Karma é
outra palavra que se vulgarizou. O seu significado real e as implicações da lei
que lhe está associada, são muitas vezes alvo de confusão, o que pode conduzir
ao desespero e à descrença, pois não raramente, indivíduos que praticam bons
actos (vamos eliminar aqui o erro de perspectiva) vêem-se no meio de
dificuldades tais, que mais parecem um castigo que uma retribuição.
Mais uma
vez, sem entrar em grandes detalhes, vou deixar aqui algumas pinceladas sobre
este tema.
Segundo o
astrólogo Stephen Arroyo (um dos mais importantes da linha da astrologia
psicológica, a par de Liz Greene e Howard Sasportas), karma refere-se à lei
universal de causa e efeito, sendo que a lei do karma pode ser equiparada à lei
mecânica de Newton, que estabelece que "toda a acção desencadeia uma
reacção igual ou oposta", sendo no fundo "um método para atingir e
manter a justiça e o equilíbrio universais". Aliás a palavra karma significa
acto ou acção. Arroyo acrescenta que "o conceito de karma baseia-se no
fenómeno de polaridade, pelo qual o universo mantém uma situação de
equilíbrio", não um estado de inércia, mas um "equilíbrio dinâmico,
constantemente em alteração". Claro que a doutrina do karma está
intimamente ligada à da reencarnação e Arroyo também refere isso na sua obra
"Astrologia, Karma e Transformação", traduzida para português pela
Editora Europa-América, de onde foram retiradas todas as referências anteriores
e seguintes respeitantes ao mesmo autor. Escreve ele também, que uma antiga
tradição da Índia divide o karma em três grupos: o presente, ou seja, aquele
que deve ser enfrentado na presente vida (pralabd karma); o karma que geramos
nesta vida e cujos efeitos só virão mais tarde (kryaman karma); e aquele que
acumulámos em muitas vidas mas que na presente vida em particular não está em
actividade (sinchit karma).
Poderá
também ser feita outra divisão, pois o indivíduo além do seu próprio karma
estritamente individual, ainda está sujeito ao de grupo (familiar, regional,
nacional). E é o cruzamento de todas estas variáveis que acaba por constituir a
teia das nossas vidas. É fácil assim perceber o quão complicado é tentar entender
a causa de determinada situação. As variáveis são tantas que determinados
acontecimentos parecem inexplicáveis, injustos e revoltantes. Noutros casos não
é assim. Uma mente atenta, com a correcta medida de auto-crítica é capaz de
olhar para a situação presente e avaliar o que fez de bem ou de mal no passado
e perceber o que a conduziu àquele fim. Aliás, este exercício de auto-exame é
extremamente útil para o progresso espiritual do indivíduo, embora não se deva
cair em extremos no que respeita a tentar descobrir o fio do karma, pois muitas
vezes este não é linear.
Prossigamos
agora com Helena Blavatsky, que na sua obra mais simples, mas imprescindível,
"A Chave para a Teosofia" dedica várias páginas à lei do karma
(começando na p. 176, da edição em português), que define como sendo
"aquela lei invisível e desconhecida que ajusta sábia, inteligente e
equitativamente cada efeito à sua causa, remontando esta última ao seu
produtor". Mas, a ideia mais importante que contêm estas páginas do livro
de HPB é a distinção entre o karma estritamente individual e a totalidade do
karma que o indivíduo recebe. Blavatsky diz que não se pode afirmar
categoricamente que “cada meio ambiente pessoal e as condições de vida
específicas, nas quais se encontra cada pessoa, são nada mais que o karma
retributivo que o indivíduo gerou numa vida anterior”. Mais à frente,
acrescenta que “seria impossível ao karma reajustar o equilíbrio de poder na
vida e no progresso mundiais” e que “uma lei oculta, rege que nenhum homem pode
tornar-se superior às suas falhas individuais sem elevar, nem que seja apenas
um pouco, todo o organismo do qual ele é uma parte integral”. O nosso
contributo para o bem geral permite equilibrar o karma que não é estritamente
individual e que nesta obra teosófica é chamado de karma nacional ou distributivo.
HPB usa também uma excelente metáfora para explicar o karma, através da imagem
da queda de uma pedra num lago. Quando isto sucede formam-se ondas que oscilam
para a frente e para trás até que a água retorna à sua condição de
tranquilidade. Assim toda a acção produz uma série de perturbações até que o
equilíbrio seja restaurado, i.e. todas as forças postas em movimento têm de
“reconvergir” ao ponto inicial. Importante também é a noção de que “o karma
devolve a cada homem as reais consequências das suas próprias acções, sem
qualquer consideração para com o seu carácter moral”.
Mabel
Collins, na obra “Luz sobre o Caminho” originalmente publicada em 1885 (da qual
existem duas traduções para português, uma traduzida por Fernando Pessoa e
publicada mais recentemente pela “Assírio & Alvim e outra da Editora
Teosófica) inclui uma comunicação de um Mestre sobre o karma que está em linha
com o que Blavatsky escreveu anos mais tarde. O texto é de uma beleza
extraordinária, mas vou citar apenas breves passagens: “Não desejeis semear
para uma colheita vossa: desejai apenas semear aquela semente cujo fruto
alimentará o mundo”. Mais à frente se alerta para aquelas situações onde
inconscientemente a acção do indivíduo tem um fundo egoísta.
O último
parágrafo é de suma importância e de seguido o transcrevo: “ A operação das
leis reais do karma não é para ser estudada senão quando o discípulo chegou ao
ponto em que elas já não o afectam. O iniciado tem direito a pedir que lhe
sejam ensinados os segredos da Natureza e as leis que regem a vida humana.
Obtém este direito por ter escapado dos limites da Natureza e se ter libertado
das regras que governam a vida humana. Tornou-se uma parte reconhecida do
elemento divino, e já não é afectado por o que é temporário. Então obtém
conhecimento das leis que governam as condições temporárias. Por isso vós que
desejais compreender as leis do karma, tentai primeiro libertar-vos dessas
leis; e só o podereis conseguir fixando a vossa atenção em aquilo que essas
leis não afectam.” (p.72 da edição da Assírio & Alvim).
É preciso
pois muita cautela, em tirar conclusões precipitadas sobre o funcionamento da
lei do karma e alguma literatura new-age não ajuda muito nesse propósito. A ideia
da aplicação da lei de talião (rigorosa reciprocidade do crime e da pena) no âmbito
da doutrina do karma também é outro erro onde às vezes se incorre, pois não significa que a correcção do desequilíbrio resulte de uma troca de lugar entre a vítima e o
agressor num contexto semelhante.
Olá amigo Paulo,
ResponderEliminarGosto imenso deste texto. Espero que este Blog seja bem conhecido. Quando o Blog estiver pronto para o público, diga-me, pois irei enviar uma mensagem aos membros da nossa rede sabedoriaviva para o visitarem.
A divulgação séria e verdadeira é imprescindível para que o ensino correto e sem fantasias fique acessível a todos que o desejarem.
Desejo para si e sua família um Ano cheio de saúde, sorte, luz e amor.
Um abraço faterno
MariaHelena