Na 1ª parte, publicada no dia de Páscoa, vimos a história de
Jesus segundo os registos dos judeus e a forma como difere do que podemos
encontrar nos Evangelhos. Nesta 2ª e última parte decobriremos qual dessas
versões é considerada mais fiável segundo a Teosofia original trazida ao mundo
por HP Blavatsky com o auxílio dos Mestres de Sabedoria.
Um deles, o Mestre KH, na carta 38 (ML-90) a certa altura diz: “embora
(...) João Baptista nunca tenha ouvido
falar de Jesus, que é uma abstracção espiritual e não foi um homem vivo naquela
época”.
Noutro documento não tão conhecido, KH é ainda mais
explícito. Numa tradução para um inglês de um texto de Eliphas Levi chamado “Os Paradoxos da Ciência Mais Elevada”, que se destinava a ser publicado na Revista
da ST “O Teosofista”, surgiram umas notas assinadas por E.O (Eminente Ocultista),
que era nada mais nada menos do que o Mestre KH. E é nestas notas que se
encontra a referência mais explícita à história de Jehosuah. Na secção IV do
texto, uma nota (ver a número 53 neste link) diz assim:
“Mas ele pregou um século antes do seu nascimento
[referindo-se a Jesus]-E.O.”, ou seja, temos o próprio KH a fazer uma afirmação
que confirma que Jesus viveu no período temporal mencionado nos documentos da
religião judaica.
O tradutor do texto foi Allan Octavian Hume. Este inglês esteve
envolvido com a Sociedade Teosófica durante um breve período, tendo trocado
correspondência com os Mestres, exactamente na mesma altura que Alfred Percy Sinnett. O seu principal contributo foi o de fundador do Congresso Nacional
Indiano, um partido político que teria um papel fundamental no movimento de
independência indiano, que viria a triunfar em meados do século XX. Hume, que
viveu entre 1829 e 1912 era também um ornitologista amador, algo que chegou-lhe
a valer comentários bastantes irónicos por parte de um dos Mestres. Hume tinha
um grande intelecto, mas era excessivamente céptico e algo arrogante. No fim acabou
por se virar contra os Mestres (a quem chamou de "Asiáticos egoístas") e contra
Helena Blavatsky. Tal como muitos personagens daquela época que estiveram
ligadas à Sociedade Teosófica, na minha opinião, Allan Hume representa um grupo
de pessoas: o daqueles que por mais
provas que tenham, acabam por procurar uma prova adicional
que momentaneamente os parece satisfazer, mas passado algum tempo voltam ao início do ciclo. Inevitavelmente acabam por se tornar cépticos
e mesmo que continuem envolvidos com a Teosofia têm uma postura destrutiva.
O texto traduzido de Eliphas Levi, além das observações de
KH, tinha as notas do tradutor Hume, sendo que HPB acrescentou também alguns
pontos, com o intuito de corrigir Hume. Essas correcções podem ser encontrados
num dos volumes dos seus Escritos Reunidos, aqui.
Depois da nota de KH, “Mas ele pregou um século antes do seu
nascimento”, Hume escreve:
“Posso explicar porque é que a maior parte dos ocultistas eminentes
consideram o Evangelho Cristão como algo idealista, baseado num Jesus que viveu
um tempo considerável antes do Anno
Domini. Este Jesus, Jeshu Ben Panthera, viveu entre 120 e 70 AC, foi um
aluno do Rabi Joachim Ben Perachia, seu tio-avô, com quem, durante a
perseguição aos Judeus por Alexandre Janeu, fugiu para Alexandria e foi
iniciado nos Mistérios Egípcios ou magia. Ao regressar à Palestina, este Jesus
foi acusado e condenado por heresia e feitiçaria (ele era inquestionavelmente
um Adepto) e enforcado na árvore da infâmia (a cruz romana) do lado de fora da
cidade de Lud ou Lydda. Este homem foi um personagem histórico, e a sua vida e
morte estão indubitavelmente provadas. A razão porque eles [os ocultistas
eminentes] olham para o Evangelho Cristão como um ideal, baseado na história de
Jesus é porque não existem registos contemporâneos ou quase contemporâneos do
Evangelho Cristão por parte de historiadores confiáveis. A única passagem em
[Flávio] Josefo que se refere a Jesus Cristo é admitida por todos como sendo
uma falsificação pura. Claramente Josefo nunca mencionou Cristo, e se as
narrativas do Evangelho estivessem correctas ele tê-lo-ia feito. Uma vez mais, Fílon
de Alexandria, o mais conhecedor dos historiadores, contemporâneo do Jesus dos
Evangelhos, um homem cujo nascimento antecedeu e cuja morte sucedeu ao
nascimento e morte de Jesus, respectivamente por dez e quinze anos; que visitou
Jerusalém desde Alexandria várias vezes durante a sua longa carreira, e que
deve ter estado em Jerusalém pouco tempo depois da crucificação; que, ao
descrever as várias seitas religiosas, sociedades e corporações da Palestina,
tem o maior cuidado em não omitir ninguém, reparando até nas mais
insignificantes, nunca aparentemente ouviu nada (e certamente não menciona nada) sobre
Cristo, a crucificação ou qualquer um dos factos celebrados nos Evangelhos.
