O verão de 2013 foi animado nalguns grupos de discussão de teosofia no Facebook. O procedimento de um grupo de teosofistas de colocar mensagens em catadupa promovendo textos fortemente críticos, não raras vezes em tom acusatório, trouxe resistências que se foram intensificando até se ter chegado ao ponto de existirem expulsões por não cumprimento com as regras de discussão de um dos grupos. Contudo, muitas das discussões foram enriquecedoras, e naturalmente, ficámos a conhecer ambos os pontos de vista. Porém, para haver uma verdadeira discussão é necessário que ambos os lados estejam dispostos a dialogar, o que nem sempre aconteceu. Às vezes, quando a conversa segue caminhos inconvenientes, alega-se falta de tempo, foge-se à questão e continua-se no tom aborrecido de proclamações inconsequentes.
O enriquecimento das discussões a
que aludi acima, deve-se em grande medida a Vicente Hao Chin, Jr. que foi
presidente da Sociedade Teosófica (ST) das
Filipinas, fundador e presidente do Golden Link College,
autor de vários livros como a Enciclopédia Teosófica (agora disponível online) e a
edição cronológica das Cartas dos Mahatmas (exatamente aquela a partir da qual
foi feita a tradução para português).
Vicente Hao Chin, Jr. |
Na sequência da observação de um
amigo teosofista que me disse nunca ter aprendido tanto em tão pouco tempo, achei
que, traduzir algumas das partes desta discussão, com particular enfoque nas
contribuições do pacientíssimo Hao Chin, seria útil para o movimento teosófico
de língua portuguesa, principalmente para aqueles que encontram na língua
inglesa uma barreira difícil de ultrapassar. Os temas tratados foram vários.
Não traduzi todas as mensagens e escolhi as partes que considerei mais
relevantes. Quem quiser ver toda a discussão deve aceder aos grupos “Universal Theosophy”
e “Theosophical
Society in the Philippines”, até porque os excertos que vou apresentar
dizem respeito apenas às opiniões expressas pelo respeitado teosofista
filipino, estando no entanto implícitas as opiniões contrárias, pelo que não
haverá dificuldade na interpretação do texto. De qualquer modo, as respostas
dadas por Hao Chin têm a ver com este,
este,
este,
este
e um conjunto de textos atacando Geoffrey Hodson, um
teosofista da linha da neo-teosofia, que podem ser encontrados neste perfil do Facebook.
Geoffrey Hodson (1886-1983) |
Antes de começar, é de referir
que as observações de Hao Chin (de quem obtive permissão expressa para fazer
esta tradução) são dirigidas ao grupo de teosofistas liderado por
C.C. Aveline. Ressalvo desde já que não se pretende de modo nenhum a minimização do extenso e em grande parte valoroso trabalho deste e dos demais teosofistas que com ele colaboram (mormente as traduções para português de muita literatura teosófica).
Como este texto será partido em três partes, e para evitar equívocos lembro a minha posição, que sempre foi crítica de Besant e Leadbeater. Não tenho o hábito todavia de estar constantemente a repeti-la, nem de impô-la a ninguém, e tudo o que escreveu Hao Chin (e nalguns pontos não estou completamente de acordo) fez-me entender um pouco melhor a razão de tantos equívocos no período em que Besant foi presidente da ST Adyar. Estou-lhe por isso muito grato e não tenho dúvidas que é uma das pessoas mais esclarecidas e sábias no movimento teosófico.
Como este texto será partido em três partes, e para evitar equívocos lembro a minha posição, que sempre foi crítica de Besant e Leadbeater. Não tenho o hábito todavia de estar constantemente a repeti-la, nem de impô-la a ninguém, e tudo o que escreveu Hao Chin (e nalguns pontos não estou completamente de acordo) fez-me entender um pouco melhor a razão de tantos equívocos no período em que Besant foi presidente da ST Adyar. Estou-lhe por isso muito grato e não tenho dúvidas que é uma das pessoas mais esclarecidas e sábias no movimento teosófico.
C.C.Aveline (Foto: O Tempo de Belo Horizonte) |
Segundo as minhas notas, a
mensagem de Hao Chin que se encontra abaixo é de 26 de junho, mas a discussão
já vinha longa… O tema central é a postura no âmbito de uma discussão de
ideias.
“(…) Você [dirigindo-se a um elemento do grupo a
que acima me referi] transmite as opiniões de outras pessoas que repetem as
mesmas coisas que já foram respondidas e refutadas, e que continuam por sua vez
sem serem respondidas. Não existe uma discussão genuína. É apenas o “postar” e “repostar” de posições rígidas. Esta é a razão pela qual as descrevo
como propaganda, uma palavra que usei com cuidado.
