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sábado, 30 de julho de 2016

A controvérsia sobre o quinto e sexto volumes de "A Doutrina Secreta" (8ª parte)

Prosseguimos com a tradução do artigo de Daniel H. Caldwell, “O mito do terceiro volume desaparecido de A Doutrina Secreta”. É fundamental ler os posts das semanas anteriores antes de ler o post desta semana.





Os vários excertos de HPB descrevem razoavelmente bem parte do material no Volume III de 1897, como demonstram os títulos de alguns dos seguintes ensaios que esse volume contém:

III. A Origem da Magia

IV. O Sigilo dos Iniciados

V. Razões para o Sigilo

XIII. Adeptos pós-cristãos e as suas Doutrinas

XIV. Simão e o seu Biógrafo Hipólito

XV. São Paulo, o Verdadeiro Fundador do Cristianismo atual

XVI. Pedro foi um Cabalista Judeu, mas não foi um Iniciado

XVII. Apolónio de Tiana

XVIII. Factos Subjacentes nas Biografias dos Adeptos

XIX. São Cipriano de Antioquia

XXVIII. A Origem dos Mistérios

XXX. O Mistério do “Sol da Iniciação”

XXXI. A Finalidade dos Mistérios

XXXII. Vestígios dos Mistérios

XXXIII. Os Derradeiros Mistérios na Europa

XXXIV. Os Sucessores Pós-Cristãos dos Mistérios

XLIII. O Mistério de Buddha

XLIV. “Reincarnações” de Buddha

XLIX. Tsong-kha-pa, Lohans na China


Este artigo está assente em documentos de fontes primárias (várias cartas, artigos e o manuscrito de Würzburg) escritos durante os anos 1885-1897.

A maior parte destes testemunhos foi dado durante o tempo em que HPB escrevia e editava “A Doutrina Secreta” ou nos anos próximos dos acontecimentos narrados, altura em que seria expetável que os envolvidos se recordassem com precisão dos vários detalhes e do verdadeiro rumo dos acontecimentos.


Helena Blavatsky


Foi feita uma tentativa para apresentar as provas por ordem cronológica de modo a que o leitor possa discernir a torrente natural de acontecimentos relacionados com a redação e edição do manuscrito de “A Doutrina Secreta”.

O leitor também deve prestar atenção ao facto de existirem testemunhos conflituantes com aqueles que são citados neste artigo. A maior parte das provas contrárias foi dada quer por indivíduos que não estiveram diretamente envolvidos na redação e edição do manuscrito da DS ou por testemunhas que escreveram nos anos 20 e 30 do século passado (cerca de 30 a 40 anos depois dos acontecimentos).

Não é de espantar que a recordação pessoal dos acontecimentos passados algumas décadas antes contenha contradições e inconsistências. Quem quiser examinar estes relatos conflituantes deve consultar a “Introdução Histórica à Doutrina Secreta” de Boris de Zirkoff (especialmente as páginas 61, 63-6 e 71) bem como a sua análise ao terceiro volume (1897) nos Collected Writings, vol. XIV (especialmente as pág. xxxi-xxxii, xxxiv-xl). Ver também o apêndice a este artigo.




Um correspondente, ao ler o primeiro rascunho deste artigo, escreveu-me em resposta:

"Tendo em consideração a inconsistência das afirmações feitas por aqueles que conheciam o trabalho de HPB na altura, e a natureza contraditória, às vezes auto-contraditória de alguns deles, não vejo como seja possível chegar a uma conclusão sobre o volume III com base nestas afirmações, como você e Boris [de Zirkoff] tentaram fazer."

Em resposta perguntei: quais os acontecimentos históricos, importantes ou não, que não envolvam testemunhos inconsistentes e contraditórios?

Ponha-se em equação as declarações contraditórias (a favor e contra) das pessoas que conheceram pessoalmente HPB e que fizeram afirmações sobre os seus poderes psíquicos e sobre a existência dos seus Mestres. Emma Coulomb, Richard Hodgson, Vsevolod Solovyov, Hannah Wolff e outros forneceram relatos diferentes, contraditórios e negativos relativamente a HPB se comparados com os relatos de Henry Olcott, Constance Wachtmeister, William Judge, Annie Besant e outros que testemunharam o caráter genuíno das alegações de HPB.


