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sábado, 13 de agosto de 2016

A controvérsia sobre o quinto e sexto volumes de "A Doutrina Secreta" (10ª parte)

Na semana passada terminámos a tradução do artigo de Daniel Caldwell,  "O mito do terceiro volume desaparecido de A Doutrina Secreta". Hoje iniciamos a tradução de uma discussão que teve lugar numa comunidade online de teosofistas.

O Theosophy Nexus é considerado por muitos teosofistas o melhor fórum de discussão sobre Teosofia atualmente em atividade. Está ligado ao site Universal Theosophy, também ele de grande qualidade. No Nexus debatem-se os ensinamentos teosóficos com profundidade e a maior parte das opiniões que lá surgem são de teosofistas experientes. O acompanhamento regular desta comunidade já permite uma boa aprendizagem.




Este assunto esteve lá em debate e portanto nada melhor do que traduzir algumas das intervenções. Para o efeito, o Lua em Escorpião teve a autorização expressa de um dos administradores do Nexus.

David Reigle (um dos principais, senão o principal expert em Sânscrito no movimento teosófico atual) refere: “Depois do conselho dos Keightleys, ela [HPB] mudou este material [referente à história de alguns Iniciados] do primeiro para o terceiro volume, o qual só foi publicado depois do seu falecimento.”

Jon Fergus, de quem o Lua em Escorpião já traduziu este post replica referindo que não crê que a secção que se encontra no 3.º volume seja o que HPB inicialmente planeou.


Jon Fergus

Reigle responde que efetivamente a visão que Jon apresenta era a da maioria dos estudantes de “A Doutrina Secreta”, incluindo ele próprio e Daniel Caldwell (um investigador independente que gere o portal em língua inglesa que contém mais material sobre Blavatsky, tendo o Lua em Escorpião já traduzido textos nunca antes publicados deste autor). Caldwell tem um papel central nesta questão. Foi a investigação dele que mudou a opinião de muitos no meio teosófico. Iniciada na 2ª metade dos anos 80 e encorajada pelo falecido John Cooper (teosofista australiano que esteve encarregue de compilar as famosas Cartas de HPB, o primeiro volume das quais publicado em 2004 pelas mãos de John Algeo e que tanta polémica deu), essa investigação foi publicada em 1995 no American Theosophist com a designação “O Mito do Terceiro Volume Desparecido de A Doutrina Secreta”, revisto em 2004 e publicado em 2014 no livro editado por David e Nancy Reigle “The Secret Doctrine Würzburg Manuscript”, que contém um terço do primeiro manuscrito da magnum opus de Blavatsky.

Fergus mantém-se irredutível, argumentando com a diferença de qualidade entre este terceiro volume e os dois anteriores, no que é apoiado por Nicholas Weeks (teosofista bem conhecido no meio, ligado à tradição de Point Loma e cujo texto mais conhecido será “Theosophy’s Shadow” [A Sombra da Teosofia], uma forte crítica à tradição de Alice Bailey).

Reigle saúda a discussão aberta (ao que eu acrescentaria que nunca é de mais reafirmar a necessidade de as pessoas discutirem pontos de vistas diferentes com urbanidade), mas responde que a afirmação de Bertram Keightley (ele e o seu sobrinho Archibald ajudaram a editar a primeira “Doutrina Secreta”) foi o que o fez mudar de opinião:


David Reigle

“HPB havia dado o manuscrito completo de “A Doutrina Secreta” aos Keightleys e estes sugeriram a sua reordenação. Bertram escreveu:

“(…) em vez do primeiro volume consistir na história de alguns grandes Ocultistas, como ela [HPB] pretendia, aconselhámo-la a seguir uma ordem natural de exposição e começar com a evolução dos Cosmos e daí para a Evolução do Homem e então para lidar com a parte histórica num terceiro volume abordando as vidas de alguns grandes Ocultistas…”.

Fergus reage alegando que muito tempo passou entre a afirmação de Bertram e a publicação do terceiro volume por parte de Annie Besant. Lembra que um mês antes de morrer, Blavatsky disse que o manuscrito do terceiro volume está “quase pronto”, sendo muito estranho que leve 6 anos a ser publicado e com um conteúdo pouco organizado, na opinião de Fergus.


Parte 3 do documentário sobre Annie Besant

HPB com efeito escreveu o seguinte na revista Lucifer de abril de 1891:

Há dois anos, a autora prometeu em “A Doutrina Secreta”, Vol.II p. 798 [p.366 do volume IV da edição em português de “A Doutrina Secreta”], um terceiro e até um quarto volume deste trabalho. O terceiro volume (que está praticamente pronto) trata dos antigos Mistérios da Iniciação, dá esboços – do ponto de vista esotérico – de muitos dos mais famosos e historicamente conhecidos filósofos e hierofantes (todos eles considerados pela ciência como impostores), desde a antiguidade ate à era cristã, e rastreia os ensinamentos de todos estes sábios à mesma e única fonte de todo o conhecimento e ciência – a doutrina esotérica ou RELIGIÂO SABEDORIA. Nem é necessário referir que dos materiais lendários esotéricos usados no próximo trabalho, as suas afirmações e conclusões diferem grandemente e muitas vezes chocam irreconciliavelmente com os dados fornecidos por quase todos os orientalistas ingleses e alemães….O objetivo principal do Volume III de “A Doutrina Secreta” é provar, ao identificar e explicar os véus nas obras dos antigos indianos, gregos e outros filósofos de renome e também em todas as antigas Escrituras – a presença de um método e simbolismo alegórico e esotérico ininterruptos: mostrar, tanto quanto possível, que com as chaves da interpretação conforme ensinadas no Cânone do Ocultismo Hindu-Budista Oriental, os Upanixades, os Puranas, os Sutras, os poemas épicos da Grécia e da Índia, o Livro Egípcio dos Mortos, os Eddas escandinavos, bem como a Bíblia hebraica e ainda os escritos clássicos dos Iniciados (como Platão, entre outros) – tudo, do início ao fim, dão um significado bastante diferente dos seus textos em letra morta.
Este texto também pode ser encontrado nos Collected Writings.

Fergus alega que comparando esta descrição com o conteúdo do Volume III há uma considerável discrepância. Quem abrisse esse volume, conhecedor da descrição de Blavatsky, ficaria desiludido.
Nicholas Weeks refere que é um pouco estranho terem levado 6 anos para publicar o 3º volume (que estaria quase pronto um mês antes de Blavatsky morrer). Porque não incluí-lo na re-edição de 1893? Para além disso, para quê juntar as Instruções Esotéricas, para engordar o volume quando este já tinha 432 páginas (no original, em inglês)?




Reigle considera que os argumentos de Caldwell são demasiado robustos para sequer sofrerem contestação.

Segundo aquele Sanscritista, o testemunho mais forte vem de Archibald Keightley que a 29 de abril de 1889 referiu:


“O terceiro volume de “A Doutrina Secreta” está em manuscrito pronto para impressão. Consiste principalmente de uma série de esboços de grandes ocultistas de todas as épocas e é um trabalho maravilhoso e fascinante. O quarto volume, que basicamente dará algumas pistas sobre ocultismo prático, já foi delineado, mas ainda não foi escrito” (Wachtmeister, 1893, p. 84).


Condessa Constance
Wachtmeister


Continua na próxima semana.

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