Mais, eles perguntam se Cristo realmente viveu no tempo que se alega, como é possível
não existir nenhuma referência no Mishná. O Mishná foi fundado por Hilel, o
Ancião em 40 AC e editado e amplificado (até ao início do Século III da nossa
Era) em Tiberíades no mar da Galileia, o foco das acções dos apóstolos bíblicos
e dos milagres de Cristo. O Mishná contém um registo ininterrupto de todos os
heresiarcas e rebeldes contra a autoridade do Sinédrio Judeu e é um resumo diário
das acções da sinagoga e uma história dos Fariseus, aqueles que foram acusados
de levar Jesus à morte. Como é possível pergunta-se, que as narrativas do
Evangelho sejam verdadeiras, e que os acontecimentos aí registados tivessem
ocorrido na época alegada, quando nenhuma
referência se encontra para esta sucessão de acontecimentos decidadamente
importantes (embora os Rabis acreditassem que Jesus era um impostor) nesta
crónica muito elaborada, cujo principal objectivo era registar todas as
heresias, divisões e assuntos que afectavam a religião ortodoxa judaica.
Agora perceber-se-á porque é que E.O. disse que Jesus pregou
100 anos antes de ter nascido -NT”.
Aqui está o link para a versão em pdf deste texto (em
inglês).
Hume poder-se-á ter baseado num texto de HPB, chamado “ A Word with Zero”, que é uma resposta de HPB a alguém que tinha atacado os teosofistas
num jornal indiano, acusando-os de desrespeitarem as figuras de Jesus e São Paulo.
Este texto também está nos Escritos Reunidos e podem vê-lo aqui.
É fácil perceber que muitos mitos foram associados a Jesus.
Robert Zoller, na Lição Três do Curso Avançado em Astrologia Medieval refere
paralelos no mito de Jesus com o do Deus Grego Adónis e na identificação de
ambos com o Sol. Outra curiosidade de Jesus, tem a ver com a ligação à imagem
do peixe (que identificava os primeiros cristãos). Ora Peixe deriva do grego
ichtys que se escreve ixthus. É um anagrama de Jesus Christos Theos Unigenos Sator. Significa “Jesus (que se
pronuncia Yesus) Cristo, salvador unigénito de Deus”.
A mitologia ligada a Jesus, é também focada na primeira
parte do polémico filme Zeitgeist, que se tornou viral na internet. Aqui está o
link para os primeiros dez minutos do filme, na versão com dobragem em português.
Para saber mais sobre este assunto – que raramente é
abordado de frente pelos teosofistas, com medo de ferir suceptibilidades (quão
afastado anda o espírito de Helena Blavatsky!), recomendo vivamente o livro de
José Manuel Anacleto, “Cristo”, editado pelo Centro Lusitano de Unificação Cultural. A
partir de uma série de artigos publicados na revista Biosofia em 2002 e 2003,
Anacleto juntou mais material e publicou
um pequeno livro onde se pode encontrar, além desta mais confiável história de
Jesus, o enquadramento histórico da falsificação que se produziu nos séculos
seguintes à sua morte, referências a algumas das cenas negras que
caracterizaram os primórdios da Igreja e o enquadramento do Cristianismo no conjunto das grandes religiões e suas
ligações a outras tradições.
A força do nome Jesus é muito grande no Mundo. Foi sem
dúvida, um grande instrutor, o maior do seu tempo, como diz Blavatsky. Uma
série de eventos conduziu a que a maior religião do nosso planeta esteja a ele
ligada.
Nos momento de aflição é o seu nome que dizemos. Há dias
contavam-me que o pêndulo (da radiestesia) responde lindamente a uma folha
escrita com o nome Jesus...
Não se pretende aqui diminuir a figura de Jesus e só pensará
dessa forma quem tiver a cabeça cheia de preconceitos. O ideal de Cristo tem
inspirado uma grande parte da Humanidade, embora na minha opinião quem tem
maiores responsabilidades em veicular correctamente esse ideal tem falhado
rotundamente e arrastado a civilização ocidental para o materialismo atroz.
Sem comentários:
Enviar um comentário