Hodgson foi quem investigou as atividades de
Blavatsky e da ST para a Sociedade
de Pesquisas Psíquicas


Significa que estas contradições impedem-nos de chegar a uma conclusão aceitável no que respeita ao caráter genuíno ou não dos poderes psíquicos de HPB e à existência dos seus Mestres? Uma investigação histórica é levada a cabo, para ao menos em parte, tentar filtrar as evidências (a favor, contra e neutras) de um acontecimento ou de uma série deles, escrutinar as fontes primárias, pesar as evidências (incluindo contradições) e tentar chegar a conclusões razoáveis em relação ao que com maior probabilidade aconteceu ou àquilo que não aconteceu.

Outro tópico que não foi considerado neste artigo foi a “edição” do manuscrito de HPB do terceiro volume para publicação. Annie Besant no prefácio do terceiro volume afirmou claramente:

“Salvo a correção de erros gramaticais e a eliminação de modismos de todo estranhos ao idioma inglês, os textos permanecem tais como H.P.B. os deixou, a não ser uma ou outra alteração expressamente assinalada. Em outros casos raros, procurei sanar lacunas; mas todos estes acréscimos figuram entre colchetes, para distingui-los do texto.”

Não obstante, alguns estudantes das obras de HPB têm expressado preocupação com a quantidade de edições que Besant e os seus assistentes fizeram no manuscrito. Numa crítica ao terceiro volume de “A Doutrina Secreta”, James M. Pryse (Theosophy, Nova Iorque, Setembro 1897, 314-6) escreveu:

“Se tivesse sido impressa tal como H.P.B. a escreveu, então os teosofistas em geral tê-la-iam recebido de bom grado; mas como a Senhora Besant e outros a editaram, será alvo de uma justa suspeição.”
(Note-se que, cerca de trinta anos mais tarde, Pryse inverteu a sua perspetiva em relação a este assunto.)


James Morgan Pryse (1859-1942) esta à esquerda na foto.
Blavatsky e Mead também aparecem na foto.

Outra estudante particular de HPB, Alice Leighton Cleather (H.P. Blavatsky: A Great Betrayal, l922, p.75) dá o seu testemunho.

“Acontece que enquanto [o volume III] estava sendo preparado [para publicação] eu consegui examinar uma ou duas das longas folhas de papel almaço com que H.P.B. sempre preenchia com a sua bela caligrafia miudinha. Estavam mutiladas ao ponto de estarem quase irreconhecíveis, poucas das suas frases permaneciam intactas e existiam “correções”. 

Mais recentemente, Nicholas Weeks, que ajudou na preparação dos manuscritos dos volumes XIII, XIV e XV dos “Collected Writings” de HPB, expressou-me preocupações idênticas (correspondência privada):

“Quando estávamos trabalhando no volume XIV dos CW encontrámos muitas diferenças ou alterações entre “o primeiro rascunho” [o manuscrito de Würzburg] e o volume III da DS [1897]. Algumas das mais radicais estão incluídas no índice do vol. XIV (ver "Würzburg MS Interpolations." 


Nicholas Weeks e Dara Eklund, a sua
esposa


Nas p. 104 & 266-67 dos CW, vol. XIV estão dois exemplos das críticas cortantes à Igreja Católica Romana que não surgem na “DS III” [1897]. Não creio que HPB as tenha apagado ou aprovado a sua eliminação. Assim, a questão vem ao de cima: quantas “correções” e “inovações” foram feitas que não seriam autorizadas por HPB?... Sem o “manuscrito de Würzburg” não haveria qualquer indício das alterações que ocorreram.

Este tema da edição do manuscrito do Volume III (1897) precisa de ser cuidadosamente investigado no futuro.

Voltando à minha tese, concluo esta secção com uma citação importante de uma carta de Bertram Keightley (escrita em Lucknow, Índia em 6 de dezembro de 1922 e dirigida a Charles Blech, um teosofista francês):

"Quanto às pretensões de H.P.B. relativamente a volumes futuros – para além dos dois publicados sob sua própria supervisão – todo este material foi publicado no terceiro volume, que contém absolutamente tudo aquilo que H.P.B. deixou em manuscrito. [citado em “The O.E. Library Critic, 4 de julho de 1923]."



Interior da sede Sociedade Teosófica francesa.
Charles Blech foi a presidente da Secção
entre 1908 e 1934.


Se há algum teosofista conhecedor dos conteúdos do terceiro volume de HPB, esse teosofista é Bertram Keightley.


Pelas várias razões apresentadas neste artigo, estou inclinado a acreditar que o volume III de “A Doutrina Secreta” conforme foi publicado em 1897 era o verdadeiro Volume III pretendido por HPB durante a sua vida.

