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sábado, 17 de outubro de 2015

ITC/2015 – Um balanço à distância

No final da primeira semana de agosto realizou-se em Haia, mais uma Conferência Internacional de Teosofia (ITC). Depois da muito participada edição do ano anterior, esta Conferência teve um ambiente mais familiar, sendo que o número de presentes terá rondado as sete dezenas. As ITC constituem um esforço notável de criar pontes de entendimento no movimento teosófico, que desde sempre foi palco de lutas de egos, divisões, discórdias, acusações mútuas, incompreensões e equívocos.



Depois do êxito do ano passado, que culminou com a redação da chamada declaração de Naarden, a iniciativa foi alvo de alguma oposição, com acusações da prevalência de um grupo sobre outro, havendo quem tivesse tentado arrastar problemas particulares de uma Secção nacional da Sociedade Teosófica para a própria iniciativa (é tão descabido que nem merece que se coloque cá o link). Sem grandes resultados, estas ações negativas são apenas de um eco já centenário de oposição ao avanço do movimento teosófico, que continua com dificuldade em lidar com os tempos modernos. Por um lado tem a concorrência das diatribes new-age, especialmente sedutoras para aqueles que veem na prática da espiritualidade uma espécie de hobby, que só encontra espaço em momentos compartimentados, e por outro lado, num tempo em que os estímulos e a quantidade de informação são em tal abundância, a Teosofia tem dificuldade em ser encontrada por aqueles que buscam para além da mediocridade dominante.


Entrada do Carlton Ambassador Hotel, local onde se realizou a
ITC 2015


Grande parte dos teosofistas de referência dos tempos atuais estão na casa dos 60 anos e alguns já na dos 70, e não se vislumbra na geração sucessora um número suficiente de estudantes que permita assegurar a continuação do movimento, pelo menos em patamar de qualidade semelhante ao atual (onde há já muito por fazer). Há quem inclusive refira que o movimento está em perigo. A colaboração entre as várias tradições do movimento é pois crucial para a sobrevivência do mesmo. Sem uma efetiva cooperação estabelecida em bases sólidas e eticamente irrepreensíveis, a Teosofia poderá tornar-se apenas uma predileção de um clube de excêntricos, acabando por se tornar na prática absolutamente irrelevante. Naturalmente há-de reflorescer noutra altura, como sempre aconteceu, mas seria absolutamente lamentável que o esforço de muitos que porfiaram pela Teosofia desde 1875 fosse em vão.


Responsáveis do ITC da esquerda para a direita: D. Grossman,
 E. Jennings (presidente), J. Peeters, J. Kind, H. Vermeulen (estes
dois últimos vice-presidentes), B. Peters, M. Gijsbers, S. Plocki,
J. Knebel, P. Wiskie, E. Bomas, J. Colbert e A. Hejka-Ekins não
estão na foto, mas também ocupam cargos no ITC.

Mas, voltemos à ITC 2015. É opinião de muitos, que esta Conferência foi novamente excelente, com ótimas intervenções por parte da grande maioria dos palestrantes.

Como já se escreveu antes, o tema da ITC deste ano foi: “Helena Petrovna Blavatsky sob diferentes perspetivas com um só coração”. Tal como sucedeu em relação às últimas edições, os vídeos da Conferência estão disponíveis no site da ITC e tive a oportunidade de os visionar na íntegra. Eis a minha seleção.