Além do mais, lamento dizê-lo e
corrija-me se estiver enganado, parece-me que você e Carlos não estão realmente
interessados em explorar, investigar e discutir. Parece-me que você apenas quer
convencer-nos de uma opinião pré-determinada que possui. Mas como pode você
convencer-nos quando nem responde aos pontos específicos que já levantei por
diversas vezes em resposta aos vossos artigos e posts, e em resposta apenas recebo frases tipo slogan? Receio que isto não possa ser assim, caros irmãos. Sejamos
razoáveis e discutamos como um grupo de adultos maduros. Pessoalmente estou
disposto a mudar as minhas posições se me demonstrarem que as mesmas estão
erradas.
Por exemplo vocês repetiram o que
alegam ser as “óbvias” fabricações dos Mestres, retratos, etc…Já respondi a
essas alegações. Eu questionei: quem entre nós indagou pessoalmente o
Mahachohan para ser capaz de dizer que certo retrato é uma falsificação? Vocês
responderam que é, porque a fonte é também ela falsa – Leadbeater. Eu respondi
que Leadbeater, com os seus óbvios erros, também tinha observações
clarividentes corretas, e dei exemplos específicos disso. Se essas observações
são válidas, então as extensas acusações de que ele é uma fraude são alegações
tendenciosas e injustas. E o que dizem vocês? Nada. Absolutamente nada. O que
vocês fazem é apenas regressar ao vosso mantra que tal-e-tal é uma fraude.
Desculpem, irmãos, mas não parece que estamos numa discussão.
Vic Hao Chin foi um dos coordenadores desta publicação |
Diz-se que Goebbels terá comentado
que quando se repete vezes sem conta uma inverdade às pessoas, elas irão
acreditar. Irmãos, nós somos exploradores da verdade, não propagandistas ou
políticos. (…)
Em segundo lugar entendam que os vossos pontos de vista são
apenas a vossa opinião. Outros poderão discordar dela. Isso significa que se eles
não fizerem o que vocês lhes pedem ou se discordarem, vocês considerá-los-iam
desonestos? Ou os chamaram de fraudes piedosas? Ou de desrespeitadores dos
Mestres?
Eu recordo-me que num artigo, Carlos deplorava aquilo que
chamava de papismo, ou seja, de atuar como a igreja [católica] romana, com um
Papa infalível que tem praticamente poder absoluto. As afirmações que vocês
estão a fazer agora parecem-me papismo, pois vocês não me parecem ser tolerantes
nos desacordos e estão prontos a imputar desonestidade quando alguém não vê as
coisas da mesma maneira que vocês. (…) a Sociedade Teosófica leva a sério os
princípios de liberdade de pensamento e de investigação. Você pode não
acreditar na existência dos Mahatmas e de qualquer outros “ensinamentos”
teosóficos, exceto a fraternidade universal, e ainda ser um respeitado membro e
irmão. Ficam desconfortáveis com isto? Se sim, então este é o desacordo básico
(…) a Sociedade Teosófica não subscreve tal conformismo [de opiniões]. A
procura pela verdade deverá estar sempre assente na liberdade genuína.
As coisas que vocês mencionaram em relação às quais os
teosofistas deveriam ser “libertados” não são sequer importantes para a ST em
geral. Vocês parecem estar mais preocupados com as crenças particulares de
alguns indivíduos (…) do que com a fraternidade universal, vida espiritual,
formação de caráter, popularização da teosofia, etc… O destino do movimento
teosófico dificilmente assenta em coisas insignificantes. Para quê estar tão
agarrado ou preocupado com assuntos que ninguém pode comprovar ou refutar, ou
com obscuras cerimónias privadas [NT: aqui Hao Chin refere-se ao Rito Egípcio,
referido aqui.
Num post mais antigo, os argumentos que constam deste texto foram rebatidos um
por um] de que virtualmente ninguém sabe ou viu? Como irá isto afetar a missão
teosófica (…)? Porquê fazer uma montanha de um montinho de areia?
Eu não aprecio o hábito de alguns participantes carregarem
um artigo controverso e depois não responderem aos nossos comentários e
refutações. É como semear a discórdia sem provar a vossa tese ou sem entabularem
uma discussão. É injustamente destrutivo. (…) escolheram este espaço [o grupo do Facebook TS
in the Philippines] como veículo para a vossa propaganda, e isso não é útil
para aqueles que são recém-chegados à teosofia.”
Continua na próxima semana.
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