Continua na próxima semana.

sábado, 23 de julho de 2016

A controvérsia sobre o quinto e sexto volumes de "A Doutrina Secreta" (7ª parte)

Prosseguimos com a tradução do artigo de Daniel H. Caldwell, “O mito do terceiro volume desaparecido de A Doutrina Secreta”. É fundamental ler os posts das semanas anteriores antes de prosseguir. 


PARTE 5 – O TERCEIRO VOLUME DESDE A MORTE DE HPB ATÉ 1897

Vamos agora seguir a história do terceiro volume de “A Doutrina Secreta” desde maio de 1891 até à sua publicação em junho-julho de 1897.

Outubro de 1891 – Isabel Cooper-Oakley escreveu (Path, dezembro de 1891, p. 295):
A HPB Press…está a se tornar numa tipografia permanente…Uma nova edição de “A Doutrina Secreta” será a próxima a sair, e o terceiro volume está para ser publicado.


Isabel Cooper-Oakley
(1854-1914)


29 de outubro de 1891 – O Dr. Archibald Keightley escreveu numa carta para Bertram Keightley (citada por C. Jinarajadasa em "Dr. Besant and Mutilation of the Secret Doctrine,"Messenger, janeiro de 1926, p. 166):

Existem algumas conversas no sentido de reimprimir “A Doutrina Secreta” [Volumes I e II] e de corrigir erros quando o Terceiro Volume for lançado.

Dezembro de 1891 – Um aviso foi publicada no The Path, The Vahan, and The Theosophist por Annie Besant e G. R. S. Mead:

Estando esgotada a segunda edição da obra-prima de HPB, uma terceira edição tem de ser preparada imediatamente. Todos os esforços estão a ser feitos para rever exaustivamente a nova edição e os editores solicitam fervorosamente que todos os estudantes que leiam esta nota enviem listas completas de ERRATAS tanto quanto possível….É importante que a ERRATA da primeira parte do Volume I seja enviada IMEDIATAMENTE.


George Robert Stowe Mead
(1863-1933)

Janeiro de 1894 – Um aviso aparece no The Path (p.323)

O Volume um da nova edição de “A Doutrina Secreta” está agora pronto, e uma cópia foi enviada para todos os assinantes, com os custos de correio pagos…O volume dois, segundo se prevê agora, poderá ser enviado em janeiro.

Janeiro de 1894 – Uma declaração é publicada em Lucifer (p.354):

O terceiro volume de “A Doutrina Secreta” está a ser datilografado a partir do manuscrito.

Maio de 1895 – Annie Besant escreveu em Lucifer (188):

O terceiro volume de A Doutrina Secreta…foi colocado nas minhas mãos por HPB.



A 2ª parte do documentário "The Annie Besant Story"


Junho de 1895 – As primeiras páginas do Volume III foram para impressão (Lucifer, junho de 1895, p.271).

Junho de 1896 – Uma nota editorial surgiu em Lucifer (p.265):

No decurso da preparação do terceiro volume para impressão de “A Doutrina Secreta”, foram encontrados alguns manuscritos misturados e que não fazem parte da obra propriamente dita, e esses serão publicados em [Lucifer]

Setembro de 1896 – Volume III está completo (Lucifer, setembro de 1896, p.271).

Junho de 1897 – Volume III de A Doutrina Secreta foi publicado (Theosophist, setembro de 1897, p.766).




PARTE 6 - CONCLUSÕES E REFLEXÕES

É o volume III de “A Doutrina Secreta” publicado em 1897, igual (ou mais ou menos igual) ao manuscrito originalmente conhecido como o Volume I em 1886-1887 e mais tarde reorganizado, ficando conhecido como o Volume III entre 1887 e 1891?

Uma das peças de informação mais reveladoras que nos ajuda a responder a esta questão diz respeito à parte do Volume I que se encontra no que sobreviveu do Manuscrito de Würzburg.

A maior parte do material existente neste Volume I também pode ser encontrada no Volume III de 1897. O material do Volume I do Manuscrito de Würzburg deixado de fora do Volume III de 1897 foi incorporado no Volume I de “A Doutrina Secreta” conforme publicado em 1888 ou então foi publicado nas páginas de “Lucifer” durante a vida de HPB ou pouco depois da sua morte.