No primeiro dia, cada uma das organizações presentes (Sociedade Teosófica de Adyar, Loja Unida de Teosofistas e Sociedade Teosófica de Point Loma - Blavatsky House) fez uma apresentação sobre as suas origens, as bases em que assentam e o modo como divulgam os ensinamentos teosóficos. Das três apresentações feitas, a mais conseguida, do meu ponto de vista, foi a de Herman Vermeulen, da ST Point Loma. Este primeiro dia contou ainda com o momento alto da Conferência, a palestra de Jon Knebel, o teosofista que ficou encarregue de dar continuidade ao trabalho de edição e publicação da Cartas de Helena Blavatsky, cujo volume I, da responsabilidade de uma equipa chefiada por John Algeo (recentemente agraciado com a medalha Subba Row), foi alvo de enorme controvérsia, pela inclusão de cartas espúrias, sem o devido aviso ao leitor. Mais de doze anos já passaram sobre a edição deste polémico volume. Durante a conferência, Knebel anunciou o que segundo volume sairá algures em 2016 e o terceiro e quarto volumes seguir-se-ão. No entanto, Knebel continua à procura de mais material e durante a sua palestra anunciou que ainda iria se deslocar a Adyar para esse efeito, depois de já ter passado por Londres. Recorde-se que este processo de compilação do material publicado por HPB iniciou-se em 1924 pelas mãos de Boris de Zirkoff, que era um parente distante da Velha Senhora. À data da sua morte (em 1981), doze volumes dos Collected Writings haviam sido publicados. Dara Eklund deu continuidade a este projeto publicando mais dois volumes e um índice. Contudo sete conjuntos de manuscritos com a correspondência pessoal de HPB ficaram por publicar, e só quando a equipa liderada por Algeo iniciou a preparação do primeiro volume é que o projeto saiu do limbo em que havia ficado depois da morte de Boris de Zirkoff.


Jon Knebel


Sem dúvida que vale a pena assistir à exposição de Knebel, que escolheu algumas passagens de cartas de HPB que revelam algumas das caraterísticas e estados de espírito da fundadora do movimento teosófico moderno.

No segundo dia, o tema foi “Helena Blavatsky, HPB e o ciclo messiânico atual”. O decano James Colbert, associado da Loja Unida de Teosofistas, e um símbolo destas Conferências foi o primeiro orador, contando com a ajuda de Helena Kerekhazi. A não perder também é a intervenção de Barend Voorham, que fala do fenómeno denominado Tulku e da diferença entre Helena P. Blavatsky e HPB. Sobre este tema aproveito para recomendar o livro de Geoffrey Barborka, “HPB, Tibet and Tulku”.
Da parte da tarde deste segundo dia, discutia-se o modo de melhor capturar a essência da mensagem de Blavatsky. O teosofista francês Jacques Mahnich deu uma ótima palestra sobre o assunto, fornecendo várias linhas de orientação e sugestões para uma abordagem mais profícua à vasta e para muitos inescrutável obra de HPB.



Joy Mills foi outro dos símbolos do movimento teosófico atual que esteve presente, embora “à distância” nesta edição da ITC. A nonagenária norte-americana, residente em Krotona, foi entrevistada de propósito para o evento. Mills ainda fala com muito entusiasmo sobre o legado de Blavatsky, e com uma clareza notável. Foi também exibido um vídeo mais antigo, retratando parte de seminário dado pela mesma Joy Mills sobre a “Ética de A Doutrina Secreta”. Qualquer dos dois momentos (que estão no mesmo vídeo) valem a pena, Joy Mills faz uma exposição muito clara e enriquecedora sobre a obra de Helena Blavatsky.




No terceiro dia, falou-se sobre como manter viva a mensagem de Blavatsky para as gerações futuras. Sabine van Osta, da ST Bélgica, Joop Smits da ST Point Loma e Caroline Dorrance da LUT deram contributos bastantes interessantes. Van Osta falou da possibilidade de aproveitamento das novas tecnologias, Smits sobre como seguir as pegadas de HPB de forma a se tornar num instrutor e Dorrance abordou o método seguido por Robert Crosbie, o fundador da LUT, para disseminação da Teosofia.

De referir que intercalando as várias palestras existiam discussões de grupo que depois eram sumarizadas em reuniões coletivas. Os vídeos destas reuniões estão também disponíveis. Naturalmente que quem tiver mais disponibilidade de tempo deve visionar toda a conferência, mas julgo que a seleção que fiz acima acaba por capturar o que de melhor teve esta edição da ITC.

De notar que a edição do próximo ano já está agendada para os dias 11 a 15 de agosto e realizar-se-á em Santa Barbara, na Califórnia. A organização estará a cargo da LUT e o tema será "Teosofia e Responsabilidade Social".

Foto de grupo do ITC 2015

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