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sábado, 31 de janeiro de 2015

Reflexões sobre Deus

Mesmo no meio teosófico as perceções sobre Deus e a sua natureza são muito variadas. Muitos desconhecem (e alguns dos que conhecem têm dificuldade em compreender) as noções expressas pelos Mahatmas na carta ML-10. A própria Virginia Hanson na nota que antecede a carta escreve o seguinte:

“Agora chegamos àquela que é provavelmente a carta mais polémica. (…) Estas “notas” fizeram com que algumas pessoas rejeitassem toda a filosofia oculta por causa da negação do conceito tradicional de Deus.”

No grupo de Facebook da SociedadeTeosófica das Filipinas, a propósito de uma discussão sobre se a Ciência prova ou nega a existência de Deus, encontrei uma série de parágrafos escritos por Vicente Hao Chin Jr. bastante interessantes e que ajudam a perspetivar o conceito de Deus.

Escreve o teosofista filipino, cujo currículo pode ser visto aqui:

Vicente Hao Chin Jr.

“Um aspeto que muitas pessoas negligenciam sobre este tema é: que tipo de Deus estamos a tentar provar ou refutar? Normalmente assumimos um Deus que interage com a humanidade e o Universo – um Deus que faz julgamentos e que responde tal como um ser humano, um Deus que gosta de umas coisas e que não gosta de outras coisas e que até fica irado e ciumento, que se arrepende, condena e castiga pessoas à condenação eterna.

Se é este o tipo de Deus do qual estamos a falar, então não precisamos da ciência para refutá-lo. Apenas usando o raciocínio percebemos que o Deus antropomórfico semelhante ao homem não pode existir. Esta ideia está cheia de contradições. Como pode um Deus todo-poderoso ser ciumento e irado? Ou criar um mundo e uma humanidade sabendo de antemão que ele (ou ela) terá condenar parte das suas criações conscientes ao tormento e sofrimento eternos? Como pode ele ter presciência (omnisciência) e ao mesmo tempo mudar de ideias dependendo das boas e más ações das pessoas?

Do mesmo modo que prontamente afastamos a ideia de Zeus como sendo Deus, também deveríamos pôr de lado deuses semelhantes ao homem, como encontramos nas religiões populares. É importante salientar que muitos teólogos cristãos não subscrevem essas noções vulgares de Deus.


Em 2002, a cantora Britney Spears disse que "Deus
 tinha uma longa barba branca" e que "cirandava pelo céu"
 (imagem: www.comeletusponder.com)


Por isso antes de falarmos sobre se a ciência prova ou refuta Deus, temos de perguntar: o que significa Deus? Se Deus é o todo da Natureza como acreditava Spinoza, então não necessitamos da Ciência para prová-lo ou refutá-lo. Acabámos de definir Deus como tudo o que existe. É uma tautologia.

Se concebemos Deus como um criador e projetista inteligente – alguém que planeia o Universo – temos de perceber que estamos a regressar a uma conceção humana de pensador e planeador. Só planeamos ou projetamos quando não sabemos o que vai acontecer no futuro. Como podemos reconciliar isto com a alegada omnisciência de Deus? Se Deus planeou, significa que existiu um tempo em que ele não sabia o que iria acontecer? Se ele já sabia de tudo de antemão, então não há necessidade de um plano ou de um projeto. E não apenas isto: se ele é presciente em relação a tudo, então nada pode ele mudar porque uma tal mudança implicaria que o seu conhecimento estaria errado. E se ele não pode mudar nada que já se sabia à partida, então ele não é omnipotente – de facto todo o universo torna-se apenas um completo autómato que funciona de acordo com este plano, ou de acordo com as leis que o governam.

A necessidade de desemaranhar tais assuntos dos muitos enganos é a razão pela qual Helena Blavatsky mergulhou profundamente e de forma abrangente na natureza de Deus, dos deuses e da emanação no seu primeiro volume de “A Doutrina Secreta”. O seu livro representa um dos mais importantes estudos jamais escritos sobre teogonia e cosmogonia.




Por exemplo, “A Doutrina Secreta” fala de seres divinos ou espirituais que são superiores a seres humanos mas que não são Deus no sentido mais elevado da palavra. São limitados ou imperfeitos mesmo que tenham poderes sobrenaturais. Estes seres superiores são superiores em relação à humanidade, da mesma forma que os seres humanos são superiores aos animais e às plantas. Os animais podem considerar-nos deuses, mas isso não é conceber Deus no sentido derradeiro.


O Mahatma Koot Hoomi (carta 88) escreveu [NT: esta carta é a ML-10, identificada como a nº88 na sequência cronológica e pode ser encontrada na p.53-64 do vol.II das Cartas dos Mahatmas para A.P. Sinnett] : “A palavra ‘Deus’ foi inventada para designar a causa desconhecida daqueles efeitos que o homem tem admirado ou temido sem entender… a ideia de Deus não é uma noção inata, mas adquirida…O Deus dos teólogos é simplesmente um poder imaginário…um poder que até agora nunca se manifestou.”

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