Helena Blavatsky


Além do mais, como foi descoberto a partir de fontes primárias de 1886 que o volume I original continha os artigos “A Magia Egípcia”, “Os Ídolos e os Terafins” e “O Mistério de Buddha“, não é significativo que estes três artigos também surjam no Volume III de 1897?

Mas o que aconteceu às duas secções de ensaios e vinte e seis apêndices (que não constam do Manuscrito de Würzburg remanescente), certamente uma parte integral do manuscrito de HPB do Volume I original de 1886-1887?

Se a maior parte do remanescente do volume I do Manuscrito de Würzburg acabou por ser incluído no Volume III de 1897, não será razoável sugerir que as restantes duas secções e vinte e seis apêndices (com várias exceções) também tivessem sido provavelmente incluídas no Volume III de 1897?

Considere-se também o seguinte facto. Quer H.P. Blavatsky quer Bertram Keightley referiram que o terceiro volume abordaria as vidas de grandes ocultistas. Uma quantidade considerável de material no volume III diz respeito às vidas de Simão o Mago, São Paulo, Pedro, Apolónio de Tiana, São Cipriano de Antioquia, Buda Gautama e Tsong-kha-pa. E um dos ensaios no volume III de 1897 intitula-se “Factos subjacentes nas biografias dos Adeptos”.


Estátua de Tsong-kha-pa


Recapitulemos duas das descrições de HPB dos conteúdos do terceiro volume. Primeiro, em “A Doutrina Secreta” (1888, 2:437), HPB escreveu:

No Volume III desta obra …será exposta uma breve história de todos os grandes adeptos conhecidos dos tempos antigos e modernos por ordem cronológica e uma perspetiva genérica dos Mistérios, a sua criação, crescimento, degradação e morte – na Europa. Não houve espaço para isto neste volume.

Também em “A Doutrina Secreta” (1888: 1:xl, na versão em língua portuguesa na página 62 do 1º volume com uma redação um pouco distinta) HPB escreve o seguinte:

Nesse [terceiro] volume apresentar-se-á uma breve recapitulação dos principais Adeptos historicamente conhecidos; será descrito como os Mistérios decaíram, principiando em seguida a desaparecer, e apagando-se finalmente da memória dos homens, a verdadeira natureza da Iniciação e da Ciência Sagrada. Passaram desde então a ser ocultos os seus ensinamentos, e a Magia não persistiu senão, quase sempre, sob as cores veneráveis, mas por vezes, enganosas, da Filosofia Hermética. Assim como o verdadeiro Ocultismo havia prevalecido entre os místicos durante os séculos que antecederam a nossa era, assim a Magia, ou antes a Feitiçaria com as suas artes ocultas, seguiu-se ao advento do Cristianismo.”


Londres de 1888, zona de Whitechapel
(foto: bbcamerica.com)

Com esta lista de conteúdos, compare-se as descrições dadas por HPB nas suas cartas de 1886, acima citadas, com as partes mais relevantes recapituladas aqui:

…os inegáveis factos historicamente provados da existência dos adeptos antes e depois do período cristão, da admissão de um duplo sentido esotérico nos dois testamentos pelos pais da igreja e provas que a verdadeira fonte de todos os dogmas cristãos residem nos mais antigos MISTÉRIOS arianos durante o período Védico e Bramânico, provas e evidências sobre isso são mostradas nas obras em Sânscrito quer exotéricas quer esotéricas. [14 de julho, 1886 para Olcott].

… um rápido esboço do que era conhecido historicamente e na literatura, nos clássicos e nas histórias sagradas e profanas – durante os 500 anos que precederam o período cristão e os 500 anos subsequentes: da magia, a existência de uma Doutrina Secreta Universal conhecida dos filósofos e dos Iniciados de todos os países e até de vários pais da Igreja como Clemente de Alexandria, Orígenes e outros, que tinham sido eles próprios iniciados.

Residência de Blavatsky em Londres
em Lansdowne Road,17.
Embora a foto seja de 1959, pouco mudou
desde o tempo de HPB.

Também descrever os Mistérios e alguns rituais, e posso assegurar-lhe que as coisas mais extraordinárias serão expostas agora, a história completa da Crucificação, etc… mostrando que são baseadas num rito tão antigo como o mundo – a crucificação do Candidato em provação no torno, descendo ao Inferno, etc… tudo Ariano.

