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sábado, 16 de novembro de 2013

Os conflitos de opinião entre teosofistas: um editorial de Jan Kind

No início de setembro, o conhecido teosofista holandês Jan Kind publicou na Theosophy Forward, um editorial, em parte inspirado na sua comunicação na Conferência Internacional de Teosofia que teve lugar em Nova Iorque em Agosto passado.

O texto de Kind encerra por agora o tema da discussão de pontos de vista sobre Teosofia (e sobre teosofistas) que foi trazido diversas vezes ao Lua em Escorpião durante este ano de 2013.


Jan Kind, na Conferência Internacional de
Teosofia (agosto de 2013)


Revelação ou Realização: O conflito na Teosofia”, o famoso artigo de J.J. van der Leeuw foi uma boa introdução ao assunto, que continuou com outro editorial de Jan Kind, “É a minha Blavatsky melhor do que tua?”. Já depois do verão, “O confronto de pontos de vista” (uma compilação de um conjunto de discussões em grupos do Facebook, tendo como protagonista principal, o teosofista filipino Vicente Hao Chin, Jr.) e o texto de W.Q. Judge “Dogmatismo na Teosofia” alargaram, espero eu, o campo de visão sobre este tema.

Não obstante concordar em grande medida com o que Kind escreve, tenho de repetir o que já escrevi anteriormente e que foi magistralmente expresso no artigo “Esoterismo de A a Z” da última edição da revista Biosofia:

“… O que está em causa são enganos, não são pessoas. Seria leviano ou pretensioso alguém dizer que, nas mesmas circunstâncias, não teria cometido esses ou outros erros; e não se pode esperar ou exigir perfeição ou infalibilidade de um estudante ou investigador de esoterismo (ou do que seja). Entretanto, persistir no erro ou recusar-se a admiti-lo ou corrigi-lo é que não tem sentido. Assim, preconizamos uma revisão e reavaliação criteriosa de tudo o que se sustentou depois de 1891. Não foi tudo mau; não houve só erros. E houve decerto boas intenções. Necessitamos, porém, de rejeitar o joio e eleger o trigo".

Avancemos agora para a tradução do texto de Jan Kind.

"Há muitas luas atrás - deve ter sido no verão de 1968 quando ainda vivia em Amsterdão – que pela primeira vez na vida me disseram que existia algo chamado Teosofia. O homem que teve a bondade de me abrir essa porta era um famoso músico judeu de idade avançada, que havia sobrevivido milagrosamente aos horrores da II Guerra Mundial. Eu fiquei fascinado por ouvir falar sobre as leis de causa e efeito, karma, reencarnação, os mundos visíveis e invisíveis, tolerância e compaixão, liberdade de pensamento e sobre como a música cria energia que influencia as mentes das pessoas e o seu ambiente.

Eu lembro-me vivamente daqueles passeios pelo parque da capital da Holanda. Quando nos sentávamos num banco, ele sempre começava por me contar a sua longa e interessante vida como violinista e maestro, os artistas e os compositores que tinha conhecido, os seus anos em Paris, os amores da sua vida e a…Teosofia.





Na altura - os vibrantes e coloridos anos sessenta - a minha cabeça estava preenchida com Jim Morrison, Jimi Hendrix e os Iron Butterfly. Eu tinha a certeza que ia mudar o mundo. Bob Dylan era o meu herói, a guerra no Vietname era horrível, Woodstock estava ainda a ser preparado e à noite eu sentava-me com alguns estudantes meus amigos tentando entender o que Jean Paul Sartre queria dizer quando escreveu que os humanos estão condenados a serem livres. A somar a tudo isto, esse senhor de idade falava comigo sobre Teosofia.

Não tinha a perceção da existência de algo como a Sociedade Teosófica, mas estava intrigado pelas suas muitas histórias. Um dia perguntei-lhe se alguma vez se tinha juntado a um grupo ou círculo de pessoas interessadas na Teosofia. A sua resposta foi significativa; ele nunca tinha considerado se juntar a nenhuma Sociedade porque na perspetiva dele, a Teosofia era maravilhosa, tinha sido um farol durante toda a sua vida e ajudou-o a viver entre os anos de guerra, mas havia que ter cuidado com os teosofistas. Quando questionei porque era preciso ter cautela com eles, ele disse que apesar da fraternidade ser o seu primeiro objetivo, existia tanta desarmonia entre eles, que como violinista clássico, ele não poderia participar naquilo que chamava de “cacofonia de Karlheinz Stockhausen” (Stockhausen era um moderno e controverso compositor germânico conhecido por usar uma técnica de doze tons que muitas vezes feria os ouvidos).

