebem que estão “presos” nele, o que significa novamente a dor e a restrição da sua doença. Também entendem que lhes foi retirada novamente uma parte da sua consciência com profundo conhecimento e compreensão, bem como o sentimento de amor e aceitação incondicionais. Um relato:

“E quando recuperei a consciência no meu corpo, foi tão mau, tão mau…aquela experiência foi tão bela, nunca teria querido regressar, queria lá ficar…e mesmo assim voltei. A partir desse momento foi uma experiência muito difícil viver a minha vida outra vez no meu corpo, com todas as limitações que sentia nesse período.”

O desaparecimento do medo da morte

Quase todas as pessoas que experienciaram uma EQM perdem o medo de morrer. Isto é devido a compreenderem que existe a continuidade da consciência, mesmo quando foram declarados mortos por observadores ou mesmo por médicos. Ficamos separados do corpo sem vida, retendo a capacidade de perceção. Um relato:


Foto: dailymail.co.uk


“Está para lá do meu domínio discutir algo que só pode ser provado pela morte. Para mim, contudo, a experiência foi decisiva em convencer-me de que a consciência vive para além da sepultura. A morte não é morte, mas outra forma de vida.”

Outro relato:

“Esta experiência é uma bênção para mim, pois agora tenho a certeza que o corpo e a mente estão separados, e que existe vida após a morte.”


Na próxima e última parte, teremos as conclusões de Pim van Lommel, abordaremos um texto publicado na revista portuguesa “Sábado” e veremos onde podemos encontrar na literatura teosófica material sobre o que acontece após a morte.

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