A história completa, até aqui ignorada pelos Orientalistas, é encontrada exotericamente nos Puranas e nos Brahmanas e explicada e complementada com aquilo que as explicações esotéricas fornecem.  [3 de março de 1886, para A.P. Sinnett]

Continua na próxima semana.

sábado, 16 de julho de 2016

A controvérsia sobre o quinto e sexto volumes de "A Doutrina Secreta" (6ª parte)

Prosseguimos com a tradução do artigo de Daniel H. Caldwell, “O mito do terceiro volume desaparecido de A Doutrina Secreta”. É fundamental ler os posts das semanas anteriores antes de prosseguir. Continuamos com o restante da parte 4 do texto de Caldwell.

29 de abril de 1889 – Archibald Keightley foi citado numa entrevista ao New York Times, p. 5
O terceiro volume de “A Doutrina Secreta” está em manuscrito pronto para impressão. Consiste principalmente de uma série de esboços de grandes ocultistas de todas as épocas e é um trabalho maravilhoso e fascinante. O quarto volume, que basicamente dará algumas pistas sobre ocultismo prático, já foi delineado, mas ainda não foi escrito…


Archibald Keightley


21 de novembro de 1889 – HPB escreve numa carta para N.D. Khandalavala (Theosophist, agosto de 1932, p. 626):

Fui capaz de escrever a minha D.S., a “Chave”, a “Voz” e preparei mais dois volumes da Doutrina S..

Fevereiro de 1890 – HPB escreveu numa carta para a sua irmã Vera (Path, dezembro de 1895, p. 268):

Tenho de pôr o terceiro volume da Doutrina [Secreta] em ordem, e o quarto – mal comecei, também.


Nesta foto, a irmã de Blavatsky, Vera, está à sua esquerda.
Em cima Olcott e o casal Johnston.


Dezembro de 1890 – Um relato (Theosophist, julho de 1891, p. 586-7) da palestra de Bertram Keightley “Teosofia no Ocidente” na convenção anual da S.T. em Adyar, Madras, Índia, incluía o seguinte:

HPB entregou-lhe [a B. Keightley] o manuscrito de “A Doutrina Secreta” com a solicitação de que o lesse na totalidade. Ele leu os dois volumes publicados e o terceiro ainda não publicado…o que agora será o 3.º volume da história do Ocultismo teria sido o primeiro volume, enquanto os tratados sobre Cosmogonia e a Génese do Homem constituiriam um conjunto posterior…Ele então esboçou um esquema com a ordem óbvia e natural, nomeadamente a Evolução do Universo e a Evolução do homem…O próximo passo…era reordenar…o manuscrito de acordo com o [novo] esquema.

7 de janeiro de 1891 – Claude Falls Wright escreveu (Path, Fevereiro 1891, 354):

Na última semana, HPB começou a reunir os manuscritos (escritos há muito) para o Terceiro Volume de A Doutrina Secreta; levará contudo uns bons doze meses a prepará-lo para publicação.


Claude Falls Wright (1867-1923)


Fevereiro de 1891 – Alice Leighton Cleather escreveu (Theosophist, Abril de 1891, p. 438):
HPB já começou no Vol. III.

18 de fevereiro de 1891 – A Condessa Wachtmeister escreveu numa carta para W.Q. Judge (citada em Report of Proceedings, Secret Doctrine Centenary, October 29-30, 1988, 1989, p. 86):
Quando o Volume 3 [de A Doutrina Secreta] sair este verão espero que haja nova procura pelos anteriores [dois] volumes.


Condessa Constance Wachtmeister
(1838-1910)


Abril de 1891 – HPB escreveu em Lucifer (CW 13:145-6):

Há dois anos, a autora prometeu em “A Doutrina Secreta”, Vol.II p. 798 [p.366 do volume IV da edição em português de “A Doutrina Secreta”], um terceiro e até um quarto volume deste trabalho. O terceiro volume (que está praticamente pronto) trata dos antigos Mistérios da Iniciação, dá esboços – do ponto de vista esotérico – de muitos dos mais famosos e historicamente conhecidos filósofos e hierofantes (todos eles considerados pela ciência como impostores), desde a antiguidade ate à era cristã, e rastreia os ensinamentos de todos estes sábios à mesma e única fonte de todo o conhecimento e ciência – a doutrina esotérica ou RELIGIÂO SABEDORIA. Nem é necessário referir que dos materiais lendários esotéricos usados no próximo trabalho, as suas afirmações e conclusões diferem grandemente e muitas vezes chocam irreconciliavelmente com os dados fornecidos por quase todos os orientalistas ingleses e alemães….O objetivo principal do Volume III de “A Doutrina Secreta” é provar, ao identificar e explicar os véus nas obras dos antigos indianos, gregos e outros filósofos de renome e também em todas as antigas Escrituras – a presença de um método e simbolismo alegórico e esotérico ininterruptos: mostrar, tanto quanto possível, que com as chaves da interpretação conforme ensinadas no Cânone do Ocultismo Hindu-Budista Oriental, os Upanixades, os Puranas, os Sutras, os poemas épicos da Grécia e da Índia, o Livro Egípcio dos Mortos, os Eddas escandinavos, bem como a Bíblia hebraica e ainda os escritos clássicos dos Iniciados (como Platão, entre outros) – tudo, do início ao fim, dão um significado bastante diferente dos seus textos em letra morta.