Tardei mais de vinte e seis anos a me juntar a uma Sociedade Teosófica. As palavras do meu velho amigo judeu tinham aparentemente sido implantadas na minha memória e o meu fascínio pela Teosofia ainda existia. Desde 17 de novembro de 1994 em diante, como um membro da ST Adyar (mais tarde juntei-me a todas as Sociedades existentes), testemunhei tudo o que de bom e de mau os membros ativos nas Sociedades causam.

É evidente que algumas pessoas vivem muito no passado ou buscam a sua inspiração apenas nos muitos conflitos que tiveram lugar no passado. Num artigo anterior, referi-me a isso como “sequestrar” um conflito, tornando-o seu. Embora boas pessoas estejam energicamente tentando cumprir aquilo que a fraternidade implica, parece que existe um pequeno grupo isolado que acusa continuamente outros teosofistas que não são simpáticos à sua causa, de serem um bando de parvos ingénuos. O seu “bla-bla” contraditório e pseudointelectual é extremamente aborrecido, porque se referem muitas vezes a acontecimentos históricos, mas irremediavelmente interpretando-os erroneamente, e as pessoas que condenam são sempre as mesmas. 

Apresentando-se a si mesmos como gurus carentes de seguidores, as suas observações são prepotentes, repetitivas, nada inspiradoras nem construtivas, de modo nenhum relacionadas com o que a Teosofia é suposto representar.


bla bla


Alguns amigos por vezes enviam-me ligações a tópicos na internet contendo tais querelas, mas já não consigo continuar a ler mais aquelas tristes epístolas. Não subestimo a importância de discussões no ciberespaço, mas é evidente que alguns extremistas com os seus previsíveis ajudantes “unilateralistas” que lá colocam mensagens, apenas juraram nunca desistir da sua cruzada contra quem consideram ser pateta e desencaminhado. Pois bem, que seja, a Lei sempre funciona, portanto veremos.

Eu não consigo perceber porque alguns Teosofistas (serão?) estão constantemente centrados nos egos pessoais de teosofistas proeminentes do passado, especialmente quando esta mesma gente reclama estar a tentar suprimir o ego pessoal. Não podemos saber toda a verdade sobre Besant, Judge, Olcott ou inclusivamente a própria H.P.B. As acusações contra algum ou todos eles resumem-se a mexericos, um dos “pecados” que H.P.B. mais condenou. Se quisermos seguir H.P.B., então vamos parar de fazer mexericos sobre o passado e viver HOJE a Teosofia como irmãs e irmãos, independentemente do que cada um de nós acredite.

Eu posso desapontar os meus respeitados leitores, por isso peço desculpa antecipadamente, mas eu nunca conheci pessoalmente Annie Besant, William Judge, Henry Olcott ou Katherine Tingley, nem mesmo Helena Blavatsky. Quem me dera! O que sei sobre eles, aprendi do que li em livros e no que historiadores transmitiram. Portanto, quando leio sobre a história do movimento teosófico moderno, leio a história de mulheres e homens que nos seus modos particulares tentaram arduamente elevar o nosso problemático mundo. Nesse processo, durante o percurso, algumas coisas correram bem, mas ao mesmo tempo cometeram-se erros dolorosos; houve luz, mas também escuridão, houve bom e mau. Não parece tudo isto familiar?

Eu respeito aqueles velhos pioneiros que dedicaram as suas vidas à causa, mas cabe-nos a nós agora criar um futuro, e não podemos criar um amanhã olhando constantemente para trás, apontando dedos, acusando os outros, difamando boas pessoas e proclamando a nossa própria verdade limitada.

 Podemos aprender com o passado, mas nunca devemos julgar; ao invés podemos tentar fazer as coisas melhor, e se falharmos, tentamos novamente.




Vamos em primeiro lugar e antes de mais permanecer como exploradores : a Teosofia não consiste em dizer aos outros teosofistas que estão errados. A Teosofia é sobre servir a humanidade, agora e amanhã, no futuro, portanto foquemo-nos nisso. Acabemos com a cacofonia, tornando-a numa sinfonia, o mundo está desesperadamente à espera.

D’ A Voz do Silêncio: “A “Doutrina do Olho” é para a multidão; a “Doutrina do Coração”, para os eleitos. Os primeiros repetem orgulhosos: “Vejam, eu sei”; os últimos, os que humildemente têm colhido, em voz baixa confessam: “assim ouvi”. "

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