4 de maio de 1891 Annie Besant testemunhou a favor de HPB na ação desta contra Elliout Coues e o New York Sun (Michael Gomes, ed., Witness for the Prosecution: Annie Besant's Testimony on Behalf of H. P. Blavatsky in the N. Y. Sun/Coues Law Case, 1993, p.23):

Existe um outro trabalho dela [de HPB] que vi em manuscrito, ainda não publicado; um terceiro volume de “A Doutrina Secreta” que vejo com os meus próprios olhos que está agora a ser preparado para impressão. A Senhora Blavatsky também tem em preparação um glossário de Sânscrito e de línguas orientais; ambos estão em preparação; um deles está já datilografado e outro está quase pronto para sê-lo.

Elliott Coues, um dos mais ferozes
 inimigos de Blavatsky
(1842-1899)

8 de maio de 1891 – HPB morreu em Londres.

Das afirmações de 1890-1891 acima (quer escritas pela própria HPB ou pelos seus estudantes de Londres) uma conclusão razoável que pode ser retirada é a de que HPB finalmente decidiu publicar o terceiro volume de “A Doutrina Secreta” e estava, de facto, trabalhando no manuscrito do terceiro volume durante os meses que precederam a sua morte.

À luz desta conclusão, é difícil entender o que Boris de Zirkoff queria dizer quando escreveu (na SD Intro., p.71) que “nenhuma resposta positiva ou negativa em absoluto pode ser dada à recorrente questão sobre se um manuscrito completo dos volumes III e IV alguma vez existiu.”


Boris de Zirkoff


Deixando de lado a referência de de Zirkoff ao volume IV, não há qualquer razão para duvidar que um manuscrito do Volume III existiu durante os últimos anos da vida de HPB. Além do mais, tivesse ela vivido mais anos, provavelmente teria adicionado e eliminado material do manuscrito; provavelmente teria reescrito e reeditado o material ainda mais. Mas na altura da sua morte, este manuscrito estava tão “terminado” tanto quanto HPB podia. Que mais se poderia esperar?


No século XX, muitos estudantes de Blavatsky preferiram acreditar que o verdadeiro volume III não publicado de 1887-1891 (o anterior Volume I de 1886-1887) havia, de algum modo, desaparecido. Alguns sugeriram que o manuscrito ou foi destruído por HPB antes da sua morte, ou já depois disso, havia sido suprimido por Besant, “desmaterializado” pelos Mestres, ou ainda que teria desparecido de outro modo qualquer.


Parte 1 do documentário "The Annie Besant Story"

Continua na próxima semana.

sábado, 9 de julho de 2016

A controvérsia sobre o quinto e sexto volumes de "A Doutrina Secreta" (5ª parte)

Prosseguimos com a tradução do artigo de Daniel H. Caldwell, “O mito do terceiro volume desaparecido de A Doutrina Secreta”. É fundamental ler os posts das semanas anteriores antes de prosseguir.

PARTE III - O MANUSCRITO DO VOLUME UM TORNA-SE O VOLUME TRÊS

Voltando ao relato da edição de “A Doutrina Secreta” de Bertram Keightley, que escreveu:


Bertram Keightley (1860-1944)


“Um dia ou dois depois da nossa chegada a Maycott [em maio de 1887], HPB colocou tudo o que havia de manuscritos completos de [A Doutrina Secreta) nas mãos do Dr. [Archibald] Keightley e de mim próprio…Ambos lemos todo o conjunto de manuscritos – uma pilha com quase 1 metro de altura – o mais cuidadosamente possível…e então, depois de consulta prolongada, encarámos [HPB]… com a solene opinião que o conjunto de material tinha que ser rearranjado de acordo com um plano preciso…

Finalmente apresentámos-lhe um plano, de acordo com a própria natureza do material, ou seja, dividir o trabalho em quatro volumes…

Além disso, em vez de fazer o primeiro volume consistir, como ela pretendia, da história de alguns grandes ocultistas, aconselhámo-la a seguir a ordem natural de exposição e a começar com a Evolução do Cosmos, e a partir daí a passar para a Evolução do Homem, e depois a lidar com a parte histórica num terceiro volume abordando as vidas de alguns grandes Ocultistas; e finalmente, a falar do Ocultismo Prático num quarto volume se ela tivesse condições de escrevê-lo.

Este plano foi apresentado a HPB que de pronto o sancionou.


Busto de HPB


O próximo passo foi ler novamente o manuscrito, do princípio ao fim, e fazer um ordenamento geral da matéria pertencente aos temas que vinham sob as epígrafes de Cosmogonia e Antropologia, os quais deveriam formar os dois primeiros volumes da Obra. Concluída essa tarefa, HPB, devidamente consultada, expressou a sua aprovação, e todo o manuscrito, assim ordenado, foi passado à máquina por mãos profissionais… (em Reminiscences of H. P. Blavatsky and The Secret Doctrine, pela Condessa Constance Wachtmeister et al., Quest edition, 1976, pp. 78-9; também citado em de Zirkoff, SD Intro., 41) [NT: esta passagem pode ser encontrada com uma redação ligeiramente diferente no livro “Reminiscências de H.P. Blavatsky e de A Doutrina Secreta”, ed. Pensamento, p.74-5. Também consta da p.34 do volume I de “A Doutrina Secreta” em língua portuguesa].

Portanto, como nos diz Bertram Keightley, a ordem dos volumes de “A Doutrina Secreta” foi alterada. O volume I tornou-se no Volume III.

Ficaram os conteúdos do novo e inédito volume III completamente intactos?

Não. Por exemplo, HPB decidiu retirar um dos apêndices ("Star-Angel Worship in the Roman Church") e publicá-lo como um artigo em Lucifer (CW 10: 13-32). Outro exemplo: o apêndice intitulado "Kuan-Shai-Yin"  foi aparentemente retirado e publicado no volume I de 1888, p.470-3. Algumas outras partes do reorganizado terceiro volume foram também incorporadas no Volume I conforme publicado em 1888: parte da secção “para os leitores” e parte das “explicações da primeira página de Ísis sem Véu” (ver o quadro de conteúdos do volume I) foram incorporados na “introdução” (xvii-xxi e xii-xlvii)  do volume I publicado em 1888. Mas, em grande medida, o material que estava no Volume I do manuscrito original de A Doutrina Secreta de 1886-1887 permaneceu no manuscrito daquilo que se veio a tornar o Volume III.


PARTE 4 – O TERCEIRO VOLUME DESDE 1888 ATÉ À MORTE DE HPB

Podemos agora delinear a história do terceiro volume desde 1888 até à morte de HPB em 1891 citando vários documentos publicados.

Carta escrita por Blavatsky.
A sua caligrafia é facilmente reconhecida.


3 de abril 1888 – HPB escreve à Segunda Convenção Americana:

O manuscrito dos primeiros três volumes está agora pronto a ir para impressão (CW 9:247).

1888 – HPB escreve sobre o terceiro volume nos Volumes I e II de “A Doutrina Secreta” (1888):

Os dois volumes agora publicados ainda não completam o esquema geral, nem esgotam os temas abordados. Já está preparada uma boa quantidade de materiais referentes à história do Ocultismo, baseada nas vidas dos grandes Adeptos da Raça ariana e que nos mostram a influência da Filosofia Oculta na conduta da vida, tal como é e tal como deveria ser. Se os presentes volumes tiverem acolhimento favorável, não serão poupados esforços para levar avante o plano e completar a obra. O terceiro volume está inteiramente pronto e o quarto quase (1:vii) [NT- Na p.11 do volume I da edição em português de “A Doutrina Secreta” encontrar-se-á esta passagem ligeiramente alterada. Note-se que esta última frase não consta da edição portuguesa, possivelmente porque a versão a partir da qual foi feita a tradução já não continha essa passagem.]




Se o leitor, porém, tiver paciência, poderá olhar para o estado atual das diversas crenças existentes na Europa, comparando-as ao que a história refere das épocas que imediatamente precederam e seguiram a era cristã; tudo isso poderá ser encontrado no volume III desta obra.

Nesse volume apresentar-se-á uma breve recapitulação dos principais Adeptos historicamente conhecidos; será descrito como os Mistérios decaíram, principiando em seguida a desaparecer, e apagando-se finalmente da memória dos homens, a verdadeira natureza da Iniciação e da Ciência Sagrada. Passaram desde então a ser ocultos os seus ensinamentos, e a Magia não persistiu senão, quase sempre, sob as cores veneráveis, mas por vezes, enganosas, da Filosofia Hermética. Assim como o verdadeiro Ocultismo havia prevalecido entre os místicos durante os séculos que antecederam a nossa era, assim a Magia, ou antes a Feitiçaria com as suas artes ocultas, seguiu-se ao advento do Cristianismo. (l: xxxix-xl) [NT- p.52 do volume I da edição em português de “A Doutrina Secreta”, com pequenas alterações.]

Lidos à luz do Zohar, os quatros primeiros capítulos do Génesis são os fragmentos de uma página altamente filosófica da cosmogonia do Mundo (ver Volume III, “Gupta Vidya e o Zohar) (1:10-1) [NT - p.79 do volume I da edição em português de “A Doutrina Secreta”, embora o que está entre parêntesis não conste.]

Outra edição menos conhecida da Doutrina Secreta feita
pela Editora Civilização Brasileira

A explicação de “Anupâdaka” contida no Kâla Chakra – a primeira na divisão Gyut do Kanjur, é semi-esotérica, e induziu os orientalistas a erróneas especulações quanto aos Dhyâni-Buddhas e aos seus correspondentes terrestres, os Mânushi-Buddhas. A significação verdadeira será indicada em volume subsequente (ver “O Mistério de Buda”), e a seu tempo será explicada com maior amplitude. (1:52n) [NT- nota 24 da p.114 do volume I da edição em português de “A Doutrina Secreta”, excluindo o que está entre parêntesis].

É, por isso, fácil de compreender a significação daquele “conto de fadas” que Chwolsohn traduziu da versão árabe de um velho manuscrito caldeu, em que Qûtamy é instruído pelo ídolo da Lua (vide volume III)… Seldenus diz-nos o segredo, e o mesmo faz Maimonides…Os adoradores de Terafim, ou oráculos judeus “esculpiam imagens, e alegavam que, sendo inteiramente impregnada pela luz das estrelas principais (planetas), por seu intermédio as Virtudes angélicas (ou os Regentes dos planetas e estrelas) conversavam com eles, ensinando-lhes a arte e muitas coisas úteis” (1:394) [NT- p.102 do volume II da edição em português de “A Doutrina Secreta”, excluindo o que está entre parêntesis].

Estudando-se a Teogonia comparada, é fácil ver que o segredo destes “Fogos” era ensinado nos Mistérios de todos os povos da antiguidade, e principalmente na Samotrácia…Falta-nos espaço para descrevermos aqui estes “Fogos” e o seu real significado; tentaremos fazê-lo mais tarde, se os terceiro e quarto volumes desta obra vierem a ser publicados. (2:106) [NT- p.120 do volume III da edição em português de “A Doutrina Secreta”, com pequenas alterações.]




No terceiro volume desta obra (este volume bem como o quarto estão praticamente prontos), será exposta uma breve história de todos os grandes adeptos conhecidos dos tempos antigos e modernos por ordem cronológica e uma perspetiva genérica dos Mistérios, a sua criação, crescimento, degradação e morte – na Europa. Não houve espaço para isto nesta obra. O volume IV será dedicado quase na íntegra a ensinamentos ocultos (2:437) [NT: Esta passagem não existe na versão em língua portuguesa de “A Doutrina Secreta”, a existir estaria na p. 455 do volume III].

Estes dois volumes são para o estudante um prelúdio adequado para os volumes III e IV. Enquanto os resíduos das idades não forem eliminados da mente dos Teósofos, a quem dedicamos estas páginas, é impossível que cheguem a compreender o ensinamento de caráter mais prático contido no terceiro volume.




Do acolhimento que os Teósofos e Místicos dispensarem aos dois primeiros volumes dependerá a publicação dos últimos dois volumes, embora estejam quase concluídos (2:797-8) [NT: com uma redação ligeiramente distinta, esta passagem está na p.366 do volume IV da edição em português de “A Doutrina Secreta”].

Estas descrições por parte de HPB, daquilo que estava no volume III não publicado de “A Doutrina Secreta”, têm uma boa correspondência com aquilo que ela diz nas suas cartas de 1886, nas quais descreve o volume I original.

Continua na próxima semana.